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Economia

Enquanto combustível sobe com alta do petróleo, governos arrecadam mais

Nos últimos três anos, a União acumulou ao menos R$ 123 bilhões com royalties e participações e lucros da Petrobras

CombustívelCombustível - Foto: Arthur Mota/Folha de Pernambuco

Enquanto motoristas e caminhoneiros gastam cada vez mais nos postos de combustíveis, o governo federal amplia sua arrecadação com a alta da cotação internacional do petróleo, potencializada pelo real desvalorizado frente ao dólar.

Nos últimos três anos, a União acumulou ao menos R$ 123 bilhões com royalties e participações especiais da produção de petróleo no país, bônus de assinatura pelo direito de exploração de áreas do pré-sal e a distribuição dos lucros crescentes da Petrobras, da qual é a sua maior acionista.

Estados e municípios que abrigam atividade petrolífera também ganham alto, mas somente com royalties. Entre 2019 e 2021, governadores tiveram reforço no caixa de R$ 59,5 bilhões e prefeitos, de R$ 37,5 bilhões.


Houve ainda R$ 6,8 bilhões arrecadados por fundos especiais e mais R$ 11,7 bilhões com a divisão do bônus de assinatura do leilão de áreas do pré-sal de 2019.

Considerando apenas as participações governamentais na produção de petróleo, a arrecadação nos últimos três anos é cerca de 70% maior que nos três anos anteriores nas três esferas de governo.

E a tendência é que os ganhos sigam aumentando neste ano, com a nova disparada da commodity no mercado internacional em meio às tensões na Ucrânia.

Na semana passada, o barril do tipo Brent chegou a ser negociado acima dos US$ 95. Relatórios de bancos e analistas preveem que, em pouco tempo, ultrapassará os US$ 100, no maior patamar desde 2014. E quanto mais caro o petróleo e o dólar, maiores são a arrecadação de royalties — cujas alíquotas variam de 5% a 15% do preço de venda do barril — e os lucros da Petrobras.

Analistas esperam que o balanço de 2021 da estatal, que será divulgado na quarta-feira, contabilize lucro na casa dos R$ 100 bilhões, o melhor resultado da história da empresa. Foram R$ 75 bilhões nos nove primeiros meses do ano.

Também ajuda a arrecadação do setor público o aumento da produção de petróleo nos campos em águas ultraprofundas do pré-sal, que têm alta produtividade. Ou seja, o custo de extração por barril é mais baixo que a média do setor, o que amplia a margem de lucro. A Petrobras bateu recorde de produção no pré-sal em 2021, com média de 1,95 milhões de barris de óleo equivalentes por dia. Esse volume correspondeu a 70% de toda a produção anual da Petrobras, de 2,77 milhões de barris diários.

A Petrobras tem aproveitado a maré para reduzir endividamento e elevar a distribuição dos ganhos entre acionistas, sendo o governo federal o maior beneficiado.

Nos últimos três anos, o governo federal recebeu cerca de R$ 30 bilhões somente em dividendos da Petrobras. Entre 2022 e 2026, a estatal pretende pagar entre US$ 60 bilhões (cerca de R$ 307,2 bilhões) a US$ 70 bilhões (R$ 358,4 bilhões) em dividendos. A União receberá 28,67% (sua fatia no capital da empresa) do total, o que pode chegar a US$ 20 bilhões.

Deve entrar para o caixa do governo, neste início de ano, os bônus pagos pelas petroleiras que arremataram as áreas de Atapu e Sépia, no pré-sal da Bacia de Santos, no leilão realizado em 2019. O cheque é estimado em R$ 3,4 bilhões. Outros R$ 6 bilhões deverão ir para estados e mais R$ 1,7 bilhão para municípios.

Os ganhos extraordinários do setor público — que também arrecada mais com os impostos que incidem sobre os combustíveis — com a alta do petróleo alimentam propostas em discussão no Congresso para usar parte deste dinheiro para amenizar o impacto do repasse dos preços internacionais para os derivados, que turbinam a inflação e pesam no bolso dos motoristas e de quem compra botijão.

