Azul: veja por que ações da companhia aérea disparam 38% em um só dia
Acordo anunciado no domingo prevê renegociação de 90% dos débitos com companhias que arrendam aviões para a empresa. Lucro no quarto trimestre foi de R$ 1,1 bilhão
As ações da Azul dispararam nesta segunda-feira (6), após a empresa ter anunciado acordo com empresas de leasing de aeronaves para reestruturação de suas dívidas e que prevê a conversão de parte dos créditos em ações da empresa. O acerto, ao lado do lucro do quarto trimestre divulgado hoje, dá fôlego ao caixa da companhia.
Os papéis preferenciais da Azul (AZUL4, sem direito a voto) dispararam e terminaram o dia com alta de 37,98%, negociados a R$ 9,99, após terem atingido a máxima de R$ 11,49, com alta superior a 50%. As ADRs, recibos de ações negociados na Bolsa de Nova Yok, subiram 40,62%, negociadas a US$ 5,85.
Para analistas de bancos e corretoras, mesmo sem detalhes sobre informações relevantes do acordo anunciado na noite de domingo, a negociação abre espaço para uma melhor geração de recursos do caixa durante o ano, melhorando o perfil de crédito da empresa e aumentando o prazo médio da sua dívida. Assim como outras companhias aéreas, a Azul sofreu muito com a pandemia, mas agora mostra ter ganhado fôlego.
— O balanço da Azul veio muito bom, mas acredito que o impacto positivo nas ações vem do anúncio do acordo de leasing. Ela conseguiu alongar o prazo de suas dívidas, e isso melhora em muito o cenário para a empresa — disse o head de renda variável e sócio da A7 Capital, André Fernandes.
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Nas últimas semanas, os papéis apresentavam desempenho fraco, e a empresa chegou a ser rebaixada por agências de risco. Mesmo com a disparada no dia, as ações preferenciais ainda têm queda acumulada de 9,26% no ano.
Com a recuperação vista nesta segunda-feira, a Azul passa a ter valor de mercado de R$ 3,352 bilhões.
No domingo, a Azul anunciou ao mercado que conseguiu firmar acordos com as empresas de leasing que representam mais de 90% de seu passivo com arrendamentos. Neste ano, a empresa tinha a pagar cerca de R$ 3,8 bilhões em arrendamento de aeronaves e vinha negociando um alongamento das dívidas.
Em relatório, analistas do Itaú BBA avaliam o acordo como positivo, pois "deve aliviar a saída de caixa relacionada às aeronaves arrendadas, uma das principais preocupações para o curto prazo".
Gol também sobe
O acordo ocorreu dois dias após a Gol ter anunciado a obtenção de um investimento de US$ 1,4 bilhão (R$ 7,2 bilhões) da holding Abra Group, controladora de Gol e Avianca. A injeção será de US$ 451 milhões em dinheiro e US$ 1,077 bilhão de bonds da Gol. O negócio envolve a emissão de notas sênior e de notas conversíveis sênior com vencimento em março de 2028 e juros de 18%, sendo 4,5% em dinheiro e o restante capitalizado.
Os papéis PN da Gol (GOLL4) avançaram 23,78%, cotados a R$ 6,35. No ano, ainda cumulam queda de 13,49%.
Quem também se beneficiou das altas do setor foi a CVC, com os papéis ordinários da companhia (CVCB3, com direito a voto) subindo 19,29%, negociado a R$ 3,34. Em 2023, os ativos ON da CVC ainda caem 25,61%.
— Quando o mercado percebe que o risco de crédito para essas empresas começa a diminuir em relação às dívidas de curto prazo, ele reprecifica esses ativos, contribuindo positivamente para a alta das ações ligadas a esses setores.
Lucro de R$ 1,1 bi no 4º tri
O lucro da Azul no último trimestre do ano passado foi de R$ 1,1 bilhão. O resultado positivo mitigou as perdas da companhia no ano passado. A Azul teve prejuízo de R$ 722,4 milhões no ano, 83% a menos do que a perda registrada em 2021.
A demanda por voos no quarto trimestre foi recorde na empresa e a receita total foi de R$ 4,5 bilhões de setembro a dezembro, 19% a mais que o registrado no mesmo período do ano passado e 37% acima do faturamento do último trimestre de 2019, anterior à pandemia.
