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ARGENTINA

Dólar blue, soja e vaca muerta: por que a Argentina não para de criar modalidades de câmbio

Não se sabe ao certo o número de taxas que muitas vezes ganham nomes curiosos

O ministro da Economia e candidato presidencial peronista, Sergio Massa, lança nova taxa de câmbio voltada ao setor de petróleo e gás O ministro da Economia e candidato presidencial peronista, Sergio Massa, lança nova taxa de câmbio voltada ao setor de petróleo e gás  - Foto: Luis Robayo / AFP

O ministro da Economia da Argentina, Sergio Massa, anunciou ontem uma nova modalidade de câmbio: o dólar vaca muerta. É mais um regime especial no país marcado pela maxidesvalorização de sua moeda e hiperinflação. A taxa será destinada ao setor de petróleo e gás.

Desde 2018, a Argentina mantém em curso uma política que restringe a compra de dólares para mantê-los no país, carente de moeda estrangeira. A medida permite que apenas alguns poucos setores da economia, geralmente ligados a bens de capital e insumos industriais, tenham acesso ao dólar oficial, a 365,50 pesos na cotação de ontem.

Pessoas físicas, que queiram destinar o dinheiro para poupança ou viagens, também podem comprar a esse valor, mas são limitadas a apenas US$ 200 por mês.

Em um país onde o índice de pobreza superou 40% no primeiro semestre e a inflação anual atingiu 124% em agosto, faltam produtos, sobram cotações de câmbio. A lista de regras para comprar ou vender dólares no país não para de crescer e os nomes escolhidos para as taxas são, no mínimo, inusitados.

O objetivo é desestimular a saída de dólares do país e incentivar as empresas locais a trazerem recursos estrangeiros para a Argentina. Ao contrário do Brasil, as reservas internacionais do vizinho são escassas.

Não se sabe ao certo quantas modalidades de câmbio já foram criadas desde 2018, já que algumas têm data certa para encerrar.

Entre os nomes curiosos surgiram o dólar Netflix, para pagamento de serviços de streaming, dólar Catar, para compra de passagens e pacotes turísticos para o exterior criado na época da Copa do Mundo de 2022, e dólar Coldplay, para pagamento de artistas internacionais que façam shows no país.
 

Tem também o dólar Malbec, criado em abril, para beneficiar o setor de vitivinicultura. Nos últimos anos, a produção de vinhos foi duramente afetada pelas mudanças climáticas, atingindo em cheio tanto a produção como a receita.

Mas é o dólar blue que circula amplamente no país. É a taxa mais usada, com cotação diária para transações em dinheiro vivo, nos fundos de lojas, bancas de jornal ou em escritórios discretos — ou algum conhecido disposto a vender seus dólares, às vezes exigindo grandes sacolas de compras ou mochilas para carregar os maços de notas de pesos.

Todas essas cotações só têm algo em comum: são sempre superiores ao câmbio oficial. Seja por cobrança de taxas ou impostos, quem precisar enviar recursos ao exterior acaba sendo onerado.

Confira a seguir alguns tipos de câmbio em vigor ou que já foram utilizados no país:

Dólar oficial
A taxa definida pelo governo é a referência. A taxa hoje é de 365,5 pesos por dólar.

Vaca muerta
Taxa de câmbio especial destinada ao setor de petróleo e gás anunciada ontem. No período de 60 dias, o setor poderá liquidar 25% das exportações de gás e petróleo por meio dessa nova taxa de conversão.

Segundo fontes, a taxa estará em vigor até 25 de outubro e poderá ser prorrogada até 25 de novembro, dependendo do sucesso do programa. Em contrapartida, as empresas petrolíferas terão de respeitar o acordo de preços para o mercado local até 30 de novembro.

Dólar Coldplay
Atendendo às reivindicações dos empresários do setor de entretenimento internacional no país, o governo criou uma taxa de câmbio diferenciada para serviços de recreação e atividades artísticas contratados no exterior. Essa atividade, que conta como importação de serviços, tem prazo de 180 dias até que o Banco Central repasse os dólares para os produtores que precisam fazer esse pagamento no exterior. A modalidade acabou pegando o nome da banda britânica Coldplay, que passou pela Argentina em sua recente turnê.

Dólar Blue
É a taxa de câmbio que resulta da compra e venda de moeda estrangeira no mercado paralelo, não oficial. A operação é considerada ilegal, mas comum em todo o país. Em Buenos Aires, cambistas operam livremente em bancas na Calle Florida ou em locais discretos na maior parte dos hotéis, conhecidos como "cavernas''.

A cotação do blue fechou a 773 pesos ontem.

Dólar Netflix
Os serviços de streaming são pagos em dólares por cartão de crédito, como Netflix, Spotify e outras plataformas. Eles são pagos pela taxa de câmbio de varejo mais um imposto PAIS de 8% e 21% de IVA, além de 45% que devem ser pagos na conta de lucros.

Isso implica sobretaxa total de 74% em relação ao dólar de varejo.

Dólar MEP ou Dólar Bolsa
É uma taxa de câmbio aplicada aos títulos soberanos no mercado de ações. Obtém-se comprando um título público com pesos e depois vendendo-o por seu preço em dólares.

Dólar "contado com liquidação" (CCL)
É uma operação semelhante à do dólar MEP, mas os dólares resultantes são depositados no exterior. A transação é normalmente realizada com títulos com liquidez em 48 horas.

Dólar ADR
É o dinheiro com liquidez, mas em vez de fazê-lo com títulos, é feito com ações de empresas argentinas listadas em Buenos Aires e Nova York. A operação é utilizada apenas por empresas que operam no exterior.

Dólar Luxo
Os argentinos mais ricos que compram produtos de luxo como jatos particulares, carros esportivos, iates, relógios e álcool de primeira linha precisam pagar impostos adicionais de quase 100% sobre o preço dos produtos importados.

Dólar Tecno
Para quem exporta serviços ou para a indústria do conhecimento, existe a possibilidade de empresas que fizerem investimentos superiores a US$ 3 milhões ficarem isentas do pagamento de 20% da moeda estrangeira no mercado oficial.

Além disso, as empresas que aumentarem suas exportações em 2022 terão a disponibilização gratuita de 30% de moeda estrangeira para utilizar na remuneração.

Dólar Malbec
O dólar Malbec, criado em abril para estimular o setor de vitivicultura.

O programa começou como uma tentativa de incitar os produtores a venderem seus estoques de soja para trazer dólares para o banco central.

Atualmente, aplica-se aos produtores de sorgo, cevada e girassol, bem como os famosos vinhos.

Dólar Soja ou de Exportação
O governo não prorrogará o atual esquema do dólar de soja, que expira no final do mês.

O programa foi criado para incentivar as vendas de grãos em um contexto em que as fábricas já têm pouca mercadoria para processar devido ao impacto da seca, que reduziu a produção em mais de 50%.

A modalidade já teve várias versões, sendo a última em vigor desde o dia 5.

O esquema gerou uma melhora no preço dos grãos em pesos e um certo dinamismo no mercado, que, no entanto, não se transformou em um boom.

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