ministro da Fazenda

Discurso de posse de Haddad agrada analistas, que cobram ações em relação à política fiscal

Derrota na questão das isenções sobre combustíveis levanta dúvidas se a ala política vai se sobrepor à econômica

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, assume o cargo em cerimônia no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, assume o cargo em cerimônia no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB)  - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O discurso de posse do novo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, nesta segunda-feira (2), foi bem recebido pelos analistas, mas todos foram unânimes em cobrar ações concretas em relação à política fiscal. Ele voltou a dizer que vai apresentar uma nova âncora até junho.

Haddad afirmou que a nova âncora será confiável, “respeitada e cumprida”. Mas o primeiro sinal de compromisso com a responsabilidade fiscal do novo ministro, que foi o anúncio de que as isenções sobre combustíveis seriam revistas, acabou não se concretizando.

Haddad havia sinalizado que não manteria as isenções, aprovadas por Bolsonaro para baratear a gasolina e o diesel e turbinar sua popularidade, com impacto fiscal previsto no Orçamento de 2023 de R$ 52 bilhões. O governo, no entanto, decidiu prorrogá-las.

— Na primeira bola dividida, ele perdeu. E isso alimenta a narrativa de que ele não vai ter poder político, embora talvez ele queira uma política austera e sustentável. O presidente é que vai decidir e, entre manter o nível de gasto visto pela ala política como necessário e cortar o gasto em função de uma regra fiscal, eles sempre vão decidir por mais gastos — afirmou o ex-diretor do Banco Central Tony Volpon.
 

A economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, tem a mesma avaliação.

— Foi um sinal de que o Haddad pode até vir com ideias responsáveis, mas vai chegar no grande árbitro que é o Lula, e ele pode não aceitar. Caiu muito mal isso, foi de cara perdendo uma batalha — disse. — O ministro, por mais que esteja bem-intencionado, pode ter uma limitação quando chega no presidente. Acho que é esse o grande medo do mercado.

"Agora somos uma rede"
Na posse, Haddad criticou as medidas adotadas pelo ex-presidente em meio à corrida eleitoral no ano passado. E, principalmente, os decretos publicados no apagar das luzes do governo, cujo impacto, segundo o ministro, será de até R$ 15 bilhões.

— A expressão “arrumar a casa” tornou-se uma metáfora comum nos discursos dos que iniciam um novo governo. Mas, ouso dizer, estamos mais próximos da necessidade de reconstruir uma casa do que simplesmente arrumá-la. Os atos na política econômica do país em 2022 foram dos golpes mais duros que eles desferiram contra o povo brasileiro. Não apenas contrariaram o bom senso e a recomendação de técnicos da Economia: foram deliberadamente irresponsáveis — disse o ministro.

O governo Bolsonaro, afirmou Haddad, acabou com os filtros de seleção de beneficiários dos programas de transferência de renda, comprometendo a austeridade dessas políticas.

— Além disso, distribuíram benesses e desonerações fiscais para empresas, desobedecendo qualquer critério que não fosse ganhar a eleição a todo custo. E o custo é este, senhoras e senhores: 3% do PIB gastos em aumento irresponsável de dispêndios e em renúncia fiscal. Estamos falando, portanto, de um rombo de cerca de R$ 300 bilhões, provocado pela insanidade — disse o ministro, reafirmando que essas medidas serão revistas, como havia antecipado em entrevista à colunista do GLOBO Míriam Leitão.

Haddad afirmou ainda que, normalmente, a equipe econômica fica isolada e é o “patinho feio” da Esplanada dos Ministérios. Mas disse estar confortável ao lado dos ministros Geraldo Alckmin (Comércio Exterior), Simone Tebet (Planejamento) e Ester Dweck (Gestão).

E fez uma referência ao “posto Ipiranga”, como Bolsonaro apelidou Paulo Guedes, que no Ministério da Economia concentrou as atribuições de várias pastas:

— Éramos o posto Ipiranga, e agora somos uma rede de postos. Quatro que vão fazer a diferença no Brasil. É muito ruim concentrar todos os órgãos numa cesta.

Presente à posse, Simone Tebet disse que vai se reunir esta semana com Haddad para alinhar as pautas econômicas. Ela admite que haverá divergências, mas disse que nelas será possível crescer.

"Pé no chão"
No discurso de posse no domingo, o presidente Lula chamou o teto de gastos de “estúpido” e repetiu que vai acabar com regra. Agora, Haddad vai trabalhar na âncora fiscal que irá substituir o teto.

Para Volpon, o discurso de Haddad na posse buscou preencher o vazio deixado pelo governo enquanto não se apresenta uma âncora fiscal:

— Não saber qual será a âncora de médio prazo é a razão, inclusive, de um câmbio mais desvalorizado do que poderia ser neste momento.

A economista-chefe da Reag Investimentos, Simone Pasianotto, considerou o discurso de Haddad “pé no chão e alinhado ao que o mercado queria ouvir”, apesar da queda da Bolsa. Já o analista da Ouro Preto Investimentos Bruno Komura viu uma “reconciliação com o mercado”. Segundo ele, a reação de ontem pode ter sido exacerbada pela ausência de negociação no exterior.

— O investidor estrangeiro se lembra muito dos governos Lula 1 e 2, em que houve medidas pró-mercado. Agora, o investidor local institucional olha mais o cenário micro. Qualquer notícia sobre impacto fiscal provoca aversão ao risco.

A Bolsa brasileira fechou em queda de 3,06%, com os papéis da Petrobras desabando mais de 6%, e o dólar subiu 1,52%, a R$ 5,3581, em dia de mercados americanos fechados.

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