Comissão explicita dificuldade do governo na reforma administrativa
O relator, deputado Arthur Maia (DEM-BA), defendeu que a reforma também tenha efeito para todos os Poderes, o que amplia o lobby do funcionalismo contrário à proposta
A instalação da comissão especial da reforma administrativa, nesta quarta-feira (9), evidenciou a dificuldade que o governo terá pela frente na tentativa de mudar as regras do serviço público. Além disso, de largada, o relator, deputado Arthur Maia (DEM-BA), defendeu que a reforma também tenha efeito para todos os Poderes, o que amplia o lobby do funcionalismo contrário à proposta.
O colegiado foi instalado com sete das 34 vagas de titulares vagas. Delas, quatro são de partidos da base: uma do PSD, uma do PSL e duas do Republicanos. Há ainda duas vagas do MDB e uma da Rede, que seria ocupadA pela deputada Joenia Wapichana (RR). Fora isso, 18 das 34 vagas suplentes estão vazias.
Os entraves ficaram evidentes em outros momentos, inclusive na dificuldade de conseguir quórum para eleição do presidente da instalação. Foram 17 votos válidos e dois em branco.
Além disso, partidos ligados ao presidente Jair Bolsonaro colocaram na comissão deputados ligados a corporações, especialmente da bancada da segurança pública. Esse setor conseguiu aliviar regras na reforma da Previdência, aprovada em 2019, com apoio de Bolsonaro.
Leia também
• Lira promete instalar até quarta comissão especial que vai analisar reforma administrativa
• Pacheco e Lira divergem sobre apoio do governo
• Comissão aprova admissibilidade da reforma administrativa e texto avança na Câmara
Relator da reforma na comissão especial da Câmara, Maia afirmou que o Brasil precisa de um serviço público mais eficiente e sustentou que a proposta seja mais dura que a versão original, enviada pelo governo em setembro do ano passado.
"Não me sinto confortável em fazer uma reforma apenas para parte do funcionalismo", declarou o relator, ao defender a mudança nas regras de militares e servidores do Judiciário. "Quero, de largada, declarar que eu acho isso absolutamente razoável", disse.
Em discurso após ser escolhido relator da PEC (Proposta de Emenda à Constituição), Maia avaliou que o Estado se transformou em sinônimo de inércia e incompetência e defendeu que não se transforme o debate em uma disputa entre defensores e inimigos do funcionalismo.
"O pior dos nossos pecados será transformar o debate que pode ser fecundo e produtivo para o Brasil em um debate, em uma disputa daqueles que se dizem defensores do funcionalismo público e daqueles outros que serão tachados de inimigos do funcionalismo público", disse.
Para ele, a reforma tem que tratar da cláusula de desempenho para servidor público, estabilidade como existe hoje e como serão mantidos os cargos em confiança e os cargos em comissão. "Temos sim, portanto, que fazer aqui um debate que, de fato, bote o dedo na ferida e possa melhorar e qualificar o nosso serviço público."
Já o presidente da comissão especial, deputado Fernando Monteiro (PP-PE), prometeu ouvir todos os integrantes do colegiado, especialistas e entidades de classe para que o texto seja bem costurado e afirmou que a proposta vai manter os direitos da maioria dos servidores públicos.
Em seu discurso, Monteiro prometeu imparcialidade e disse que não aceitará manobra. "Aqui, não seremos nem governo, nem oposição. Seremos o promotor de um diálogo amplo, franco e aberto."
O colegiado terá até 40 sessões (do plenário da Casa) para propor mudanças ao mérito do texto.
Aliados do governo reconhecem que a proposta terá dificuldade para avançar na Câmara. Na CCJ, o relator do texto, Darci de Matos (PSD-SC), concluiu que a proposta enviada pelo governo não viola princípios constitucionais.
Matos apresentou três mudanças na CCJ para suprimir trechos de dispositivos que foram considerados inconstitucionais: o acréscimo de oito princípios à administração pública direta e indireta de União, estados e municípios, o impedimento para que servidores possam acumular o cargo público com outras atividades remuneradas e o que dava ao chefe do Executivo o poder de extinguir ou fundir autarquias.
Em 22 de fevereiro, Lira estimou que a reforma administrativa seria votada no plenário da Casa antes do fim do primeiro trimestre. No dia 10 de maio, afirmou que sua intenção era enviar o texto para o Senado até julho, prazo que virou começo do segundo semestre em manifestação recente.
A expectativa agora é que a PEC saia da comissão especial em agosto. Aliados do presidente Jair Bolsonaro veem chance de a reforma sair do papel só em 2023, depois das eleições.
A reforma proíbe progressões automáticas de carreira, como as gratificações por tempo de serviço, e abre caminho para o fim da estabilidade em grande parte dos cargos, maior rigidez nas avaliações de desempenho e redução do número de carreiras.
Sem efeito sobre os atuais servidores e dependente de futuras regulamentações para mudar regras consideradas sensíveis, a medida não deve gerar economia aos cofres públicos no curto prazo.
O pacote atinge futuros servidores dos três Poderes na União, estados e municípios, mas preserva categorias específicas. Juízes, procuradores, promotores, militares, deputados e senadores serão poupados nas mudanças de regras.
O governo argumenta que essas categorias obedecem a normativos próprios, que não podem ser alterados por sugestão do Poder Executivo. Eventuais mudanças para elas precisariam ser propostas pelos próprios órgãos ou incluídas pelo Congresso.
Nos planos do governo, também estão a redução das remunerações de entrada no serviço público e a ampliação do número de faixas de salário para evolução ao longo da carreira. Esses pontos devem ser tratados em projetos que serão apresentados em um segundo momento.
O texto torna mais rigoroso o processo de seleção para entrada em um cargo público. Hoje, a pessoa aprovada passa por três anos de estágio probatório, que usualmente não cria nenhum impedimento para a nomeação efetiva.
Com a nova regra, a pessoa passará por dois anos com um vínculo mais frágil, considerado de experiência, e mais um ano de estágio probatório. Após as etapas, o governo selecionará os aprovados de acordo com as vagas disponíveis e a classificação aferida após o período de experiência.