Câmara aprova texto-base da "PEC da Transição" em segundo turno; votação segue
Proposta é a prioridade do futuro governo Lula. Emenda à Constituição que abre espaço no Orçamento para promessas de campanha já passou no Senado
A Câmara dos Deputados aprovou, em segundo turno, na tarde desta quarta-feira (21), o texto principal da "PEC da Transição", proposta de Emenda à Constituição que abre espaço no Orçamento de 2023, com um impacto de R$ 168 bilhões. A medida garante o Bolsa Família de R$ 600 no próximo ano, além de ampliação de outras despesas, como investimentos.
Os deputados ainda vão analisar sugestões de alterações antes de finalizar a votação do texto, que voltará em partes para o Senado. No segundo turno, a PEC foi aprovada por 331 votos a favor, contra 163.
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O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), anunciou no plenário que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pediu para a PEC voltar para análise da Casa. Isso ocorrerá porque a PEC foi alterada em partes. Segundo Lira, há um compromisso do Senado em não alterar o texto da Câmara, permitindo a sua promulgação ainda nesta semana.
O governo de transição corre contra o tempo e tenta aprovar o Orçamento de 2023 ainda nesta quinta-feira, no último dia da atividade legislativa neste ano. Depois, seria necessário convocar uma sessão do Congresso durante o recesso para votar o Orçamento na próxima semana.
O dia foi de negociações para garantir a presença dos deputados na sessão. A PEC foi aprovada com amplo apoio dos partidos que buscam espaço no futuro governo, como União Brasil e PSD. Enquanto apenas o PL (do presidente Jair Bolsonaro), o Republicanos e o Novo orientaram contra a PEC.
O acordo que garantiu ampliar em R$ 9,7 bilhões o valor das emendas individuais, decorrente da divisão do orçamento secreto, também ajudou a consolidar o apoio. Esse dinheiro será repartido entre todos os deputados e senadores. O governo eleito terá os outros R$ 9,7 bilhões (estavam reservados R$ 11,4 bilhões para o orçamento secreto no próximo ano), ampliando os recursos para ministérios.
A desidratação da PEC, com a redução do prazo de dois para um ano, também ajudou a proposta.
Mais cedo, em uma vitória para o governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a Câmara manteve a obrigação de a futura gestão propor em seis meses uma nova regra para as contas públicas do país. Isso foi discutido durante o primeiro turno da PEC. No total, 366 deputados votaram contra a mudança.
Teto de gastos
Hoje, a principal regra fiscal do país é o teto de gastos, que trava as despesas federais à inflação do ano anterior. A regra está presente na Constituição. A PEC, porém, autoriza o futuro governo a propor uma nova regra para substituir o teto por meio de lei complementar, ou seja, sem mudar a Constituição.
Isso é uma vantagem para o governo porque aprovar uma lei complementar exige o apoio de 257 dos 513 deputados (uma PEC tem uma votação mínima de 308 deputados). Já no Senado, o projeto passa com 41 votos, contra 49 de uma PEC (são 81 senadores).
Com isso, por mais que a “PEC da Transição” tenha validade de um ano, o governo terá um caminho mais fácil em 2023 para ajustar o orçamento. Agentes do mercado também defendem a medida porque dá previsibilidade para a substituição do teto.
O assunto foi votado por meio de um destaque do partido Novo, que quer a manutenção do teto. Na noite de terça, essa votação foi adiada porque o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), temia a aprovação do destaque. Deputados do PT e aliados também viam chances de derrota, por isso o adiamento.
Entre ontem e hoje, os deputados angariaram mais apoio e conseguiram colocar parlamentares na sessão (que ocorre de forma virtual e presencial) para manter a norma. O partido Republicanos, por exemplo, que votou contra a PEC resolveu se manifestar a favor da regra fiscal fora da Constituição, engrossando o apoio.
Primeiro turno
Após o PT ceder e aceitar reduzir o prazo da “PEC da Transição” de dois para um ano, a Câmara dos Deputados aprovou a proposta em primeiro turno de votação na noite dessa terça-feira (20). A PEC já foi aprovada no Senado e está travada na análise dos deputados.