Em 2022, a receita operacional da Azul chegou a R$15,9 bilhões, 39,4% mais que a de 2019 e 60% acima da de 2021. O faturamento da companhia tem sido impulsionado pela alta demanda por voos e pelo preço médio das passagens aéreas, que tem registrado forte alta em razão, principalmente, dos aumentos no preço do querosene de aviação (QAV).
Somente na Azul, a tarifa média aumentou 40% em 2022, na comparação com o ano anterior, chegando a R$ 588,70 por trecho em dezembro.
Apesar do prejuízo em 2022, a companhia aérea teve no ano passado R$ 3,23 bilhões de lucro antes de juros impostos depreciação e amortização (o chamado EBITDA) importante indicador sobre a saúde da operação. O montante é 16 vezes o EBITDA de 2021. Para este ano, a previsão da empresa é chegar a um EBITDA superior a R$ 5 bilhões, de acordo com o presidente da Azul, John Rodgerson.
Entenda o acordo da Azul
Rodgerson disse ao Globo que a expectativa é que os acordos sejam estendidos a todas as 15 empresas que arrendam suas aeronaves para a Azul. A investidores, ele afirmou que espera que isso ocorra "nas próximas duas ou três semanas" e que, quando isso ocorrer, a companhia divulgará informações mais detalhadas sobre eles.
O passivo de leasings representa hoje 79% da dívida da Azul e somam cerca de R$ 14 bilhões. Todo esse valor foi renegociado com alongamento de prazos para pagamento, mas não houve descontos. Neste ano, a Azul tinha previsão de pagar R$ 3,8 bilhões em arrendamentos, sendo aproximadamente R$ 600 milhões referentes a diferimentos de leasing da época da pandemia. O valor restante, de R$ 3,2 bilhões, não será pago integralmente neste ano, mas a companhia ainda não informou qual é o montante que deverá desenbolsar em 2023.
— Falamos que a moeda do Brasil se desvalorizou e pedimos um preço justo pelo leasing agora. A diferença de preço será paga em 2030 e parte dela em equity (ações). Com isso, resolvemos nossa situação de caixa neste ano e nos próximos sete anos. A gente tinha um buraco de R$ 3 bilhões neste ano — afirma Rodgerson.
De acordo com a Azul, o acordo prevê o portergameto dos passivos de leasing diferidos durante a pandemia e um desconto, agora, dos aluguéis de aeronaves para preços de mercado. As empresas de leasing aceitaram receber os diferimentos e o desconto dos arrendamentos em 2030. As arrendadoreas receberão títulos de dívida negociável com vencimento em 2030, que representa 40% dos débitos, e ações da empresa que serão "precificadas de forma a refletir a nova geração de caixa da Azul, sua melhor estrutura de capital e a redução em seu risco de crédito", representanto os 60% restantes.
Ou seja, o preço a ser pago pelas ações no futuro deverá ser maior que o atual valor de face dos papéis, hoje depreciados. Em 12 meses, o valor da ação da Azul caiu 59,55%, atingindo R$ 7,24 no pregão da última sexta-feira.
— Estamos com o valor das ações hoje em quatro vezes o nosso EBITDA, mas historicamente o nosso preço sempre foi oito vezes, então esse pagamento em equity será no preço normal, não no depreciado. Isso diminui a diluição dos acionistas e mantém a estrutura de controle da companhia — ressalta o executivo.
Alta de 40% do QAV desde 2019
John Rodgerson afirma, ainda, que a Azul poderá levantar capital se necessário, apesar de seu endividamento ainda elevado. No fim de 2022, o endividamento bruto da Azul era de R$ 21,8 bilhões, 5,3% a menos do que em dezembro de 2021.
A alavancagem mensurada como o múltiplo da dívida líquida em relação ao EBITDA dos últimos doze meses era de 5,7, considerado elevado. Um ano antes, porém, o indicador chegara a 11,2.
A Azul e o setor aéreo brasileiro como um todo são negativamente impactados pela alta no preço do querosene de aviação, cujo preço é atrelado ao dólar e subiu 36% desde o início de 2022, já considerando a recente redução de 13,8% anunciada pela Petrobras na semana passada.
Desde 2019, o aumento no preço do insumo supera os 120% de acordo com a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear). O combustível representa hoje aproximadamente 40% dos custos de uma linha aérea no Brasil.