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CPI Americanas

CEO da Americanas diz à CPI que ex-diretores esconderam 'fraude de resultado'

Leonardo Coelho Pereira afirmou que investigação interna já tem elementos para abandonar nomenclatura inicial de 'inconsistências contábeis'

Leonardo Coelho, CEO da Americanas Leonardo Coelho, CEO da Americanas  - Foto: Andressa Anholete

O atual CEO da Americanas, Leonardo Coelho Pereira, afirmou à CPI que apura o escândalo contábil da varejista na Câmara dos Deputados, que a empresa já tem documentos e elementos para abandonar a nomenclatura inicial de "inconsistências contábeis" e admitir que houve "fraude" na empresa, o que levou ao rombo bilionário de quase R$ 20 bilhões.

-- Inicialmente demos tratamento de inconsistência contábil, mas agora temos elementos para dizer: ela se chama fraude -- afirmou o executivo aos deputados, no início de depoimento que está em curso neste momento.

Ele afirmou que houve intenção da administração da empresa de ocultar a real situação financeira da empresa, aumentando artificialmente o lucro da empresa:

-- A fraude da Americanas é uma fraude de resultado -- disse o executivo, explicando que ao inscrever de forma errada a dívida com fornecedores (risco sacado), a empresa produziu lucro artificial nos balanços.

Ele afirmou que, sobre um lucro fraudulento, foram pagos dividendos a acionistas, incluindo o trio de bilionários acionistas de referência Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles. No entanto, disse ainda não ter se debruçado sobre esses pagamentos.

Também disse que o lucro inexistente baseou bônus pagos além dos salários aos diretores como recompensa pelo desemprenho financeiro falso e ainda baseou o pagamento de impostos. A empresa pagou, em 2022, R$ 1,7 bilhão em impostos, afirmou o executivo.

Pereira compartilha documentos com os parlamentares que embasaram o relatório divulgado hoje em fato relevante. Ele mostra uma troca de e-mails entre antigos diretores, com planilhas que mostram números diferentes de prejuízos e lucros apresentados para os funcionários internamente e para o conselho administrativo.

Os documentos possuem uma coluna com a nomenclatura "visão interna", apresentando um prejuízo de R$ 733 milhões. Outra coluna com a nomenclatura "visão conselho" mostrava lucro de R$ 2,8 bilhões.

Ele exibiu mensagens trocadas por ex-diretores da Americanas, antes da descoberta da fraude, em que argumentam que dar transparência aos números reais da empresa seria 'morte súbita'. As evidências iriam no sentido de que acionistas e Conselho de Administração não foram informados sobre a verdadeira situação da companhia.

Pereira mostrou o que seria a falsificação de assinaturas em cartas de 'risco sacado':

-- O documento foi escaneado, a assinatura recortada e colocado em um documento falso -- disse.

O CEO da Americanas mostrou uma troca de mensagens do antigo diretor Timotheo Barros. O texto diz: "Não podemos mostrar para conselho e o mercado nada acima de R$ 3 bi. Será morte súbita".

'Perplexo', reage deputado, que aponta 'quadrilha'
O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), um dos autores do requerimento de abertura da CPI, se disse "perplexo" com as revelações:

-- O que parece é que uma quadrilha dirigiu a Americanas, com a conivência de auditorias e bancos.

Conivência de auditores
O executivo acusa auditores de mudar análise a pedido da diretoria da empresa. Pereira afirma que a consultoria KPMG permitiu a alteração de cartas de controles a pedido da diretoria da companhia Americanas.

De acordo com ele, um relatório inicial da KPMG mostrava "deficiências significativas nas balanços da empresa", no início de 2017. O documento não foi divulgado e acabou sendo substituído por uma carta de "recomendações que merecem atenção da Administração", sem apontar as deficiências anteriores.

Empresa detalhou esquema fraudulento
A revelação desse rombo em janeiro levou a Americanas à recuperação judicial. A empresa divulgou hoje fato relevante com detalhes do esquema fraudulento que provocou perdas bilionárias à empresa.

As ações da Americanas dispararam nesta terça-feira, após a empresa divulgar resultados preliminares da investigação independente que vem sendo feita sobre a fraude que abriu um rombo bilionário nas finanças da companhia.

