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Benefício

Corte de gastos muda política de concessão do BPC

Novas regras buscam combater fraudes, mas podem dificultar acesso ao benefício

Corte de gastos muda política de concessão do BPC Corte de gastos muda política de concessão do BPC  - Foto: Divulgação

Com o intuito de combater fraudes e otimizar a gestão dos recursos públicos, o Governo Federal anunciou, recentemente, mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC). As alterações, que fazem parte do pacote de cortes de gastos liderado pelo Ministério da Fazenda, incluem a ampliação do conceito de grupo familiar, exigência de biometria e novas definições de incapacidade e impedimento de longo prazo.

O BPC é um auxílio assistencial garantido pela Lei Orgânica da Assistência Social (Loas) que não exige contrapartida como, por exemplo, contribuições ao INSS. Ele assegura um salário mínimo mensal para dois grupos específicos: idosos com 65 anos ou mais e provenientes de famílias carentes; e pessoas com deficiência de qualquer idade, cuja condição dificulte a realização de atividades cotidianas devido às limitações físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais.

Direito
 
Quase 6 milhões de pessoas recebem hoje o BPC. Atualmente, para ter direito ao benefício, é necessário que a renda familiar per capita seja de até 1/4 do salário mínimo (equivalente hoje a R$ 353) e que todos os integrantes da família estejam inscritos e com os dados atualizados no CadÚnico. Uma revisão do cadastro já está em curso e os beneficiários estão sendo convocados para atualizar seus dados ou fazer a inscrição no CadÚnico. 

A medida impacta cerca de 1,2 milhão de pessoas, mas até o momento, 800 mil ainda não atenderam à convocação para a entrega dos documentos necessários. Segundo informações do Governo Federal, ainda existe um grande número de beneficiários que não estão incluídos no Cadastro Único ou que estão com as informações desatualizadas há mais de 48 meses. "Estamos aperfeiçoando os mecanismos de controle para endereçar os principais problemas identificados", diz nota técnica do Ministério da Fazenda.

Mas além disso, outras mudanças em discussão visam intensificar ainda mais o controle sobre o benefício. No entanto, mesmo antes de entrarem em vigor, já enfrentam críticas por dificultarem o acesso e a manutenção do BPC.  “Uma coisa é combater fraudes; outra é criar obstáculos para milhões de pessoas em extrema pobreza”, explicou o advogado especialista em Direito Previdenciário, Rômulo Saraiva.

Renda

Uma das alterações mais debatidas é a inclusão de aposentadorias e pensões no cálculo da renda familiar. Atualmente, as rendas de idosos que ganham o salário mínimo não comprometem o acesso ao BPC. Contudo, o projeto de lei n.º 4614/2024, do deputado José Guimarães (PT-CE) – incluído no pacote -, propõe considerar essas rendas, mesmo que sejam de parentes que não morem na mesma residência.

Por exemplo, ao solicitar a inclusão no BPC, caso a pessoa receba auxílio financeiro de pais, filhos ou irmãos que não residam no mesmo domicílio, esses familiares serão contabilizados para o cálculo da renda familiar. Quando isso ocorrer e a renda familiar per capita ultrapassar um salário mínimo, a pessoa perderá o direito ao benefício. “Isso impede que dois idosos convivam sob o mesmo teto com renda mínima e contraria o Estatuto do Idoso e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência”, ressalta Saraiva.

Para acessar o BPC, também será obrigatório comprovar a incapacidade da pessoa de viver de forma independente ou de trabalhar. Além disso, cadastros desatualizados há mais de dois anos deverão ser renovados, incluindo a inserção da Classificação Internacional de Doenças (CID). Quem não realizar a atualização terá o benefício suspenso. 

Biometria

A biometria, que já é exigida para novos pedidos, também passará a ser obrigatória para aqueles que precisarem atualizar o cadastro. “A obrigatoriedade da biometria também é apontada como um obstáculo para beneficiários em áreas rurais ou com acesso limitado à tecnologia. Além disso, há temores de que operações de pente-fino possam revisar benefícios já concedidos, mesmo que as novas regras não tenham efeito retroativo imediato”, explicou o advogado especialista.

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na última semana, por mais de 260 votos favoráveis, as urgências dos projetos de lei que compõem o pacote de corte de gastos. A votação do mérito das propostas ficou para esta semana. Caso aprovado na íntegra, as mudanças das normas do BPC podem ser questionadas judicialmente, sobretudo em relação à constitucionalidade, segundo o advogado especialista. “Princípios como dignidade da pessoa humana, isonomia e vedação ao retrocesso social estariam em risco. Acredito que a questão pode chegar ao Supremo Tribunal Federal, que já possui precedentes sobre direitos sociais”, ressaltou Saraiva.

Futuro

Embora as mudanças ainda dependam de aprovação no Congresso Nacional, a percepção de um futuro mais rígido para o BPC gera incertezas. “O governo precisa equilibrar ajustes fiscais e a proteção social para não agravar a desigualdade no País”, ressalta o Rômulo Saraiva.

Para minimizar riscos de perda do benefício, especialistas recomendam manter o CadÚnico atualizado e reunir documentos que comprovem a renda e despesas do grupo familiar. Em caso de dúvidas ou necessidade de orientação jurídica, os beneficiários podem buscar ajuda na Defensoria Pública da União ou em advogados especializados.

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