Após bater R$ 6,20, dólar fecha quase estável com atuação de BC e fala de Lira
Arrefecimento do dólar ao longo da segunda etapa de negócios ocorreu após intervenção do Banco Central
Após superar o nível de R$ 6,20 pela primeira vez na história no início da tarde, o dólar à vista perdeu força nas últimas horas de pregão e chegou até a operar pontualmente em baixa, com mínima a R$ 6,0581. No fim da sessão, a divisa avançava 0,04%, a R$ 6,0961 - renovando pico histórico nominal de fechamento pelo segundo dia consecutivo.
O arrefecimento do dólar ao longo da segunda etapa de negócios ocorreu após intervenção do Banco Central com venda de dólares à vista e falas de lideranças no Congresso acenando com votação das medidas de contenção de gastos do governo Lula nesta semana.
Analistas atribuíram a arrancada do dólar mais cedo a uma combinação de fatores técnicos com as crescentes incertezas fiscais, que levam ao aumento de prêmios de risco.
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Além de dúvidas em torno do tempo hábil para apreciar os projetos antes do recesso parlamentar, há receio de que as medidas, já consideradas insuficientes, sejam desidratadas durante a tramitação no Congresso.
Do lado técnico, operadores apontam uma demanda por dólares típica de fim de ano para remessas de lucros e dividendos ao exterior. Há relatos de que empresas e fundos teriam adiado compra de dólares à espera de que a taxa de câmbio recuasse. Como não houve a apreciação do real esperada, correram para fechar operações nesta semana, a última com liquidez razoável ainda em 2024.
"Há muita demanda de moeda nesta última semana útil do mês e o cenário externo segue adverso, com dólar forte, diferentemente do que vimos em dezembro do ano passado", afirma a economista-chefe e CEO da Buysidebrazil, Andrea Damico, acrescentando que ainda falta o governo recuperar a confiança na política fiscal. "Por isso, vejo pouco espaço para muita apreciação do real em janeiro, mas pelo menos o fluxo cambial deve melhorar".
O BC promoveu hoje dois leilões de venda à vista de divisas. O primeiro, por volta das 9h30, resultou em venda de US$ 1,272 bilhão, sem, contudo, trazer arrefecimento significativo no ímpeto do dólar. Após a divisa superar R$ 6,20 no início da tarde, com máxima a R$ 6,2073, o BC anunciou um segundo leilão no segmento spot. Foram vendidos US$ 2,015 bilhões.
A partir daí, o dólar arrefeceu bastante o ritmo de alta, aproximando-se do nível de R$ 6,10. A virada momentânea para o campo negativo veio com sinais de Brasília de que o pacote de gastos será apreciado nas duas casas do Congresso ainda neste ano. O calendário é apertado uma vez que o recesso parlamentar começa no dia 23.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que os projetos do pacote fiscal serão votados hoje e amanhã, mas alertou: "Não estou garantindo a aprovação ou rejeição, mas vamos votar". Em seguida, o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), disse que as medidas também serão apreciadas no Senado nesta semana.
"O BC fez leilão maior à tarde, suprindo a demanda por divisas, o que ajudou a acalmar um pouco o dólar. E depois vieram as notícias sobre a possibilidade de aprovação do pacote fiscal neste ano, o que diminuiu o clima de incerteza", afirma o chefe da mesa de operações do C6 Bank, Felipe Garcia, para quem o BC deve ter identificado uma "disfuncionalidade" do mercado, com uma demanda pontual muito forte por divisas. "O BC já deixou bem claro que não olha o nível da taxa de câmbio. Foi mais uma atuação para dar liquidez ao mercado."
Reportagem de Cícero Cotrim e Célia Froufe, do Broadcast, mostra que o BC já injetou US$ 12,760 bilhões no mercado cambial em dezembro, com leilões de linha com compromisso de recompra e venda de moeda à vista. Trata-se da maior intervenção do BC para um único do mês desde março de 2020, marcado pela chegada da pandemia de covid-19 ao Brasil.
Para o economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, o país vive um "estresse financeiro muito grande", dada a reticência do governo Lula em promover uma "moderação fiscal". Além do atraso na divulgação das medidas de contenção de gastos, houve o anúncio simultâneo da proposta de isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil mensais.
"Foi um tiro no pé. E se não vier uma moderação do lado fiscal, virá pelo lado monetário. Ficou tudo nas cotas do BC, que já promoveu um brutal choque de juros, antecipando que a Selic vai para 14,25%", diz Gala, que vê possibilidade de a taxa Selic superar 15%, até pelo tom duro da ata do Copom divulgada hoje. "As intervenções do BC no câmbio têm muito a ver com a demanda de fim de ano, que é enorme com remessa de dólares, mas também com esse estresse financeiro, que pode se traduzir em crise econômica".