O relatório, apresentando ontem ao Conselho de Administração da companhia, mostra um esquema de contratos sem a efetiva contratação de fornecedores e com participação dos diretores, incluindo o ex-CEO Miguel Gutierrez, como antecipou o colunista Lauro Jardim.

Os documentos analisados indicam que "as demonstrações financeiras da companhia vinham sendo fraudadas pela diretoria anterior" e revelam "os esforços da diretoria anterior para ocultar do Conselho de Administração e do mercado em geral a real situação de resultado e patrimonial da companhia".

Gutierrez comandou a Americanas por cerca de duas décadas e deixou a companhia no fim do ano passado, antes de o escândalo vir à tona. Além dele, a investigação indicou a participação de outros diretores, já afastados, na fraude. São eles:

Miguel Gutierrez, que deixou a companhia em 31 de dezembro de 2022.

José Timótheo de Barros, afastado de suas funções executivas em 3 de fevereiro de 2023 e que comunicou sua renúncia em 1º de maio de 2023.

Anna Christina Ramos Saicali, Márcio Cruz Meirelles, Fábio da Silva Abrate, Flávia Carneiro e Marcelo da Silva Nunes, também afastados em 3 de fevereiro de 2023.

De acordo com o fato relevante, a fraude ocorreu por um período "significativo" e atingiu, em números preliminares e não auditados, o montante de R$ 21,7 bilhões em 30 de setembro de 2022.

Ainda segundo o comunicado, foram identificados diversos contratos de verba de "propaganda cooperada" e instrumentos similares (“VPC”), que teriam sido artificialmente criados para melhorar os resultados operacionais da companhia.

Contratos fictícios
Esses contratos eram lançados em balanço como redutores de custo. Mas, segundo o relatório, não havia a efetiva contratação de fornecedores. Eles são incentivos comerciais comuns no setor de varejo.

O relatório explica a maneira como essas operações foram descriminadas nos balanços da companhia.

As contrapartidas contábeis para esses contratos "se deram majoritariamente na forma de lançamentos redutores da conta de fornecedores, totalizando, em números preliminares e não auditados, R$ 17,7 bilhões em 30 de setembro de 2022".

A diferença de R$ 4 bilhões teve como contrapartidas lançamentos contábeis em outras contas do ativo da companhia, diz o documento.

Financiamentos de compras
A investigação apontou ainda que, como forma de gerar o caixa necessário para a continuidade das operações da Americanas, a diretoria anterior contratou uma série de financiamentos "sem as devidas aprovações societárias e todas inadequadamente contabilizadas no balanço patrimonial da companhia de 30 de setembro de 2022 na conta fornecedores".

No relatório, a empresa detalha essas operações:

Operações de financiamento de compras (risco sacado, forfait ou confirming) de R$ 18,4 bilhões

Operações de financiamento de capital de giro de R$ 2,2 bilhões

De acordo com a Americanas, "a indevida contabilização dessas operações de financiamento nos demonstrativos financeiros não permitiu a correta determinação do grau de endividamento da companhia ao longo do tempo".

A Americanas vem adiando a divulgação dos resultados trimestrais desde que o escândalo se tornou público, em janeiro. A empresa não divulgou nem o balanço do quarto trimestre nem do primeiro trimestre deste ano.

Rombo revelado
O rombo bilionário de cerca de R$ 20 bilhões foi revelado ao público por Sérgio Rial em 11 de janeiro, após nove dias no cargo de CEO. Ele havia assumido o posto após a saída de Gutierrez. Mas deixou o comando da empresa no mesmo dia em que trouxe à tona o que chamou de "inconsistências contábeis".

Com isso, a dívida da empresa dobrou e passou a mais de R$ 40 bilhões. A companhia entrou com pedido de recuperação judicial logo depois.

Dos executivos envolvidos na fraude, segundo a investigação preliminar, um já foi ouvido pela CVM. Gutierrez prestou depoimento na autarquia no fim de março em audiência fechada.

O trio de acionistas de referência, os bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Sicupira, nega envolvimento na fraude. Pelo plano de recuperação judicial, eles farão uma injeção de R$ 10 bilhões na empresa.

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