Todo poder a Lia de Itamaracá
A cirandeira vive, neste ano de 2019, marcos importantes da carreira, ganhando ainda mais dimensão a níveis nacional e internacional: um reconhecimento que vem tardio, mas finalmente chega para coroá-la
"Agora estou colhendo o que plantei no passado". A fala de Lia, acompanhada de um olhar penetrante e um sorriso sutil, resume o sucesso que tem alcançado nos últimos meses. Quis o destino que, por coincidência ou não, a Folha de Pernambuco tenha voltado à Praia de Jaguaribe, em Itamaracá, para conversar com a cantora exatamente um ano após ter feito uma matéria especial sobre ela, em que se queixava da falta de reconhecimento em sua terra natal e mostrava sua ascensão em todo o País. Os problemas em Itamaracá não mudaram, embora a população continue aclamando-a como diva local. Mas a glória de Lia surpreende pela aparente rapidez - embora ela faça questão de frisar que as sementes desse sucesso foram plantadas desde o início dos anos 1970, quando sua carreira começou.
Este último, porém, é especial. Foi realizado com verba fornecida pela empresa Natura, dentro de um edital que recebeu 2.617 inscrições de todo o Brasil. A produção ficou a cargo de Helder Aragão de Melo, o DJ Dolores, e o resultado mescla respeito às raízes cirandeiras de Lia e um frescor inusitado ao incluir outros ritmos nas 11 faixas do disco, resgatando músicas que fazem parte do bem-querer da cantora e apresentando composições de autores contemporâneos, como Chico César e Lúcio Sanfilippo.
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Apenas dois músicos da antiga banda foram mantidos: seu marido, Antônio Januário, o Toinho, e Ganga. Nomes de destaque na cena musical pernambucana, como o percussionista Lucas dos Prazeres e o guitarrista Yuri Queiroga, entre vários outros, acompanham a cantora em suas novas incursões musicais. "A princípio, ela ficou temerosa, mas depois entendeu que nada a impedia de visitar outros ritmos. Dolores é um gentleman, foi carinhoso e respeitoso com ela. Lia participou de todo o processo de seleção do repertório, a maioria são músicas que já faziam parte do dia a dia dela, como 'O relógio'. Acho que este disco ficou mais pop. É dançante, é pra cima. Ficou a cara dela, e vai ajudá-la a atingir novos públicos", avalia Beto Hees, que é produtor da artista há mais de duas décadas.
Ela não exagera: em 2019, ela recebeu um título de Doutora Honoris Causa pela UFPE, por conta de sua importância e saber dentro da Cultura Popular; foi a homenageada do Galo da Madrugada, do Homem da Meia Noite e da Feira Internacional de Artesanato de Pernambuco (Fenearte), que, neste ano, destacou a Ciranda; inspirou uma coleção de moda praia da empresa Rush, com tecidos, maiôs, cangas, bolsas e uma série de outros objetos trazendo sua figura ou imagens a ela relacionadas; vai batizar com seu nome um palco permanente na célebra casa de shows Rio Cenário, no Rio de Janeiro; e deu entrevistas para o Fantástico, o programa de Pedro Bial, o GNT, o CNT, o Canal Brasil e documentários de várias outras produtoras.
Estrela em várias dimensões
Em dois anos, foram lançados dois livros contando sua história: um de fotografias e outro de reportagem, ambos escritos por Marcelo Henrique Andrade. No momento, a Companhia Editora de Pernambuco prepara sua biografia oficial, a ser lançada na coleção Perfis e escrita pela jornalista Michelle Assumpção.
"A literatura tem sido uma vertente nova e muito interessante, que está permitindo que Lia se apresente em um novo circuito, percorrendo feiras e festivais literários", aponta o produtor Beto Hees. "Estou tão orgulhoso, é tanto tempo brigando por isso. Hoje a gente vê Lia sendo reconhecida e se integrando a muitas linguagens artísticas, à música, à dança, à literatura e até ao cinema", diz Beto, emocionado.