A PEC muda o teto de gastos para permitir a ampliação das despesas acima da inflação, como é hoje. A votação ocorreu após o governo eleito — representado pelo futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad — firmar um acordo com líderes partidários aceitando que a autorização de gastos fora do teto prevista na PEC dure apenas um ano em vez de dois, como aprovado no Senado.
Sem volta ao Senado
O corte no prazo não obrigará a PEC a voltar para o Senado, porque a mudança é considerada como uma supressão no texto e não uma alteração.
Na mesma reunião, ficou acertada uma divisão dos recursos do orçamento secreto, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), entre o novo governo e parlamentares. Essa divisão agradou aos deputados, porque eles terão mais recursos para suas emendas individuais. Dessa forma, a PEC ganhou fôlego na Câmara.
Esse trecho das emendas foi incluído na PEC e voltará ao Senado.
Apesar de ser um texto desidratado em relação ao aprovado por senadores, o PT avalia que a PEC desata nós do Orçamento, como a falta de dinheiro para investimentos públicos e retomada de programas como o Minha Casa, Minha Vida.
O volume de recursos previsto na PEC aprovada no Senado garante não só a manutenção do Bolsa Família em R$ 600 como o aumento real do salário mínimo e a recomposição de verbas para programas como o Farmácia Popular.
O fator STF
A proposta estava travada na Câmara desde o início do mês, depois de ser aprovada no Senado. Entre domingo e segunda-feira, porém, duas decisões do STF embolaram as negociações.
O ministro do STF Gilmar Mendes decidiu que parte do Bolsa Família poderia ser paga fora do teto de gastos, que trava as despesas federais — o que deu um plano B claro para o governo eleito, aumentando seu poder de barganha.
E, na segunda-feira, a maioria do plenário da Corte declarou inconstitucional o chamado orçamento secreto, usado nos últimos anos para distribuir recursos para parlamentares aliados da cúpula do Congresso Nacional.
As negociações para a aprovação da PEC vem se arrastando desde a vitória de Lula nas urnas. A decisão por bancar uma mudança na Constituição para ampliar gastos em 2023 ocorreu na primeira semana depois do segundo turno.
Ao mesmo tempo em que enfrentou resistências do mercado, por conta do seu valor, a PEC tem sido usada por Lula para montar a sua base aliada e definir os espaços na Esplanada dos Ministérios. Partidos que apoiaram Lula durante a campanha e legendas neoaliadas vão ganhar ministérios e participação no governo pela PEC e também para fazerem parte do governo ao longo dos próximos anos.
Além da pressão por mudanças no texto, o PT enfrenta a pressão do tempo. A depender da extensão das alterações no texto, a PEC precisaria ser analisada novamente pelos senadores. Ela foi aprovada na Casa no início de dezembro. Mas o Congresso só tem até quinta-feira, fim do ano legislativo, para aprovar a PEC e o Orçamento de 2023, como prevê a Constituição.
A possibilidade que começou a ser discutida agora é convocar sessão do Congresso Nacional na próxima semana, de forma extraordinária, para concluir a votação do Orçamento.
A PEC foi votada depois do governo e do Congresso fecharem um acordo para dividir os R$ 19,4 bilhões que seriam destinados ao orçamento secreto (chamado tecnicamente de emendas de relator) em 2023.
Ficou decidido dividir os valores igualmente entre emendas individuais (a que todos os deputados e senadores têm direito e são dívidas igualmente) e recursos livres para custeio dos ministérios. Ou seja, o governo ficaria com uma parte do dinheiro. Assim, serão R$ 9,7 bilhões para emendas e mais R$ 9,7 bilhões para o governo.
O valor para as emendas individuais será fixado na "PEC da Transição". Esse trecho especificamente será analisado pelo Senado, o que pode ocorrer ainda nesta semana.
A proposta
A PEC aprovada no Senado e na Câmara prevê aumentar o teto de gastos em R$ 145 bilhões e mais R$ 23 bilhões fora do teto para investimentos. Isso ficará mantido na Câmara.
O texto também tira do teto despesas de universidades e instituição científicas bancadas com recursos próprios, o que faz o impacto da medida subir para R$ 193,7 bilhões.
A proposta do Senado também tirava do teto qualquer despesa feita com empréstimos internacionais. Isso desagradava aos deputados que temiam a possibilidade de um "teto infinito".