Bolsonaro abre caminho para contratar térmicas previstas na MP da Eletrobras
O presidente Jair Bolsonaro editou um decreto que abre caminho para a contratação das térmicas a gás previstas na MP (medida provisória) de privatização da Eletrobras. A inclusão dessas térmicas na MP alimenta polêmica no setor de energia e há mobilização para que o Senado retire do texto a previsão dos empreendimentos.
Em termos técnicos, o decreto de Bolsonaro regulamenta o chamado leilão de reserva de capacidade, uma nova modalidade de contração no setor de energia, criada no final de 2020. Especialistas da área estabeleceram a relação do decreto com a MP da Eletrobras porque o texto especifica que as térmicas a gás serão contratadas por essa nova modalidade.
A térmica de reserva de capacidade tem a função de garantir potência para o sistema, ou seja, evitar oscilações que possam provocar blecautes. Elas são diferentes das térmicas que fornecem energia de reserva, responsável por garantir abastecimento.
Leia também
• Aneel anuncia energia mais cara em junho
• Bolsonaro diz que Petrobras estuda medida para dar previsibilidade a preço de combustível
• Após alerta de risco hídrico, secretário de Guedes defende privatização da Eletrobras
A previsão é que o primeiro leilão de reserva de capacidade ocorra em dezembro deste ano, com entrega prevista para 2026 -ou seja, essas usinas a gás não vão conter a crise atual de desabastecimento.
Especialistas do setor, que falaram na condição de não terem o nome revelado, afirmam que os defensores das térmicas a gás aproveitam o momento de crise energética para atender interesses privados e políticos.
Logo após o decreto, foi liberada também uma portaria, para o encaminhamento dos próximos ajustes desse tipo de leilão.
O MME (Ministério de Minas e Energia) ainda irá definir o montante que poderá ser contratado. Os custos desta compra serão rateados e cobrados dos usuários finais de energia elétrica.
Em nota, o MME afirmou que o decreto "visa regulamentar a contratação de reserva de capacidade para atendimento à necessidade de potência requerida pelo SIN (Sistema Interligado Nacional)".
A Secretaria-Geral da Presidência disse que a contratação é necessária pela dificuldade de modular a geração de energia por novas fontes (como das usinas eólicas ou solares).
"É preciso contratar reserva de capacidade na forma de potência, para suprimento do Sistema Interligado Nacional, sempre que houver necessidade", segundo a pasta, em nota.
O decreto regulamenta a "contratação de reserva de capacidade, na forma de potência". Este tipo de leilão ficou permitido após a publicação da MP 998, em setembro de 2020, mas ainda não havia sido regulamentado.
As térmicas a gás previstas na MP de privatização da Eletrobras serão construídas no interior das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Como os empreendimentos estão afastados do litoral, será preciso investir na construção de gasodutos, que levem o gás até às térmicas, também de linhas de transmissão, para que a produção chegue até o sistema nacional. Os custos serão repassados para a conta de luz de todos os consumidores.
Em outra frente, o governo busca solução para a crise de abastecimento prevista para 2020.
O MME deverá publicar nos próximos dias uma portaria que permitirá a contratação das chamadas térmicas "merchants", para tentar contornar um problema mais imediato: evitar um racionamento de energia diante da grave seca sobre os reservatórios das hidrelétricas.
O CMSE (Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico) propôs, na quinta-feira (27), a flexibilização de restrições operacionais em importantes barragens para tentar evitar a perda de água e discutiu a criação de um comitê para acompanhar a crise.
O governo já acionou usinas térmicas, que são mais poluentes e caras, e importa desde o fim de 2020 energia da Argentina e do Uruguai.
A seca projetada para o período de maio a setembro é a pior em 91 anos.
Para contornar o problema, o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) vem acionando o maior volume de energia térmica possível, o que deve manter as tarifas mais caras até o fim deste ano, segundo especialistas.
O decreto também foi publicado no dia em que houve uma falha em linha de transmissão de energia da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. O problema interrompeu o fornecimento de energia em diversos estados.
Segundo o ONS, o problema começou às 11h06, com o desligamento de uma das duas linhas que levam energia de Belo Monte para a região Sudeste. A segunda linha caiu às 11h26, derrubando sete turbinas da usina.
Para evitar que a falha se alastrasse, o ONS acionou o esquema de redução de carga, que prevê o desligamento de 7% da carga das distribuidoras de eletricidade. O operador não informou, porém, quantos consumidores foram afetados.