Envelhecimento mais rápido da população aumenta preocupação com Previdência, dizem analistas
Segundo eles, requalificação pode manter a faixa etária de 60 anos mais tempo no mercado de trabalho
As novas projeções populacionais divulgadas ontem pelo IBGE com base no Censo 2022 mostram que a população brasileira está envelhecendo mais rapidamente do que se esperava e vai começar a diminuir em 2042, daqui a 18 anos, e chegará a 2070, último ano da projeção, com menos habitantes do que temos hoje: 199,2 milhões, contra os 203 milhões atuais.
A faixa etária de 60 anos para cima será a maior a partir de 2042, chegando a 2070 representando quase 40% da população.
Essa nova composição populacional terá implicações econômicas e nas políticas públicas de Previdência Social, saúde e educação, dizem especialistas. Ana Amélia Camarano, economista especializada em demografia, diz que a preocupação maior é como será a autonomia financeira e da vida diária dessa população mais velha.
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Uma das medidas a serem adotadas, na opinião da economista, é a requalificação, que pode ajudar a manter essa faixa etária mais tempo no mercado de trabalho:
— Tem que investir na requalificação, principalmente em inclusão digital, retreinar esse pessoal para o mercado de trabalho. Precisa haver uma mudança no contrato social, que é baseado nas transferências geracionais. Os jovens custeiam a Previdência dos mais velhos, e os filhos cuidam dos pais. Esse mecanismo está abalado com uma geração mais nova cada vez menor.
A manutenção dessas pessoas no mercado pode ajudar a elevar a arrecadação da Previdência, diz ela. O economista Samuel Pessôa, da Fundação Getulio Vargas (FGV), vê necessidade de uma reforma por década para equacionar:
— Já gastamos 14% do PIB (Produto Interno Bruto) com a Previdência, não é possível aumentar mais esse gasto.
Fim do bônus demográfico
Ana Amélia diz que um caminho seria mudar o sistema, como fez o Reino Unido, que estabeleceu um pilar solidário, com uma renda mínima para todos, um pilar contributivo e outro de previdência privada.
Christine Graser Pimentel, de 73 anos, mora em Copacabana, na Zona Sul do Rio, e continua no mercado de trabalho. Professora aposentada, há oito anos atua como síndica de seu prédio:
— Ainda trabalho bastante. A aposentadoria não é uma opção para mim no momento. Não posso me dar ao luxo de ficar parada. Eu só recebo uma pequena aposentadoria da Alemanha, onde trabalhei por dez anos. Aqui, como autônoma, não pagava a Previdência, então a situação é difícil. Às vezes, as coisas ficam apertadas.
Além da Previdência, os gastos com saúde vão subir, alerta a médica sanitarista da UFRJ Ligia Bahia. O envelhecimento vem acompanhado de doenças crônico-degenerativas e cânceres, que exigem tratamento e medicamentos caros:
— O mundo inteiro já está se preparando para isso, e o Brasil precisa se preparar também.
Aos 85 anos, Edson Nascimento dos Santos vive em Madureira, Zona Norte do Rio. Aposentado da Comlurb, vive com um salário mínimo, e a renda mal dá para cobrir despesas básicas:
— O dinheiro é tão pouco que, mesmo que quisesse, não conseguiria comer algo diferente ou mais gostoso com frequência — diz. — Envelhecer no Brasil não é fácil, mas a gente vai levando. Gosto de encontrar os amigos, jogar cartas e, por que não, namorar um pouco. Ainda me sinto jovem de espírito, o mais importante.
E há menos jovens para financiar essa aposentadoria. A transição demográfica praticamente pôs fim ao bônus demográfico, quando há mais pessoas em idade de trabalhar do que crianças e idosos. Essa faixa em idade ativa vem crescendo menos que a população total desde 2020 e deve começar a diminuir no máximo em 2035, estima o demógrafo José Eustáquio Diniz, professor aposentado da Escola Nacional de Ciências Econômicas (Ence):
— O que manteve o crescimento do Brasil nos últimos 40 anos foi o bônus demográfico. A produtividade está estagnada. Com o fim do bônus, precisamos de sistemas educacional e de saúde muito bons e investimento em ciência e tecnologia.
Pisos constitucionais
O Orçamento público terá que se adequar, segundo Samuel Pessôa. Hoje, há pisos constitucionais para saúde e educação. Ele sugere um piso único, no qual se pudesse deslocar mais recursos para saúde, se necessário.
Já Caio Ferrari, professor de economia do Ibmec-RJ, defende que se mantenha o gasto em educação, mesmo com a população infantil e jovem diminuindo, para investir mais nessa futura mão de obra, aumentando a produtividade.
— Se conseguirmos melhorar o capital humano, de educação, de treinamento, isso pode ajudar a produtividade do trabalho no Brasil.