Entenda o que está em jogo com a mudança na Lei das Estatais
Senado adia votação para discutir mais a proposta
Diante da repercussão negativa na economia e no mundo político, a flexibilização da Leis das Estatais — aprovada a toque de caixa pelos deputados na noite de terça-feira — foi adiada no Senado.
A pressão levou o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a indicar que a proposta, que abre caminho para que políticos disputem mais de 700 cargos em empresas públicas federais, terá uma tramitação mais lenta, passando ao menos pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, jogando a apreciação do tema para 2023.
— Não há possibilidade de votar sem discussão com líderes. Temos que amadurecer e discutir o texto. Como foi publicada a pauta da sessão de hoje (ontem), não haverá discussão extra-pauta — disse Pacheco, encerrando a pressão para votar o texto ontem.
O projeto aprovado na Câmara reduz de 36 meses (três anos) para 30 dias a quarentena de indicados ao Conselho de Administração e para a diretoria de estatais que tenham ocupado cargos partidários ou participado da estruturação e realização de campanhas.
A aprovação-relâmpago do projeto na Câmara na terça-feira acendeu o sinal de alerta no mercado financeiro e fez com que as ações de Petrobras e Banco do Brasil encerrassem o pregão de quarta-feira em baixa.
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Os papéis da petroleira recuaram quase 10%, o que fez o valor de mercado da companhia encolher em R$ 30 bilhões em um único dia. O que estava no radar dos investidores era o risco de ingerência política e loteamento de cargos, o que poderia afetar o resultado das companhias.
Sem candidato a relator
A Lei das Estatais, criada em 2016, foi uma resposta aos desvios apurados na Operação Lava-Jato, em busca de uma governança melhor nas empresas públicas.
A avaliação entre os senadores, contudo, é que a proposta tem grandes possibilidades de passar, mesmo com esse adiamento. Mas a repercussão negativa pela forma como a medida passou entre os deputados, contudo, afetou sua tramitação na Casa.
Pela manhã, não havia sequer senador disposto a assumir o papel de relator da medida, para não ficar marcado junto a empresários e investidores como responsável por uma piora do quadro institucional brasileiro — o que pode inclusive afastar recursos do país.
Para evitar o mal-estar, entretanto, será preciso passar por um rito maior. A proposta sempre foi objeto de desejo do Centrão, que queria voltar a ter a possibilidade de indicar políticos para estatais. Uma proposta semelhante chegou a ser apresentada em junho — patrocinada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) — mas ela não avançou. Agora, diante da possibilidade de evitar riscos na nomeação de Aloizio Mercadante ao cargo de presidente do BNDES, o PT e os partidos de esquerda votaram a favor da medida.
A assessoria do futuro presidente da estatal e seu partido, contudo, contestam a necessidade de mudar a lei para que ele possa assumir o BNDES. O argumento é que Mercadante está há mais de 36 meses sem cargo eletivo e, nos últimos meses, esteve na Fundação Perseu Abramo — braço de estudos do PT — de onde coordenou debates do programa de governo da candidatura de Lula, porém sem pertencer ao quadro formal do partido.
A votação na Câmara gerou mal-estar à bancada petista do Senado. A mudança passou a ser corriqueiramente chamada de “emenda Mercadante”, mas eles argumentam que o maior beneficiado será o Centrão.
A flexibilização da Lei das Estatais poderia abrir a negociação de 753 cargos de diretores, presidentes e conselheiros de estatais, segundo dados do último Relatório Agregado das Empresas Estatais Federais (Raeef), elaborado anualmente pela Secretaria Especial de Desestatização, do Ministério da Economia. A mudança, dizem os senadores, também poderia impactar as empresas públicas estaduais. Isto explicaria a votação massiva de deputados de alguns estados na Câmara em favor da alteração.
Entidades empresarias de diversos setores emitiram nota de repúdio à aprovação de mudanças na Lei das Estatais destacando que ela prejudica o ambiente de negócios. Assinam o texto a Associação dos Investidores no Mercado de Capitais (Amec), a Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil, (Apimec Brasil), o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial (IBDEE), o Instituto Não Aceito Corrupção (INAC) e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade.