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LANÇAMENTO

Zé Manoel volta ao Recife com "Coral"

Show, hoje à noite no Teatro do Parque, tem 17 canções no set list e uma banda com seis músicos, além das participações especiais de Isadora Melo e Amaro Freitas

 "O desejo era que soasse mais solar, mais aberto", diz Zé sobre o disco "Coral" "O desejo era que soasse mais solar, mais aberto", diz Zé sobre o disco "Coral"  - Foto: Wendel Assis

O cantor, compositor e pianista petrolinense Zé Manoel está de volta ao Recife. Desta vez, para estrear a turnê de “Coral”, nome do quinto disco de estúdio do artista, no Teatro do Parque, nesta sexta-feira (7), às 19h30. Recebido com aplausos e adjetivos em profusão pela imprensa especializada, o álbum foi eleito um dos 50 melhores discos de 2024 pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA).

Além do piano, Zé Manoel traz com ele uma banda de seis músicos, um set list com 17 canções no qual estão nove das onze faixas de “Coral”, outras do disco anterior, “Do Meu Coração Nu” (2020), indicado ao Grammy Latino como Melhor Álbum de Música Brasileira, e sucessos dos outros trabalhos do artista, todos com novos arranjos.  

O show contará, ainda, com as participações especiais  do pianista e compositor Amaro Freitas, com quem Zé Manoel dividiu, por dois anos, o "Clube da Esquina", projeto que rodou várias cidades do Brasil e que recebeu elogios do público e da crítica onde foi apresentado, e da cantora Isadora Melo.

"Coral", o disco
“Coral”, lançado nas plataformas de streaming em setembro do ano passado e que esta semana ganhou edição especial em vinil pela Rocinante Três Selos, foi pensado para ser mais solar que o disco antecessor, já que o contexto em que foi concebido é de pós-pandemia, bem diferente de quando fez “Do Meu Coração Nu”.

Quando, no entanto, é indagado se o novo disco não seria um complemento do antecessor, só que com elementos novos, sem repetir a fórmula, Zé Manoel não discorda. “O desejo era que soasse mais solar, mais aberto. “Coral” até tem momentos de introspecção, como o anterior, mas, de fato, são complementares. Ele segue a narrativa do disco anterior, mas já abrindo outras possibilidades. Então, de fato, é meio que continuação”, confessa.

Entre as faixas de destaque do disco, “Menina Preta de Cocar”, composição dele, uma celebração à miscigenação entre o povo preto e indígena, que resume bem uma das propostas desse trabalho. É quase um manifesto.

“Falo muito no povo preto e indígena porque há na história um encontro desses povos: o povo preto não quis dominar o indígena, e o povo indígena não quis dominar o preto, diferente dos brancos que chegaram aqui (no Sertão, no tempo da escravidão) e, provavelmente, quiseram repetir o que acontecia no litoral”, explica.

Segundo Zé Manoel, há uma irmandade histórica entre esses povos. “A canção é uma celebração desse encontro, que está na nossa cara, nas nossas feições, também. Parto do princípio de que essa miscigenação já aconteceu e que somos fruto dela”, acrescenta.

Inspiração
“Coral”, que dá nome ao disco, gravada apenas ao piano, talvez seja a mais introspectiva do álbum. Nasceu de um sonho do pianista com o compositor baiano Dorival Caymmi no qual o autor de “Dora” repetia, cantando, o vocábulo “Coral”. Fala de solidão, saudade e perda.

“Deságuo para Emergir”, letra de Liniker, traz versos que bem que poderiam ter sido escritos pelo próprio compositor. A letra quase “psicografada” casa perfeitamente com a melodia. “Quando li a letra, fiquei apaixonado. Muito linda. É uma canção que já tem um tempo que a gente fez. Ela acabou ficando guardada, aí resolvi gravar nesse disco”.

