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COP29

COP29: conferência do clima em Baku, no Azerbaijão, é marcada por tensão geopolítica

Para especialistas, dificuldade para chegar a acordos satisfatórios para todos reflete 'descompasso com a época'

Projeção luminosa representando Donald Trump é vista em Baku: "A crise climática não vai parar para um negacionista do clima" Projeção luminosa representando Donald Trump é vista em Baku: "A crise climática não vai parar para um negacionista do clima"  - Foto: Luis Robayo/AFP

O pano de fundo das muitas manifestações de insatisfação durante a COP29 é uma conjuntura geopolítica tensa. Além das circunstâncias de curto prazo, como resultados eleitorais e conflitos bélicos, a dificuldade de chegar a acordos satisfatórios para todos reflete transições de longo prazo, em que a riqueza relativa dos países se transforma e novas lideranças emergem.

As queixas dos países em desenvolvimento quanto ao fundo climático de US$ 300 bilhões anuais (R$ 1,7 trilhão) remetem à própria estrutura da conferência, assinala Maria Netto, diretora-executiva do Instituto Clima e Sociedade.

— Não se imaginava há três décadas que a China ia chegar a ser o que é hoje. Além disso, tem muitos países arrolados como emergentes, no lado que recebe ajuda, e não no lado que paga, e são grandes emissores per capita. É o caso dos produtores de petróleo, como a Arábia Saudita — explica Netto.

Também há nações onde um desastre climático causa impacto irrecuperável, sobretudo na África, onde alguns países chegam a perder entre 2% e 3% do PIB por causa de uma catástrofe.

— Não é possível colocar na mesma categoria dos países em desenvolvimento o Brasil e a Índia, de um lado, e Uganda, de outro. Neste último, a crise do clima se reflete imediatamente em uma crise fiscal, o que inicia um ciclo vicioso — diz Netto. — A convenção pode estar um pouco em descompasso com a época. É preciso revisar noções como a das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, que não são as mesmas dos anos 1990.

Novas lideranças
Desde o início da COP29, em 11 de novembro, já estava claro que um espectro pairava sobre ela: o retorno de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos, sacramentada dias antes. Quando ocupou a Casa Branca pela primeira vez, o magnata imediatamente anunciou a retirada de seu país, a maior economia do planeta, do Acordo de Paris. A expectativa é que o mesmo ocorra no ano que vem. O enviado americano para o Clima do atual governo, John Podesta, chegou a afirmar, em entrevista coletiva, que reconhece a “decepção” que seu país causa às demais partes da discussão sobre o clima. Por outro lado, estimou que a chegada de Trump pode “desacelerar, mas não reverter” a descarbonização da economia

Como as contribuições nacionais levam em consideração os esforços de todos os países para chegar ao aquecimento máximo de 1,5ºC do planeta, a ausência de uma nação tão relevante como os EUA faz com que as metas dos demais países empalideçam, observa David Tsai, gerente de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente. Existe também o risco de que o novo presidente americano decida inundar o mercado com petróleo barato, reduzindo para todos os demais o incentivo a investir em renováveis.

Porém, a estrutura federativa americana mitiga o impacto concreto da retirada de Trump. Em seu primeiro governo, o país deixou, de fato, o acordo, mas os estados avançaram no investimento em energias renováveis, até mesmo alguns alinhados ao presidente, como o Texas.

Segundo a analista climática Sofia Gonzales-Zuñiga, da ONG Climate Action Tracker, a estimativa de base para o impacto das políticas do novo governo, resumidas no controverso Projeto 2025, é de um acréscimo de 0,04ºC no aquecimento até o fim do século, além dos estimados 2,7ºC.

— Pode haver um efeito ainda maior, e difícil de quantificar, se outros países reduzirem suas ações como resposta à saída dos EUA do Acordo de Paris e dos esforços de financiamento da transição climática. Além disso, com políticas cada vez mais ambiciosas, chegar à neutralidade de carbono até 2050 está ficando cada vez mais difícil — lamenta.

Por outro lado, o afastamento dos americanos abre o caminho para a emergência de novas lideranças na transição energética e na descarbonização da economia global. Sede da próxima COP, o Brasil é visto como candidato natural a assumir maiores responsabilidades, sobretudo após a reunião do G20 no Rio, considerada bem-sucedida.

Turbinas "feias"
Mas a postura chinesa durante a COP29 também suscitou a impressão de que o gigante asiático pretende ocupar parte do espaço eventualmente deixado pelos EUA. Fugindo a seu comportamento em geral discreto, os representantes do país declararam sua ênfase em acordos Sul-Sul.

Além de Trump, há outras fontes de preocupação, tanto nos países ricos quanto em desenvolvimento. Governada por Javier Milei, que nega a mudança climática, a Argentina abandonou a COP29, levantando suspeitas de que pode acompanhar Trump e deixar também o Acordo de Paris.

Mais relevante, devido ao tamanho de sua economia e de seu papel na União Europeia, é a Alemanha, que terá eleições em fevereiro, com uma chance de vitória dos democratas cristãos liderados por Friedrich Merz. O candidato já deu declarações incompatíveis com o combate à mudança climática: considera a transição para veículos elétricos um erro e deseja desmontar turbinas eólicas por considerá-las “feias”.

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