Silvério Pessoa, secretário de Cultura de Pernambuco: "Sou um cara muito lírico, lúdico e sonhador"
Em entrevista exclusiva à Folha de Pernambuco, novo secretário de Cultura do Estado fala sobre os planos para sua gestão à frente da pasta
Silvério Pessoa já é nome conhecido (e de peso) em Pernambuco e Brasil afora. Artista da terra - precisamente de Carpina, na Mata Norte - é braço forte da Cultura no Estado, e faz é tempo.
E como bem descreve sua biografia "Nasceu com o cheiro dos canaviais" e, portanto, sob o aroma de uma parte grande da história pernambucana, inclusive - e principalmente - com veia artística que também é testemunho de sua verve de cantor, compositor e fazedor de arte, com maestria na cultura popular.
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Atributos que o credenciaram a aceitar o convite da governadora Raquel Lyra para assumir a Secretaria de Cultura de Pernambuco, a partir desta segunda-feira (2), quando tomará posse na pasta.
"Foi um mix de supresa e de desafio, mas ao mesmo tempo de muita leveza", contou Silvério, em conversa exclusiva com a Folha de Pernambuco, ocasião em que falou sobre a condução do novo ofício e as ideias iniciais à frente da pasta, entre outros papos - incluindo sua agenda como artista e como acadêmico na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap).
O CONVITE
"POSSO DAR A RESPOSTA À SENHORA QUANDO? PODE SER HOJE À NOITE?"
"Recebi uma ligação da governadora me pedindo para conversar com ela, há poucos dias, e minha cabeça saiu daqui (de Serrambi, Litoral Sul do Estado, onde passou as festas de fim de ano) imaginando tudo, menos ser secretário de Cultura.
Pensei ela me pedindo uma assessoria, orientações na área de cultura popular… Fui e quando cheguei foi realmente inusitado para mim o convite, me pegou de surpresa mas também com muito acolhimento, um alinhamento de ideias próximas, semelhanças. É um mix de surpresa e de desafio, mas ao mesmo tempo de muita leveza.
Foi engraçado, porque eu disse: 'Governadora eu preciso de um tempo, preciso falar com meu reitor, com minha esposa, posso dar a resposta a senhora quando? Ela respondeu: 'Pode ser hoje à noite?'
SILVÉRIO NA ATIVIDADE PÚBLICA
"Eu nunca coloquei como objetivo vínculo em atividade pública, minha meta sempre foi essa dualidade com o trabalho como pedagogo e com minha carreira artística, dois campos que sou da luta.
A docência, que é uma luta diária e não só de ampliação e valorização, mas de reprodução acadêmica e como artista, optei por morar em Pernambuco, em Recife, outro campo também desafiador, fazer música, gravar e cantar aqui.
A CULTURA POPULAR NA GESTÃO DE PERNAMBUCO
"O que penso é o seguinte: muitas vezes a gente planeja na gestão pública, tem sonhos… eu sou um cara muito lúdico, muito lírico, sonho muito e muitas vezes os caminhos da gestão pública não permitem ir além.
Eu não faria uma crítica de que esse campo, o da Cultura Popular em Pernambuco, não foi contemplado. Mas eu com um cargo do Estado, quero expor mais, dar mais visibilidade. São narrativas que podem ser mais agraciadas com projetos, festivais, e mais preocupação, inclusive com criação de comissões para ouví-las.
De inicio quero dar um rolé pelos municípios do Estado para entender essas demandas, não só desse quadro claro da Cultura Popular do frevo, maracatu, ciranda, coco, dos mestres e das mestras, dos poetas repentistas, do artesanato...
Mas juntar a esse catálogo cultural outras expressões que têm muita força, inclusive para a economia criativa. A cultura pernambucana deve ter visibilidade e produtividade, a Cultura Popular deve ser trabalhada com um olhar sistêmico".
"OLHAR DESCENTRALIZADO E 'DE DRONE'"
"Quero trazer à tona narrativas que muitas vezes nem são lembradas como Cultura Popular, a exemplo do hip hop, do movimento do metal em Pernambuco, a culinária, a moda, a religiosidade popular. Meu olhar vai ser de drone, prinicipalmente pela arte das periferias do Estado.
Precisamos falar dessa criatividade latente dos subúrbios para o centro, como o grafite e narrativas amplas da musica popular, tais como as do brega, por exemplo. A gente tem isso e pensa que está só aqui no Recife, mas a gente tem isso no Pajeú, em Gravatá... a galera tá fazendo muita coisa bacana..
Tem gente escrevendo bem, realizando narrativas literárias nas periferias, meu olhar vai ser, de inicio, bem amplo, como um olhar de drone sobre também esses cantinhos culturais que eu quero discutir e praticar".
PRIMEIROS ATOS COMO GESTOR
"No dia 2 de janeiro quero entender a Secretaria, abrir a fala, ver os espaços estratégicos que vão me dar conforto para pensar a Cultura como gestão.
Quero também estar junto dos artistas. Quero rodar o Estado antes de qualquer composição e plano, eu quero estabelecer um plano de gestão, mas quero conversar antes com as pessoas, as demandas do Centro e das periferias, vivenciar humanamente as possibilidades".
FUNDARPE, EMPETUR E SECRETARIA DE EDUCAÇÃO JUNTOS COM A CULTURA
"Vejo a Empetur, a Fundarpe, a Secretaria de Educação com aproximação e interdisciplinaridade na gestão pública, isso é importante para que a gente tenha um olhar novo sobre o público, andar juntos, fazer coisas juntas".
"VOCÊ NÃO VAI ESTAR SOZINHO"
"Quando estive com a governadora, ouvi palavras tão bacanas dela. Não foi um convite impositivo, foi propositivo. Eu disse: 'Governadora sou um artista, um educador' e ela respondeu: 'Você não vai estar sozinho', e era isso que eu estava esperando ouvir para tomar a decisão. Foi um encontro bonito e fraterno".
O SONHO COMO SECRETÁRIO
"Tem um pessoal aqui brincando, me chamando de secretário. Eu não vou ter nenhuma pretensão de mudar, de destacar o Silvério artista do outro (como secretário). Vou continuar como a pessoa que faz música e vai para o palco - tenho show do disco novo (Sangue de Amor) no Janeiro de Grandes Espetáculo
Seguirei indo para a Unicap e agora também com a Secretaria. As pessoas vão me encontrar com essas mesmas atividades, que já venho desenvolvendo, além agora, claro, da Secretaria de Cultura.
Estou otimista, com insegurança natural no humano, me questiono se serei capaz. Ao mesmo tempo isso me até força para deixar algo para a cultura do meu povo. Meu sonho é esse".
O QUE VAI SER A CULTURA COM SILVÉRIO
Afirmação da Cultura do nosso povo. É o que vem em minha cabeça, você falando e eu pensando... é isso. Vai ser minha flâmula na gestão. Minha passagem vai ter esse verbete.
Acho que aí está a grande mística, porque você com um povo que reconhece sua identidade, que desenvolve, que tem autonomia, que é protagonista do que produz... As rezadeiras, as marisqueiras, a corista do coco, a maestrina de uma ciranda, o repentista com toda a genialidade dele.
Ao mesmo tempo o que faz o roteiro para cinema, o que ensina a dança, os atores, a culinária, o skate, o grafte, o movimento hip hop, a galera do heavy metal... Enfim, quando você se fortalece a partir da Cultura, e se reconhece, você cria um povo forte, emancipado, crítico e revolucionário.