Como CEO do Twitter, Elon Musk terá de agir rápido para resgatar confiança na rede social
Bilionário diz que pretender rever a política de 'banimento eterno'
O bilionário Elon Musk anunciou na sexta-feira (29) que será o diretor executivo do Twitter, cargo que já exerce na Tesla e na SpaceX. Ele fechou a compra da rede social na noite de quinta-feira, por US$ 44 bilhões, e no mesmo dia demitiu os principais executivos da empresa. Além disso, segundo fontes, Musk pretende rever a política do Twitter sobre o “banimento eterno” de quem publica ameaças, insultos ou mentiras — caso do ex-presidente Donald Trump.
Mas Musk terá de correr para estabelecer novas bases de confiança para o Twitter, após declarações genéricas sobre liberdade de expressão total e a falta de clareza sobre os rumos da rede social, afirmam analistas ouvidos pelo GLOBO.
Eles ressaltam que a desconfiança de anunciantes, governos e usuários torna ainda mais desafiadora a busca pelo crescimento da companhia, que vem perdendo engajamento entre os rivais Facebook, TikTok e Kwai.
Para eles, é preciso ir além da carta aos anunciantes, publicada na quinta-feira por Musk, na qual ele afirma ser importante haver uma plataforma “onde uma ampla gama de crenças possa ser debatida de forma saudável”.
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‘Rede sofre intoxicação’
Jesper Rhode, sócio da consultoria TR4nsform, diz que a empresa precisa de uma resposta rápida para se recuperar:
Nos últimos meses, aumentou a circulação de conteúdo como pornografia, criptomoedas e discursos extremistas. Isso não rima com liberdade de expressão. Hoje, a rede sofre uma espécie de intoxicação. E o anunciante não quer ter seu conteúdo associado a isso. Agora, uma liberdade de expressão ampla significa o quê exatamente? Ninguém sabe para onde a companhia vai. Ele precisa criar uma plataforma de confiança para crescer. Primeiro, precisa de um CEO com credibilidade e de Musk explicar seus próximos passos.
Na sexta mesmo, o bilionário anunciou a criação de “um conselho de moderação de conteúdo, com pontos de vista bastante diversos. Nenhuma grande decisão de conteúdo ou reintegração de conta acontecerá antes que o conselho se reúna.”
Segundo Rhode, Musk já disse que pretende criar um super app e introduzir novas fontes de receita, como blockchain, NFTs (arte digital) e e-commerce. Mas para isso, diz, é preciso resolver a questão dos robôs.
"Há oportunidades, e pode ser criada uma nova plataforma para ajudar o usuário. Mas é preciso recuperar a credibilidade", afirma ele. "Sem isso, a rede vai continuar perdendo espaço para os rivais. Os jovens hoje buscam informações sobre política no TikTok."
Segundo dados da consultoria comScore, a média mensal mundial de tempo dos usuários no Twitter caiu 0,6% este ano em relação a 2021, para 86 minutos. É um movimento inverso ao das outras redes: o TikTok teve alta de 45,3% (para 576 minutos), o Facebook, de 4,2% (563 minutos), o Instagram avançou 13,9% (433 minutos), e o Kwai cresceu 35% (331 minutos).
Dan Ives, analista sênior da Wedbush Securities, considera que será “uma batalha árdua” consertar o ativo problemático que se tornou o Twitter”. Segundo ele, apesar de ter sido uma das aquisições mais caras já registradas no setor de tecnologia, é preciso haver mudanças na plataforma.
‘Feudalismo digital’
Ives lembra que é preciso aumentar a monetização, com atração de mais anunciantes e cortes de pessoal a curto prazo. A médio e longo prazos, o desafio é a criação do super app X, inspirado no chinês WeChat. Há ainda o potencial de “adicionar o Twitter ao ecossistema de Tesla e SpaceX”.
Luca Belli, coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio, vê oportunidades na integração do Twitter aos veículos da Tesla, como pagamentos instantâneos e anúncios. No entanto, alerta:
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"Mas é preciso um direcionamento e uma clareza sobre o futuro do Twitter. Musk está criando uma espécie de feudalismo digital. Ele vai tirar a empresa da Bolsa de Valores e não vai mais precisar apresentar planos de negócios ao mercado. É preciso saber como os anunciantes vão reagir nas próximas semanas."
Ontem não houve negociação dos papéis na Bolsa de Nova York. A retirada definitiva será no dia 8 de novembro.
Para Belli, o principal problema da empresa é político:
"Não é apenas se preocupar se Trump pode voltar ou não. A questão é saber como será a gestão dos algoritmos. Nenhuma marca quer estar associada a conteúdos de ódio."
GM suspende anúncios
Nesta sexta-feira (28), à noite, a General Motors (GM) informou ter suspendido temporariamente seus anúncios no Twitter. A GM, que é rival da Tesla, disse que quer entender melhor as mudanças da rede sob Musk.
Nilay Patel, editor-chefe do site The Verge, especializado em tecnologia, afirmou em artigo publicado ontem que os problemas com o Twitter são políticos. E ressaltou que o ativo mais valioso da rede social é sua base de usuários — o que inclui o próprio Musk.”Você acaba de comprar a si próprio por US$ 44 bilhões”. disse Patel.
Patel ressaltou que, para conquistar a confiança dos anunciantes, o Twitter terá de garantir a “segurança das marcas”, o que significa banir racismo, sexismo, transfobia e todo tipo de discurso de ódio. Só que isso vai atrair para Musk a ira de “seus novos fãs de extrema-direita”.
Trump comemorou ontem a compra do Twitter por Musk, mas não quis dizer se vai voltar à plataforma. Já o rapper Kanye West, que havia sido banido após declarações antissemitas, teve sua conta reativada — segundo a rede social, a suspensão havia sido por tempo limitado.
Enquanto isso, os executivos demitidos não saíram de mãos vazias. O ex-CEO Parag Agrawal vai receber US$ 40 milhões em indenização e participação acionária, segundo estimativas da Bloomberg.
O ex-diretor financeiro Ned Segal deve levar US$ 37 milhões, e a ex-diretora legal Vijaya Gadde, US$ 17 milhões. Algumas pessoas foram vistas ontem deixando a sede do Twitter com caixas, mas sites disseram que era uma encenação.
Já a fortuna de Musk sofreu um baque de US$ 10 bilhões, segundo a Bloomberg. No ano, seu patrimônio encolheu em US$ 66 bilhões — mas ele ainda é o homem mais rico do mundo, com US$ 204 bilhões. (*Com Bloomberg News)