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Economia

Bolsonaro veta desindexação e sinaliza novo golpe à agenda de Guedes

Bolsonaro ainda ameaçou com 'cartão vermelho' integrantes da equipe econômica

Jair Bolsonaro (sem partido) e Paulo GuedesJair Bolsonaro (sem partido) e Paulo Guedes - Foto: Evaristo Sá/AFP

A política liberal do ministro Paulo Guedes (Economia) sofreu um novo baque. Nesta terça-feira (15), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) suspendeu o Renda Brasil e sinalizou que vetará a desindexação de salários e benefícios, uma das bases do Pacto Federativo que a equipe econômica articula com estados.

Versão ampliada do Bolsa Família, o Renda Brasil precisaria de mais recursos para ser lançado. A equipe econômica planejava revisar cerca de 2 milhões de benefícios destinados a idosos e pessoas com deficiência.

O secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues, também expôs a ideia de congelar temporariamente aposentadorias e pensões por dois anos para reduzir despesas públicas. Com isso, abriria espaço no Orçamento para um novo programa social.

"Até 2022, no meu governo, está proibido falar a palavra Renda Brasil. Vamos continuar com o Bolsa Família. E ponto final", afirmou Bolsonaro em um vídeo divulgado em redes sociais. "Congelar aposentadorias, cortar auxílio para idosos e pobres com deficiência, [é] um devaneio de alguém que está desconectado com a realidade. Como já disse, jamais tiraria dinheiro dos pobres para dar aos paupérrimos."

No vídeo, Bolsonaro ainda ameaçou com "cartão vermelho" integrantes da equipe econômica. Mais tarde, em uma videoconferência com representantes das operadoras de telefonia, Guedes disse que o cartão não era para ele, mas não explicou se haveria baixas na pasta por causa do episódio.

Integrantes da equipe econômica afirmam que Bolsonaro não foi pego de surpresa, como fez parecer no vídeo. O presidente já tinha sido informado da desindexação como uma possível saída para o Renda Brasil na semana passada.
O assunto, segundo auxiliares de Guedes, foi debatido na pasta na sexta-feira (11), e Waldery foi avisado de que o
presidente não concordava com a proposta.

No entanto, o secretário deu declarações públicas de que esta poderia ser uma saída para viabilizar o programa, o que causou surpresa entre assessores de Guedes. A iniciativa teria sido do próprio secretário, que aceitou conceder entrevista com intuito de esclarecer as propostas.

Na avaliação de articuladores políticos de Bolsonaro, o presidente preferiu usar as declarações de Waldery para melhorar ainda mais a popularidade, especialmente entre a população mais vulnerável. Mesmo assim, as declarações abriram uma crise no Ministério da Economia, com pressões pela demissão do secretário.

Dentro da equipe econômica há quem fale que a situação para ele ficou insustentável. Por outro lado, até na cúpula do ministério há quem defenda que não é o caso de demissão por causa do episódio.Também aumentou a pressão sobre Guedes.

Desde que assumiu a economia, o ministro planeja a desvinculação do Orçamento, algo que delegará para o Congresso a responsabilidade de manejar despesas, e a desindexação -fim da obrigatoriedade de revisão de salários, aposentadorias e benefícios pela inflação, o que leva ao congelamento.

A desindexação já é um dos pilares da negociação do governo com estados em torno do novo Pacto Federativo. A proposta foi enviada ao Congresso pelo governo no ano passado e ainda não deu sinais significativos de avanços.
Em troca de conter o aumento dos gastos, a União concederia vantagens aos estados na repartição de tributos.

A renegociação dos termos do novo arranjo com os entes federativos nessas bases também seria uma forma de compensar a União pelo socorro emergencial a estados e municípios. Com a pandemia, o déficit fiscal já é de cerca de R$ 830 bilhões, o equivalente a 12% do PIB.

Nos bastidores, Guedes diz acreditar que pode obter cerca de R$ 37 bilhões com a retirada do aumento da inflação de diferentes despesas obrigatórias. A proposta que reforma o Orçamento pode alterar o mínimo destinado para saúde e educação, além de impedir o reajuste automático anual para servidores. Outra proposta ainda extingue fundos públicos.
O plano do ministro é desobrigar, desvincular e desindexar o Orçamento para reduzir as despesas obrigatórias por meio de uma PEC (proposta de emenda à Constituição).

Os "3 Ds" são considerados internamente como o grande plano de Guedes e vinham sendo conduzidos depois das recentes pressões para se alterar o teto de gastos da União e do pedido do presidente para que se encontre uma alternativa ao aperto nas contas públicas, de forma que o ajuste não prejudique o plano de tentar a reeleição em 2022.

Segundo assessores de Guedes, as declarações de Bolsonaro no vídeo indicam que esta será a próxima fronteira de desgaste depois das discussões em torno de uma agenda de mais gastos com obras públicas para viabilizar a retomada por meio do programa Pró-Brasil, divulgado sem que Guedes tivesse participado das discussões.

Bolsonaro, que deverá lançar o programa nas próximas semanas, o adotou como guarda-chuva de medidas para o reaquecimento da economia, que segue estagnada em meio à pandemia da Covid-19. Quando foi anunciado, no fim de abril, Guedes chamou o plano de "PAC da Dilma" e trocou críticas com o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, a quem chamou de traidor por conhecer a situação fiscal do país e, mesmo assim, pilotar um programa que incentiva gastos.

O programa, para Guedes, poderá levar o governo ao descumprimento do teto de gastos, regra que corrige despesas pela inflação do ano anterior. O plano, no entanto, é uma ferramenta importante para que Bolsonaro consiga retribuir deputados e senadores com verbas em troca de apoio a projetos no Congresso.

Nas rodas de conversa de congressistas, especialmente os do chamado centrão, grupo que reúne representantes de partidos como PP, PL e Republicanos que agora integram base de apoio de Bolsonaro, o chefe da Economia já é comparado (consideradas as proporções) a Guido Mantega.

O ministro da Fazenda da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) foi atropelado por medidas costuradas pela presidente e o então secretário do Tesouro, Arno Augustin. Para esse grupo, não faltam sinais da perda de poder de Guedes no governo.
Na semana passada, por exemplo, o governo deu ao ministro Luiz Eduardo Ramos (Governo) uma cadeira na JEO (Junta de Execução Orçamentária). Antes, o órgão era composto por Guedes e Braga Netto (Casa Civil).

No mês passado, Guedes já tinha passado por uma rodada anterior de fritura quando Bolsonaro falou publicamente que a proposta da Economia para o Renda Brasil não seria enviada ao Congresso. Como visto nesta terça, o tratamento conferido pelo presidente publicamente ao ministro não dá sinal de mudança. Mesmo assim, aliados garantem que ele não tem intenção de sair do governo.

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