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JULGAMENTO

Salman Rushdie depõe no julgamento de homem acusado de esfaqueá-lo em 2022

Autor de ''Os versos satânicos" foi atingido uma dúzia de vezes e perdeu a visão do olho direito; Hadi Matar nega ataque

O escritor Salman Rushdie perdeu a visão no olho direito quando foi atacado em 2022 O escritor Salman Rushdie perdeu a visão no olho direito quando foi atacado em 2022  - Foto: TOBIAS SCHWARZ/AFP

"Eu estava morrendo", disse o escritor Salman Rushdie ao prestar depoimento, nesta terça-feira (11), no julgamento do homem acusado de atacá-lo a facadas em 2022.

O escritor, que perdeu a visão no olho direito no ataque e desde então usa óculos com uma das lentes escurecida, contou ao júri o que viveu naquele 12 de agosto, quando o americano-libanês Hari Matar o atacou com uma faca de 15 centímetros, desferindo uma dúzia de golpes no rosto, pescoço, abdômen e em uma das coxas.

— Pensei que estava morrendo — relatou Rushdie, que afirmou que estava em meio a um "lago de sangue" ao ser retirado de maca do centro cultural Chautauqua Institution, em Nova York, para ser levado de helicóptero a um hospital.

— Percebi que essa pessoa se lançava sobre mim pelo lado direito. Só o vi no último momento —declarou ao júri no tribunal do condado de Chautauqua, na pequena cidade de Mayville, onde as medidas de segurança foram reforçadas para recebê-lo.

Após mostrar ao júri como ficou seu olho, descreveu o golpe como "intensamente doloroso" e que o fez "gritar de dor". A facada atingiu o nervo óptico, causando a cegueira.

Matar foi preso no palco do anfiteatro da Chautauqua Institution, onde o autor de “Os versos satânicos” — obra que lhe rendeu uma fátua (mandato religioso) de condenação à morte emitida pelo então líder supremo do Irã aiatolá Ruhollah Khomeini, em 1989 — se preparava para dar uma palestra diante de mil pessoas.

Olhos ''ferozes''

O escritor, de 77 anos, descreveu Matar durante o ataque, em que ele usava uma máscara:

— Os olhos dele chamaram muito minha atenção, eram escuros e me pareceram muito ferozes — disse. — Ele me golpeou com muita força aqui, na parte inferior do rosto, mandíbula e pescoço —relatou Rushdie, apontando para a garganta e o queixo. — A princípio, achei que ele tinha me batido.

A defesa de Matar tem se esforçado para evitar que as testemunhas caracterizem Salman Rushdie como vítima de perseguição pela fátua iraniana.

Ao entrar no tribunal, Matar, de 27 anos, gritou "do rio ao mar, a Palestina será livre" e não reagiu quando Rushdie começou seu depoimento. O réu também enfrenta acusações de terrorismo em um tribunal federal por apoiar a milícia libanesa Hezbollah, respaldada pelo Irã, que endossou a fátua.

Ele declarou à imprensa que havia lido apenas duas páginas do romance de Rushdie, no qual, segundo ele, o autor "atacava o islamismo".

''Idosos gritavam''
Jordan Steves, funcionário do centro cultural, contou na segunda-feira (10) que se jogou contra o agressor com seu “ombro direito, com toda a força” que pôde, tentando ajudar outros a imobilizá-lo.

— Depois de voar pela cena, rolei pelo ar — disse, antes de apontar Matar como o agressor na ornamentada sala do tribunal, decorada com pinturas a óleo.

Deborah Moore Kushmaul, colega de Steves, afirmou que pegou a faca do chão e a entregou à polícia.

— Eu via sangue e as pessoas se aglomerando. Nosso público, que em grande parte era formado por idosos, gritava — contou. —Minha maior preocupação era que pudesse haver uma bomba nas bolsas ou outro atacante.

O escritor narrou em sua obra “Faca: reflexões sobre um atentado” (publicada em abril do ano passado pela Companhia das Letras) como superou o ataque. No livro, ele mantém uma conversa imaginária com seu agressor, cujo nome não menciona, sobre suas crenças e motivações.

Antes do ataque de Matar, Rushdie já havia sido alvo de pelo menos seis tentativas de assassinato. Após viver com escolta e escondido em Londres por vários anos, Rushdie se mudou para Nova York em 2000, onde levava uma intensa vida social até o ataque.

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