Copom

Equipe econômica avalia que recado mais duro do BC apoia continuidade da agenda de corte de gastos

Haddad e Tebet defendem revisão de despesas, mas enfrentam resistência da ala política

Equipes dos ministros Fernando Haddad e Simone Tebet têm defendido uma agenda de revisão e contenção estrutural dos gastos públicosEquipes dos ministros Fernando Haddad e Simone Tebet têm defendido uma agenda de revisão e contenção estrutural dos gastos públicos - Foto: Diogo Zacarias/MF

O recado mais duro do Banco Central sobre a política fiscal, na ata do Comitê de Política Monetária (Copom), foi recebido pela equipe econômica como um endosso aos planos dos ministérios da Fazenda e do Planejamento.

As equipes dos ministros Fernando Haddad e Simone Tebet têm defendido uma agenda de revisão e contenção estrutural dos gastos públicos, mas enfrentam ventos contrários da ala política do governo.

No documento divulgado nesta terça-feira em que explica a decisão de subir os juros para 10,75% ao ano, o BC avançou no alerta à política fiscal em relação a comunicações anteriores. O Copom classificou a política fiscal como expansionista e frisou que é importante para a condução dos juros uma política fiscal crível, previsível e transparente.

Apesar do tom mais pesado, o BC deixou claro que atualmente considera em seus cenários para a inflação uma desaceleração no ritmo de crescimento dos gastos públicos ao longo do tempo, em linha com a trajetória traçada pela equipe econômica.

“Uma política fiscal crível, embasada em regras previsíveis e transparência em seus resultados, em conjunto com a persecução de estratégias fiscais que sinalizem e reforcem o compromisso com o arcabouço fiscal nos próximos anos são importantes elementos para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de riscos dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária.”

Dentro do próprio BC, há sinais de que a intenção pode ter sido de “fazer coro” à agenda da equipe econômica sobre a necessidade de medidas que reforcem o compromisso com o arcabouço fiscal, e não uma cobrança.

Em evento na manhã desta terça, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, avaliou que o mercado se mostra mais apreensivo sobre a trajetória da dívida e, mais recentemente, sobre a transparência dos números de contas públicas. Mas considerou que o movimento de reação na curva de juros futuros pareceu “exagerado”, ainda mais considerando a dificuldade que outros países estão enfrentando na contenção fiscal.

— A nossa percepção é que parece exagerado dado o que aconteceu. Não é nossa função julgar os preços de mercado e sim entender o que os preços de mercado têm de informações no que a gente pode usar na nossa função-reação.

A manifestação do BC ocorre em um momento de crescimento do mau humor do mercado financeiro com a condução das contas públicas. A avaliação é de baixa disposição do governo em cortar gastos, o que põe em risco a sustentabilidade do arcabouço fiscal e da dívida pública. Além disso, recentemente, algumas medidas adotadas acenderam um alerta para brechas nas regras fiscais.

Houve críticas do mercado, por exemplo, à liberação de R$ 1,7 bilhão do Orçamento, mesmo em um contexto de crescimento das despesas.

Com o aumento na previsão de receitas, o governo descontingenciou R$ 3,8 bilhões, embora tenha elevado o bloqueio, pelo crescimento de despesas obrigatórias, em R$ 2,1 bilhões. No total, o congelamento do orçamento caiu de R$ 15 bilhões para R$ 13,3 bilhões.

Considerando os R$ 40,5 bilhões em créditos extraordinários que estão fora da contabilidade para a meta, a projeção para o resultado primário é de R$ 68,8 bilhões.

Descontando esses gastos, relacionados principalmente ao combate aos efeitos das enchentes no Rio Grande do Sul, a projeção é de R$ 28,3 bilhões, ainda assim muito próxima ao limite inferior da meta, de R$ 28,8 bilhões.

Integrantes da equipe econômica argumentam, porém, que não têm poder para manter o contingenciamento se as previsões indicarem um resultado primário dentro da meta, devido à impositividade do orçamento.

Em relação aos créditos extraordinários, afirmam que só podem ser cancelados no fim do ano, o que deve acontecer, por exemplo, com o montante de R$ 7,5 bilhões destinados à compra de arroz, cujo leilão foi anulado.

Outro fator que causa incômodo no mercado é a proposta de reformulação do auxílio-gás, que permite o financiamento do programa por fora do Orçamento.

A isso se somam as preocupações em relação à velocidade de crescimento das despesas obrigatórias.

Entre auxiliares de Haddad, há um reconhecimento da necessidade de se fazer cortes estruturais de despesas para manter o arcabouço fiscal de pé, especialmente a partir de 2027.

Naquele ano, a previsão é de redução das despesas com investimentos e de manutenção da máquina pública a níveis insustentáveis, por conta do crescimento dos gastos obrigatórios.

Por isso, a Fazenda e o Planejamento tentam montar um discurso em defesa do corte de despesas consideradas ineficientes para que elas deem lugar a outros gastos. É uma forma de manter o arcabouço de pé e afastar o risco fiscal do horizonte.

Como mostrou O Globo, o governo estuda implementar políticas mais eficientes para o BPC, o seguro-desemprego e o abono salarial.

Na avaliação de assessores, é preciso convencer a ala política do governo e o Congresso da necessidade de avançar nessa agenda. E que o custo do adiamento de medidas ou mudanças é maior.

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