Cortes no orçamento podem empurrar Censo para 2023, defendem sindicatos e ex-presidentes
O esforço da associação agora é tentar uma mobilização por verbas para manter a preparação da pesquisa
Confirmado o novo adiamento do Censo Demográfico, servidores e ex-presidentes do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) se mobilizam para tentar evitar que novos cortes orçamentários impeçam a realização da pesquisa mesmo em 2022, como quer o governo.
A avaliação é que os recursos disponíveis não são suficientes para manter a mobilização de pessoal nem para custear contratações de materiais e serviços necessários para realizar a pesquisa no ano que vem, gerando o risco de levar a operação para 2023.
O IBGE diz que começará tratativas com o ministério da Economia para realizar a pesquisa em 2022, " de acordo com cronograma a ser definido em conjunto com o Ministério da Economia". O instituto vem dizendo que parte do orçamento para aquisições e publicidade já foi separado com verbas de 2020.
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Nesta sexta (23), o secretário especial de Fazenda do Ministério da Fazenda, Waldery Rodrigues, confirmou que a pesquisa não será feita em 2021, pondo fim a meses de incertezas sobre sua realização. "Não há previsão orçamentária para o Censo", afirmou.
O adiamento era defendido pelos servidores do IBGE diante da piora da pandemia do novo coronavírus, sob o argumento de que não haveria verba para treinamento e equipamentos de segurança nem garantia de que os entrevistados abririam as portas para os pesquisadores.
Realizado a cada dez anos, o Censo pretende visitar todos os domicílios do país para coletar dados sobre seus moradores e, assim, compor um retrato detalhado da população brasileira. Para a edição atual, são estimadas visitas em cerca de 72 milhões de residências.
"O Censo é uma operação que envolve 200 mil pessoas, precisa ter um planejamento", diz a ex-presidente do IBGE Wasmália Bivar (2011-2016), que defendia o adiamento para 2022 mas vê riscos à operação. "Você começa agora a fazer um Censo em 2022. Não começa às vésperas do Censo."
A associação dos servidores do IBGE (Assibge) defende que os R$ 53 milhões que restaram no orçamento de 2021 para a pesquisa inviabilizam a preparação para 2022. Diretora da seção nacional da Assibge, a economista Dione Oliveira, lembra que em 2020, o instituto teve R$ 239 milhões para a pesquisa.
Ela defende que mesmo valor é necessário "para manter vivo o projeto". "É o mínimo para manter o pessoal contratado, atualizar as bases de dados, realizar os testes que ainda precisam ser feitos...", enumera.
Oliveira ressalta que o IBGE já contratou e treinou profissionais temporários para a pesquisa, cujos contratos agora estão em risco pela falta de verbas. O esforço da associação agora é tentar uma mobilização por verbas para manter a preparação da pesquisa.
Em abril, diante da redução do orçamento da pesquisa, o IBGE suspendeu concurso para a contratação de mais de 200 mil pessoas, que atuariam como recenseadores e supervisores. Naquele momento, a proposta orçamentária reservava R$ 71 milhões para a pesquisa, ante os R$ 2 bilhões necessários à sua realização.
Os dados coletados pelo Censo são fundamentais na definição de políticas públicas, como investimentos em educação, saúde e políticas habitacionais, por exemplo. A contagem da população é usada pelo governo também para calcular os repasses dos fundos de participação de estados e municípios.
A falta de atualização desses dados prejudica também outras pesquisas do IBGE, como a que mede o desemprego, já que as amostras da população são estimadas com base no Censo.
Bivar lembra que pesquisas feitas por instituto privados, como as pesquisas eleitorais, também dependem desses dados. "Quando forem fazer pesquisa para a eleição de 2022, essas pesquisas vão estar erradas."
Presidente do IBGE entre 2017 e 2019, o pesquisador associado do FGV/Ibre Roberto Olinto acrescenta que o setor privado também é usuário do Censo. "Se quer investir, seja na abertura de uma fábrica, seja para vender seu produto, tem que saber onde está o mercado, se tem mão de obra ou infraestrutura."
Desde que começou a ser feita, em 1872, a pesquisa deixou de ser realizada duas vezes, em 1910 e 1930. Na história recente, houve adiamento em 1990, no governo Fernando Collor de Mello, mas os dados acabaram sendo coletados em 1991.
O embate sobre as verbas para o Censo levou à renúncia de Susana Cordeiro Guerra, primeira presidente do IBGE nomeada pelo governo Bolsonaro, por indicação do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Ela deixou o cargo no dia 9 de abril. Para substitui-la, o governo indicou o diretor de Pesquisas do instituto, Eduardo Rios-Neto, mas dez dias após a indicação, seu nome ainda não foi oficializado no Diário Oficial.
Para o mercado, o cenário indica que o governo tem dado pouca atenção o processo. "O IBGE está perdendo sua agenda", diz Olinto. "Perde gente, não tem reposição de pessoas. Além do problema essencialmente do Censo, o próprio instituto está abandonado."
Em nota divulgada nesta sexta, o IBGE disse apenas que, "conforme anunciado hoje pelo Secretário Especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, o orçamento 2021 não traz recursos para a realização do Censo Demográfico e que, portanto, o Censo será adiado".
"O IBGE retomará as tratativas com o Ministério da Economia para planejamento e promover a realização do Censo em 2022, de acordo com cronograma a ser definido em conjunto com o ME", continua. A retomada do concurso, diz o instituto, será anunciada "assim que for possível".