DINHEIRO

Empresa cria "carteira" para que pessoas lucrem com seus próprios dados

CEO da DrumWave afirma que até bebês já têm informações na rede e vai apresentar conceito hoje no evento Rio2C

O CEO André Vellozo ressalta que "as corporações precisam cada vez mais" da pegada digital das pessoasO CEO André Vellozo ressalta que "as corporações precisam cada vez mais" da pegada digital das pessoas - Foto: Federica Armstrong/Divulgação

A partir de 15 de setembro, será possível monetizar seus dados pessoais em algo similar a uma caderneta de poupança. Este é o conceito que o CEO da start-up DrumWave, André Vellozo, anunciará nesta quarta (27) no Rio2C, evento de criatividade e inovação que acontece na Cidade das Artes até domingo.

Sua dWallet é uma carteira digital de dados que reunirá as informações pessoais — de certidões de nascimento e casamento a sua localização em tempo real, por exemplo — que o usuário decidir dividir, por determinado preço, com as mais diversas empresas.

— Queremos eliminar o intermediário. Por que você precisa ter suas informações fracionadas entre os gigantes da tecnologia (como Facebook e Google) se pode controlar e fazer dinheiro com os dados que são seus? O que propomos é nada menos do que uma revolução no setor, e já temos entre os parceiros um banco público e um privado no Brasil, além de várias empresas, de redes hospitalares a varejistas. É a lógica do Pix, agora no manejo de dados — diz Vellozo.

Ele oferece exemplos práticos: uma mulher que nasce com diabetes poderá organizar todos os seus dados médicos e farmacêuticos na conta da dWallet e oferecê-los, individualmente ou em conjunto com outras pessoas com diabetes, a empresas interessadas em pesquisa, por um valor combinado.
 

O que Vellozo propõe é uma espécie de cartório: sua empresa “certifica” os dados de cada indivíduo interessado. A dWallet é a prova de que os dados em questão são de fato daquela pessoa, que pode, assim, comercializá-los.

Após abrir a conta, o indivíduo solicita formalmente seus dados a todas as empresas com que se relaciona. Ao recebê-los, deposita-os na dWallet e pode monetizá-los.

Quem “hospeda” esses dados, como Google, TikTok ou Facebook, diz Vellozo, perde o direito de posse, que migra para um “agente custodiante”, no caso o próprio detentor dos dados.

A monetização, por sua vez, ocorrerá a partir de uma série de critérios, incluindo pontuações. Quanto mais interesse pelos dados por parte de empresas procuradas pela DrumWave, maior a pontuação.

E uma das parceiras nesse processo é a gigante americana IBM, que modela os dados certificados e roda em sua nuvem a plataforma da dWallet.

Segundo Vellozo, um bebê de cinco meses já tem seus dados espalhados, em média, por cerca de 68 arquivos diferentes. Pois seus pais podem reuni-los e estabelecer uma conta-poupança na dWallet a fim de monetizar esses dados, a fim de financiar parte de sua educação, argumenta.

E um aposentado saudável de 65 anos pode reunir todas as informações sobre sua saúde e atividade física regular, e negociá-las em sua carteira digital de dados.

O valor desses dados, aposta Vellozo, acabará sendo estabelecido pelo próprio mercado:

— Raça, gênero, religião, identificação sexual e política, tudo hoje é polarizado. Mas os dados não, eles são neutros. Não importa quem você é, se está no planeta já conta, pois tudo o que você faz, ou o que não faz, gera valor e informação a ser processada e utilizada.

As empresas têm necessidade desses dados, diz Vellozo:

— Sua pegada digital é um valor do qual as corporações precisam cada vez mais, especialmente no mundo pós-pandêmico. Para além do valor de mercado, trataremos cada vez mais de “valor de dados”, de empresas que encaram estes dados como possibilidade de negócio e de matéria-prima para reinvenção.

Criada em 2015, a DrumWave hoje presta serviços de manipulação de dados para empresas. Com o lançamento em setembro da dWallet, seu foco, diz Vellozo, passará a ser a negociação de dados com companhias detentoras de bases largas de usuários, nas mais diversas áreas. O CEO estima que o mercado de dados hoje gire em torno de U$ 1,8 trilhão.

Oferecer a possibilidade de monetizar diretamente os dados do indivíduo já é tema de discussão entre especialistas do setor. O coordenador da área de Direito e Tecnologia do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS), Christian Perrone, vê na legislação brasileira — notadamente a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) — brechas para um serviço como o da dWallet.

Perrone ressalta que, quando abrimos uma conta de e-mail no Google ou um perfil no Instagram, já trocamos dados por serviços. Mas ele aponta ainda que, além de reinterpretar a lei, será preciso ponderar os eventuais benefícios e complicações do serviço. Filosoficamente, diz, já surgem “questões delicadas”:

— Por exemplo, a sensação de que se está vendendo sua intimidade. Pode-se até fazer um paralelo, dependendo da leitura da lei, com a venda de um órgão. E há questões como a da proteção ao se negociar dados com um banco que também tem plano de saúde. Ao monetizar determinada informação com o banco, você também está encarecendo o seguro-saúde?

Ele enfatiza ainda que será preciso verificar o quão substantiva será a adesão de cidadãos a esse modelo e se ele não acabará aumentando o abismo digital da sociedade.

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