Em janeiro, o preço máximo do litro da gasolina ultrapassou os R$ 8 pela primeira vez na história da pesquisa em postos feita pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). Desde janeiro do ano passado, os preços subiram cerca de 50%. Analistas esperam novos reajustes porque, segundo cálculo da Abicom (que reúne importadores de combustíveis), a defasagem dos preços das refinarias da Petrobras em relação aos do exterior chegou a 13% na semana passada.

O governo federal propôs zerar tributos federais que incidem sobre combustíveis (Cide, PIS e Cofins) com a contrapartida dos estados em relação ao ICMS. Sem um acordo, o Congresso discute alternativas, que incluem o uso de royalties do petróleo, dividendos da Petrobras e até uma taxação da exportação de petróleo para bancar programas de subsídios ao consumidor, mas a ideia divide opiniões.

Cálculos de Adriano Pires, sócio do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), estimam que subsidiar o diesel de empresas de transporte público urbano e caminhoneiros e o gás de famílias de baixa renda pode custar entre R$ 15 bilhões e R$ 20 bilhões por dois anos, menos que a Petrobras pagou em dividendos em três.

— Pensar em um novo uso desses recursos pode prejudicar as contas públicas, mas vai fazer o quê? O petróleo caro significa inflação mais alta. Diversos países da Europa e os EUA estão fazendo ações de redução de imposto e políticas sociais para evitar que o problema prejudique a economia — argumenta. — Estamos com preços momentaneamente altos. É preciso sensibilidade social neste momento.

Magda Chambriard, ex-diretora-geral da ANP, defende um fundo de estabilização só com o incremento de royalties de um ano para o outro.

— Petrobras, governo federal, estados e municípios estão ganhando com o aumento do petróleo, menos a sociedade. Então, que seja usada essa maior arrecadação para momentos como o atual em um fundo. É preciso entender que não haverá recursos suficientes para bancar a escalada dos preços. O que se pode fazer é evitar sobressaltos momentâneos — diz a consultora, ressaltando que o governo federal tem mais condições de abrir mão de receitas do que estados e municípios. — Os royalties têm diversos destinos e todos são úteis. Mas é preciso, na situação atual, pensar em algo.

Edmar Almeida, professor de Instituto de Energia da PUC-Rio, também cita debates sobre preços de combustíveis em outros países. Entre as opções na mesa, ele avalia que o subsídio direto ao consumidor pode ser mais eficaz porque redução de impostos não garante que o impacto chegue ao consumidor. Para o especialista, usar royalties com essa finalidade seria um erro, já que são recursos pagos a título de compensação que devem ser destinados a investimentos capazes de promover desenvolvimento para o pós-petróleo:

— Noruega, Emirados Árabes e o Texas (EUA) têm fundos de longo prazo. Também temos o fundo social, mas hoje há pouca transparência sobre o uso desses recursos.

Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da gestora RPS, diz que a solução ideal é uma reforma tributária ampla, que dê condições para ajustes nos impostos sobre combustíveis em situações como a atual, mas reconhece que a chance de algo assim avançar no Congresso é muito baixa. Ainda assim, avalia que usar recursos extraordinários do petróleo para subsidiar combustível pode terminar sem o efeito esperado. O impacto fiscal pode estimular uma alta do dólar.

— Países como Chile, Argentina, Venezuela, Irã e México, que adotaram mecanismos como fundos de estabilização, fracassaram. O custo é alto e geralmente não é suficiente para estabilizar os preços, sem falar no fato de subsidiar combustível fóssil em plena transição energética — diz. — Se o governo e o Congresso fizerem algo muito exótico, o câmbio pode neutralizar o subsídio. É preciso muito cuidado para não dar com uma mão e tirar com a outra. (Colaborou Alexandre Rodrigues)

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