Ex-rei das criptomoedas é sentenciado a 25 anos de prisão por cometer "fraude da década"
Sam Bankman-Fried, cofundador da FTX, foi condenado por fraude e conspiração nos EUA sob acusação de usar dinheiro de investidores para obter empréstimos
O cofundador da FTX Sam Bankman-Fried, "rei das criptomoedas" que caiu em desgraça ao ser acusado de cometer a "fraude da década", foi sentenciado a 25 anos de prisão nesta quinta-feira (27). SBF, como é conhecido, foi condenado em novembro de 2023 por usar dinheiro — mais de US$ 8 bilhões — de usuários de sua plataforma para financiar diversos projetos pessoais. Responsável pela sentença, o juiz Lewis Kaplan disse que o ex-bilionário agiu "com ambição" e "sem remorso", movido por um desejo de ser politicamente influente.
Em novembro de 2022, o magnata americano, que à época tinha 30 anos, não conseguiu obter financiamento para os seus dois principais negócios, a plataforma de câmbio de criptomoedas FTX e o fundo de investimento Alameda Research. Era tarde demais para alguém concordar em investir com ele. Sua fortuna, que naquela segunda-feira foi estimada em cerca de US$ 16 bilhões, derreteu completamente na sexta-feira seguinte, e suas empresas declararam falência.
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Da tribuna, o réu afirmou existirem "recursos suficientes" para compensar os clientes prejudicados pelo colapso da FTX e reconheceu ter errado.
"Eu tomei uma série de decisões ruins. Houve vários erros que eu cometi" disse SBF ao juiz, antes de se dirigir a ex-colegas de empresas que testemunharam contra ele durante o processo. — Sei que várias pessoas se sentem desapontadas. Elas construíram algo muito bonito, se dedicaram a isso e depois eu joguei tudo fora. Isso me amedronta todos os dias.
Durante a sessão, a defesa do ex-bilionário argumentou que SBF não era um "serial killer financeiro", mas sim, um "nerd" que atuava sem malícia e que "trabalhou duro" para reaver o dinheiro perdido pelos investidores. O juiz Lewis Kaplan rebateu a alegação.
"A afirmação do réu de que os clientes e credores da FTX serão pagos integralmente é enganosa, é logicamente falha, especulativa" disse o magistrado, no tribunal de Nova York.
Por um lado, SBF enfrentava um juiz que já não o via com bons olhos após suas tentativas de manipular testemunhas ao longo do processo. Por outro lado, mantinha a esperança de que a devolução dos mais de US$ 8 bilhões perdidos às vítimas pudesse reduzir a sua pena.
A pena máxima para as sete acusações de fraude e conspiração pelas quais foi condenado ultrapassava um século. Mas a sua aplicação não costuma ser a norma para este tipo de crime. Além disso, a maioria dos criminosos "de colarinho branco" cujas penas equivalem ao resto da vida acabam por cumprir apenas parte delas.
O Ministério Público pediu entre 40 e 50 anos para Bankman-Fried. A acusação aponta que a atividade de SBF foi caracterizada por “ganância e arrogância sem paralelo, assumindo riscos e jogando repetidamente com o dinheiro de outras pessoas”. Para eles, Bankman-Fried não demonstra remorso, e a gravidade dos seus crimes não deve ser ignorada.
O ex-guru da criptomoeda não se manteve discreto no processo. Ele foi inicialmente colocado em prisão domiciliar durante o julgamento, mas esse privilégio foi revogado quando foi descoberto que SBF havia violado repetidamente os termos de sua liberdade condicional. As suspeitas de transferências de fundos para ocultar bens, atividades encobertas na Internet e comunicações impróprias valeram-lhe vários alertas. A gota d'água foi o vazamento do diário pessoal da sua ex-namorada e ex-CEO da Alameda Research, Caroline Ellison, uma testemunha-chave no caso.
O Departamento de Justiça dos EUA afirmou que Bankman-Fried vazou o diário para desacreditar e intimidar Ellison, que em seus escritos confessou se sentir incapaz de administrar o fundo Alameda. Ela afirmou que o ex-companheiro ordenou diretamente a utilização de fundos de usuários para pagar empréstimos. Além disso, SBF prestou declarações falsas durante seu depoimento e utilizou a estratégia de responder “não me lembro” em mais de 140 ocasiões para evitar se incriminar, quando foi questionado pelo Ministério Público.
A última tentativa
Para as fases finais, ele contratou o famoso advogado Marc Mukasey para liderar sua defesa. Mukasey já tinha defendido Donald Trump num caso relacionado com a legalidade da sua candidatura, mas o seu grande sucesso veio quando conseguiu reduzir a pena – de 11 anos de prisão para apenas quatro – de Trevor Milton, o antigo CEO da Nikola. Acusado de enganar investidores sobre o andamento do primeiro protótipo de caminhões elétricos de sua empresa, Milton chegou a produzir um vídeo em que inclinava a câmera para simular o funcionamento de seu veículo. Na realidade, ele estava apenas em declive.
Por meio de um relatório com diversas seções intituladas "Sam não é motivado pela ganância", "Sam se preocupa com as pessoas" e "Filosofia e filantropia de Sam", a defesa buscava suavizar a imagem de seu cliente e atribuir muitos dos fatos criminosos que lhe foram atribuídos à má gestão, em vez de um plano deliberado para desviar fundos.
Alguns dos seus investimentos através da FTX tiveram um bom desempenho e, com os esforços da equipe que geriu a falência, conseguiram compensar as perdas sofridas pelos usuários da plataforma. O reembolso dos titulares de contas na FTX, agora encerrada, ajudaria a reparar os danos causados às vítimas e poderia ser crucial para reduzir a pena de Bankman-Fried.
Contudo, esta situação não invalidaria o principal argumento do Ministério Público: embora os efeitos possam ser mitigados, Bankman-Fried ainda é o principal responsável pela fraude que levou a FTX à falência. Embora a SBF tenha argumentado que simplesmente não conseguiu administrar o negócio e não ordenou nenhuma ação ilegal em suas empresas, seu depoimento foi desmentido por todos os demais envolvidos no processo.