Além de discutir temas de interesse coletivo que estão sempre em pauta nesses tempos loucos sem soar panfletário, Zé continua tocando em outras questões também caras à humanidade em tempos líquidos: desamor, abandono, solidão sem ser clichê ou resvalar para a pieguice. Perguntado se isso é natural ou há um cuidado prévio para compor, ele dá uma pista. 

“A vida está aí. Se você está vivo, involuntariamente vai ter que lidar com essas questões. Então, se não desejo encerrar com a minha vida e tudo isso, vou ter que lidar. Acabo sempre escrevendo coisas pelas quais passei em algum momento ou que me tocaram. Talvez seja uma forma pessoal de abordar (esses temas) mesmo”, confessa.

Johnny Alf
Outra novidade do disco é “Canção de Amor para Johnny Alf”, uma homenagem ao pianista, cantor e compositor paulista apaixonado por dissonância e modulação, que subverteu harmonia e letra e foi precursor do gênero musical que passou a ser chamado de bossa nova.

Em “Siriri”, o pianista pega emprestado o refrão de “Siriri, Sirirá” (Onildo Silva), gravada pela forrozeira Marinês no início dos anos 1960, e complementa com versos dele. A canção de Onildo faz parte das memórias afetivas da infância de Zé: a mãe dele costumava cantá-la. Por isso, tanto ela quanto o pai do compositor são evocados na letra adaptada.

A singela, mas sublime “Malaika”, canção folclórica tanzaniana e sucesso na voz da africana Miriam Makeba em 1971, já regravada por incontáveis artistas mundo afora, é resgatada por Zé Manoel com versão em português assinada por Arthur Nogueira. No disco, ele divide os vocais com Luedji Luna. 

Quando resgata artistas como Johnny Alf, Miriam Makeba e Marinês, Zé Manoel põe em discussões temas como apagamento, feminismo, conscientização racial e ancestralidade, só que por outras vias.

Johnny Alf, preto, pobre e homossexual, era um artista talentosíssimo, mas não chegou a ter, como compositor, o reconhecimento que merecia, a exemplo de Tom Jobim, que, inclusive, o chamava de “Genioalf’. Johnny Alf era para ter sido para o Brasil o que Bola de Nieve ainda hoje é para o povo cubano.  

Marinês foi uma mulher empoderada que furou a bolha do gênero forró, até então dominado por homens. Já Miriam Makeba, uma artista ativista dos direitos humanos, era uma preta que, sem abrir mão das suas raízes africanas, encantou o mundo com uma voz poderosa e hits como “Pata Pata”.     

Em “Above the Sky”, de Zé, Bruno Capinan e Bruno Morais, com letra em inglês, ele volta a se desafiar, cantando em outra língua – no disco anterior, experimentou o francês. Com arranjo irretocável, remete às canções românticas da década de 1970. “Golden”, também em inglês, tem parceria e participação de Gabriela Riley, e traz uma melodia envolvente que lembra clássicos de Cole Porter.

Iansã
“Iyá Mesan”, música de Zé com letra de Alessandra Leão, que participa da faixa, é uma saudação à orixá Iansã, já expressa no próprio título (o nome Iansã tem origem no iorubá Ìyámésàn). O disco traz, ainda, dois interlúdios, “Lubi Prates” e “Piano Fun”. 

O primeiro é um poema minimalista batizado com o nome da poeta, editora, tradutora e curadora paulistana parceira de Zé Manoel na autoria da faixa recitada por Luedji. O segundo é um experimento vocal com piano feito por Zé e Bruno Morais. Ambos não estão no roteiro do show.

No Recife, Zé Manoel conta com o auxílio luxuoso de Thiaguinho Silva (bateria), Felipe Salvego (baixo), Alexandre Rodrigues e Henrique Albino (sopros), Yuri Queiroga (guitarra) e Gilú Amaral (percussão).

SERVIÇO
“Coral, com Zé Manoel e banda
Quando: hoje, às 19h
Onde: Teatro do Parque, Rua do Hospício, 81 - Boa Vista
Ingressos: a partir de R$ 70
Vendas: Bilheteria Digital

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