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CEO do AutiBank promete regularizar pagamentos, mas vai priorizar os que não processaram a empresa

Mensagem de empresário suspeito de pirâmide financeira foi enviada no mesmo dia em que O Globo revelou primeiros bloqueios em contas do grupo determinados pela Justiça

Yuri Medeiros Correa, CEO do AutiBankYuri Medeiros Correa, CEO do AutiBank - Foto: Reprodução

Após quase um mês de silêncio, Yuri Medeiros Correa, CEO do AutiBank, reapareceu em um comunicado publicado nas redes sociais da empresa na manhã da terça-feira (22). No texto, o niteroiense, que é réu por estelionato e ação criminosa no Ceará, repete promessas feitas desde a virada do ano, quando investidores tiveram pagamentos interrompidos, e diz que está "em vias finais da regularização dos aportes financeiros para a retomada de todas as pendências" junto a clientes e colaboradores. Em uma mensagem enviada simultaneamente em um grupo de funcionários no WhatsApp, à qual O Globo teve acesso, o próprio Yuri ressaltou, porém, que a prioridade será "daqueles que não processaram a empresa".

Tanto o novo anúncio quanto a afirmação do CEO surgiram poucas horas depois de O GLOBO revelar, em reportagem publicada também na manhã desta terça, que a Justiça havia imposto os primeiros arrestos em contas ligadas ao AutiBank em ações movidas na esfera cível por clientes lesados pelo grupo. Ao todo, foi determinado o bloqueio de quase R$ 150 mil no âmbito de dois processos, um tramitando no Rio de Janeiro e outro no estado de Goiás.

Procurado pelo Globo, Yuri reclamou do que chamou de "advogados carne de pescoço", que estariam induzindo vítimas do grupo a buscar os próprios direitos. Para o empresário, esses profissionais "viram oportunidade de ganhar dinheiro em cima do problema dos demais". Na maior parte dos processos, o empresário é apontado pelos investidores como o mentor de um esquema de pirâmide financeira de proporções nacionais.

"Não foi dito que não efetivaremos os pagamentos daqueles que nos processaram, apenas que nossa prioridade será os que acreditaram na empresa até aqui. É o justo", acrescentou o empresário.

Os próprios investidores, contudo, não interpretaram do mesmo modo. Nos três grupos de vítimas dos quais O Globo faz parte, a fala do CEO foi vista, de modo uníssono, como uma ameaça. "É pra quem não entrou ainda seguir sem entrar na Justiça", afirmou um cliente. "Isso é para estancar o número de processos", concordou outro. "É nítido que isso é jogada dele", afirmou um terceiro, completando: "Estava sumido todos esses dias/meses, aí sai essa reportagem de bloqueio de valores e emitem essa nota. E ainda com desaforo, iludindo a gente para não entrarmos na Justiça, como se estivéssemos errados".

Mensagens vagas e muitas vezes contraditórias enviadas pela empresa ou pelo CEO com promessas de solução vêm sendo uma constante desde que a empresa entrou em crise. No dia 4 de fevereiro, por exemplo, houve a primeira menção a um acordo com um "fundo estrangeiro". Na ocasião, o grupo assegurou que o negócio já havia sido inclusive sacramentado uma semana antes e que, a partir da parceria com o fundo dos Emirados Árabes, os pagamentos seriam retomados até 15 de fevereiro. O prazo, como todos os outros apresentados anteriormente, não foi cumprido.

Os comunicados enviados pela empresa também citaram diferentes razões pelas quais o problema teria começado. A principal delas seria um processo interno de compliance motivado ora por um golpe do qual o próprio AutiBank teria sido vítima, ora pelas tratativas com o tal fundo de investimentos, a depender da mensagem. O imbróglio teria bloqueado todas as contas da empresa e até do CEO por semanas a fio, impedindo a operação.

Fundado no início de 2020, como O Globo mostrou no fim de fevereiro, o AutiBank se expandiu rapidamente e, pouco mais de um ano depois, já tinha unidades físicas em dez capitais, espalhadas pelas cinco regiões do país, apostando inclusive em grandes nomes da música para captar clientes, tendo patrocinado apresentações de artistas como Gusttavo Lima, o sertanejo Leonardo e os Barões da Pisadinha, entre outros. Sem nenhum registro como instituição bancária no Banco Central, embora se apresente como banco digital, o AutiBank atuava sobretudo, até suspender as operações, persuadindo pessoas a contraírem empréstimos junto a bancos tradicionais.

O principal alvo eram aposentados, pensionistas, militares e servidores de modo geral, que possuem margem maior no consignado, modalidade na qual o desconto é feito na folha de pagamento. O acordo funcionava assim: o cliente era convencido a repassar o valor obtido à empresa, que se comprometia, mediante um termo de "negociação de dívida", a assumir as prestações, quitando o montante total após seis meses, que podiam ser renováveis por outros seis. Em alguns casos, os aportes eram feitos com recursos próprios.

Além disso, um rendimento sobre o valor do empréstimo, em geral de 12% dividido em seis vezes, era entregue mensalmente ao contratante. Não havia, em nenhuma cláusula dos contratos aos quais o Globo teve acesso, qualquer referência às transações que eram realizadas para garantir a lucratividade da operação.

Yuri é acusado de vincular o AutiBank a um esquema nos mesmos moldes no Ceará, baseado em acordos associados aos empréstimos. Ao indiciar 12 pessoas, a polícia chegou a pedir a prisão preventiva de três delas, entre os quais o próprio Yuri, todos apontados como "o comando da aludida organização criminosa". Para justificar a medida, foi citada a "urgente necessidade de garantia da ordem pública e para assegurar a aplicação da lei". Embora tenha apontado, em declaração ao Globo, que o niteroiense "é um dos mentores do esquema", o Ministério Público cearense não concordou com a prisão, por entender "que não estavam presentes os requisitos".

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