De licor de cachaça a linguiça de boi, iguarias de olho na exportação
Pequenos produtores de Mato Grosso do Sul ganham o mercado internacional
Pequenas agroindústrias brasileiras começam a ganhar espaço no mercado internacional com itens que podem parecer até inusitados à primeira vista. Entre eles estão licores à base de cachaças produzidos em Mato Grosso do Sul e bebidas saborizadas com frutos, raízes e sementes da região. Há ainda a linguiça de Maracaju, que substitui a carne suína por cortes nobres de carne bovina, com adição de suco de laranja azeda da região. Geleias, temperos e farofas, todos sem conservantes, também estão na lista.
O que tem permitido que esses produtos originários de Mato Grosso do Sul e também de outras regiões do Brasil acessem o mercado internacional é o Agro.Br, um programa desenvolvido pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em parceria com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil).
Em torno de 360 agroindústrias pequenas e médias participantes do programa exportaram produtos entre 2022 e 2023. Mas o número de interessados é muito maior: no período, foram 1.340 inscritos.
Hamilton de Menezes Fernandes, sócio da Di Bonito Cachaça, localizada em Bonito (MS), é um dos produtores que participam do programa. A empresa produz 1 mil litros por mês de cachaça artesanal pura, envelhecida, saborizada com frutas como a guavira e a planta nó-de-cachorro, típica do cerrado, e licores à base de cachaça:
— Estamos no programa para exportar.
Por estar sediado em um dos principais destinos turísticos do país, Hamilton considera a aceitação dos visitantes - muitos estrangeiros - um termômetro para a venda dos produtos fora do país.
O empresário está conhecendo de perto os trâmites necessários para negociar com outros países e comemora a elaboração do portfólio da marca em inglês, espanhol, árabe e mandarim, um dos suportes do programa.
— Somos pequenos, sem esse apoio levaríamos muito mais tempo e teríamos mais dificuldades para começar a exportar. Sem falar que o custo para nós, empresários, é zero, e o ganho é incalculável — resume.
Levar para fora do país um produto da cultura regional também é o desejo da empresária Ana Carla de Assis Ferreira, da Novilha de Ouro, localizada em Maracaju (MS). A marca produz a linguiça de Maracaju – embutido com indicação geográfica feito exclusivamente de carne bovina.
Nos moldes da produção de linguiça caseira suína, o produto tem como ingrediente a carne bovina devido à abundância no Estado. Além de utilizar os melhores cortes da carne picados, a linguiça leva suco de laranja azeda da Serra de Maracaju, alho, salsinha e cebolinha. A carne é de gado Nelore, com garantia de criação no sistema de integração lavoura-pecuária.
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— A gente precisa desse gado de pasto, desse ‘sabor de terra’ do nosso rebanho — enfatiza Ana Carla.
A iguaria leva ainda o suco da laranja produzida na localidade.
— Só podemos usar o suco da fruta produzida em nosso solo, que possui o teor de pH necessário para fazer a conservação natural da linguiça — explica.
A empresa produz cinco a seis toneladas por mês de linguiça, hoje comercializada apenas em Mato Grosso do Sul.
— Temos expectativa de ampliar a produção para atingir novos mercados no âmbito nacional e estamos trabalhando nas adequações para equivalência de inspeção internacional — afirma Ana Carla.
Neste ano, ela esteve na comitiva do Gulfood - a maior feira B2B de alimentos e bebidas do Oriente Médio -, em Dubai, nos Emirados Árabes, em comitiva do Agro.Br.
Também de olho no mercado internacional, Rui Murilo Galvanini projeta um 2024 com aumento nas exportações dos produtos da sua empresa, a Vó Ermínia Alimentos. Sediada em Campo Grande (MS), a empresa familiar tem no portfólio pimentas, produtos no azeite (como tomate seco e berinjela), produtos em conserva (como ovos de codorna e alcaparras), temperos e farofas, geleias e chás.
Em 2023, exportou em torno de R$ 31 mil em mercadorias para o Paraguai, o que representa 0,5% do faturamento anual da empresa.
Mas a Vó Erminia quer mais.
— Estamos perto de fechar negócios com Portugal e Dubai. Nossa projeção é movimentar em torno de R$ 200 mil a R$ 300 mil com exportações a partir de 2024 — diz Galvanini.
Há expectativa de ampliar a produção, mas o empresário acredita que tem condições de atender o mercado internacional de maneira imediata.
Segundo ele, desde que participa do programa de fomento às exportações, que inclui rodadas de negócios e participação em feiras internacionais, tem tido de lidar com “problemas bons”, como a diferença de fuso horário e as línguas estrangeiras:
— Espanhol já falo bem, inglês estou aprendendo.
US$ 42 milhões em expectativas de negócios
O Agro.Br é um programa desenvolvido pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em parceria com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil). Segundo a diretora de Relações Internacionais da CNA, Sueme Mori, o programa gerou US$ 42 milhões em expectativas de negócios só em 2023, resultado de oito rodadas de negócios. Entre os países visitados estão Peru, Chile, China e Emirados Árabes.
Frutas (27%), mel (25%) e café (22%) estão na liderança das exportações por meio do programa. Também são representativos produtos como cacau, chocolate, pescado, nozes, azeite e cachaça. O programa está na segunda edição, realizada entre 2022 e 2023 e, entre os 1.340 inscritos estão produtores e empreendedores rurais, além de 106 cooperativas agrícolas.
— O agro acontece no interior do país e a característica principal do projeto é chegar direto nesse produtor, com perfil pequeno e médio, e mostrar para ele como exportar — afirma Sueme.
A iniciativa conta com sete escritórios estaduais, com consultores para atendimento e preparação para as etapas da operação.
O Agro.Br inclui consultoria personalizada, plano de ação com foco em documentação, trâmites e estratégia, divulgação do negócio, portfólio em 5 línguas, e participação em feiras e rodadas de negócios no exterior (os custos da viagem são por conta dos produtores e empresários).