"Fase crítica foi superada, mas isso não garante o sucesso da companhia", diz CEO da Americanas
Leonardo Coelho detalha ajuste da rede física da varejista e novo modelo de loja, com redução de custos operacionais
A pior fase está superada, avalia Leonardo Coelho, CEO da Americanas, ao se referir a crise aberta na companhia após a revelação inconsistências contáveis em balanços da companhia, em janeiro de 2023, ter levado a varejista à recuperação judicial com uma dívida de R$ 40 bilhões.
— Hoje, o que dá para dizer é que a gente considera superada a fase mais crítica pela qual a Americanas passou — diz, alertando para o que vem à frente: — Tem muito trabalho adiante até que a gente volte consistentemente a gerar resultados operacionais. Não dá apra dizer que essa fase crítica superada garante o sucesso da companhia.
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Haverá ajuste na rede física, com mudança no modelo de loja; lançamento de programa fidelidade com a AME Digital e foco no marketplace no canal de e-commerce, como forma de ampliar resultados.
Foco volta para a operação
A Americanas divulgou na manhã desta segunda-feira os resultados dos três primeiros trimestres de 2023 e o acumulado do ano passado até setembro, quando registrou um prejuízo de R$ 4,6 bilhões — 23,5% menor que o de igual período do ano anterior — e fechou 99 lojas.
Os balanços foram divulgados sem a chancela de validação da BDO RCS, auditoria contratada pela Americanas para auditar esses resultados.
— Em 2023, tivemos, na alta administração da Americanas, que dividir a atenção da operação com outros trabalhos, principalmente de investigação e recuperação judicial. A partir do segundo semestre de 2024, começamos a ter finalmente 100% do nosso foco voltado para a operação.
O foco para este ano e o próximo, reforça o executivo, é trabalhar pela geração de caixa operacional em todos os negócios da companhia. Em teleconferência e em conversa com O Globo, ele conta como isso será feito.
Negativa de opinião da auditoria
A BDO explicou em parecer incluído na apresentação de resultados pela Americanas que não foi possível “obter evidência apropriada e suficiente para fundamentar” para chancelar os balanços divulgação.
A auditoria ponderou como entraves o fato de a homologação do plano de recuperação da companhia não ter ocorrido — o que acabou se efetivando em meio à apresentação de resultados ao mercado, na manhã desta segunda-feira —, de não ter acesso a informações não divulgadas por serem alvo de investigações ou constarem de processos que correm sob sigilo, além da auditoria de resultados da AME Digital, braço financeiro da Americanas, não ter sido concluída.
— A BDO está certa em apontar esses pontos. É parte do trabalho da auditoria não emitir opinião nesse cenário. Com a homologação do plano de recuperação (judicial), que ocorreu durante a call (teleconferência), esse ponto está resolvido — avalia Coelho.
Ajuste na rede de lojas
Nos nove primeiros meses de 2023, a Americanas fechou 99 lojas. Eram, segundo explicou o CEO da companhia, todas elas apresentavam performance abaixo do desejado, estando espalhadas pelo país.
— Haverá ajustes na rede de loja, vamos fechar mais lojas e também haverá aberturas. A rede de Americanas Local, com lojas muito pequenas, foi o modelo em que tivemos a maior dificuldade de encontrar o break even (equilíbrio financeiro). Acaba sendo muito focada em alimento e bebidas, segmento de grande concorrência no mercado — destaca ele.
A Americanas Local era operada em parceria com a Vibra (antiga BR), que encerrou a parceria com a varejista nesse projeto de lojas de conveniência em meio ao processo de recuperação judicial.
Coelho afirma que a Americanas Express, um modelo mais enxuto de loja, porém mais espaçosas que as da rede Local, “funciona bem”. Um ponto que requer atenção são as lojas com mais de 1.500 metros quadrados, porque algumas não entregam bons resultados.
— A Americanas tem 1.680 lojas hoje. Não imagino com menos de 1.500, mesmo entre fechamentos e aberturas — afirma o executivo, frisando que cada operação será avaliada para se ter certeza de que não pode ser recuperada antes de se decidir pelo encerramento da atividade.
Novo modelo de lojas
A Americanas vai ajustar seu modelo de lojas sem tirar o foco do perfil de cliente da varejista na rede física: pessoas das classes C e D, de ambos os sexos e maiores de 18 anos de idade. Com base nisso, não faz sentido criar um ambiente sofisticado, diz Coelho, mas “não pode ser maltratado ou desorganizado”. O que vai mudar é a organização das lojas:
— Categorias que falam entre si ficarão mais próximas (umas das outras) dentro das lojas. E, na frente, estarão as categorias em promoção de forma organizada. Não muda a apresentação da loja, mas a formatação para ser mais flexível (a essa apresentação de promoções e produtos).
Vai haver demissões?
Para que a companhia retome a lucratividade, a Americanas vem trabalhando para reduzir despesas na retaguarda da operação, no chamado backoffice, diz Leonardo Coelho.
— Mais para o fim de 2023, já vínhamos no caminho de reduzir pessoal de loja com base no próprio turnover que costumamos ter, com as saídas ocorrendo, mas sem recontratações. Mas, no pós-Natal, faltou gente porque não havíamos construído um novo modelo consistente de operação com menos pessoas — pondera. — Com isso, estamos investindo em gente.
No backoffice, a reestruturação vem sendo feita com foco em garantir operação simples. Não há uma meta de corte dessas despesas ou de gasto com pessoal, especificamente, frisa o executivo. Mas as reduções de custos virão.
— Já temos um estudo de Orçamento Base Zero para avaliarmos o que cada área faz, com quantas pessoas e o que deixaria de entregar com menos recursos. Essa redução tem que ter — reconhece o CEO da Americanas.
Aceleração do e-commerce
De janeiro a setembro de 2023, o volume de vendas de mercadorias alcançou R$ 16 bilhões, encolhendo em 51,1% na comparação com igual período do ano anterior. No digital o tombo em vendas chegou a 77%. Essa perda foi atenuada pelo desempenho da rede de lojas físicas, que tiveram o mix focado em conveniência, com menos categorias, porém mais rentáveis.
Essa modelagem foi sendo ampliada, permitindo a retomada de vendas de novas categorias como a de lâmpadas que, em quatro meses, garantiram 12% de participação de mercado à companhia, segundo Coelho.
Com o déficit operacional no e-commerce — pela falta de confiança tanto dos sellers quanto da clientela para comprar on-line — a Americanas soltou as mãos das vendas que faz diretamente pelo canal digital, passando a refletir apenas o mix já oferecido em loja. E apostou na rede de vendedores do marketplace para atuar como “prateleira infinita”, agregando outras categorias e produtos.
— O marketplace sempre foi foco. E talvez seja a peça mais importante para a evolução do resultado. Cortamos recursos usados em promoção de divulgação para vender rodutos com margem negativa. E focamos na rede de vendedores (on-line) — diz.
Como a redução da perda de valor no marketplace já está acima do esperado, a expectativa é que esse canal de vendas volte ao equilíbrio no primeiro semestre de 2025, seis meses antes do previsto pelo plano de recuperação da companhia.
Como ficam Uni.co e Hortifruti
As unidades Uni.co — dona das marcas Imaginarium, Puket, MinD e LoveBrands — e Hortifruti Natural da Terra seguem com seus processos de venda em suspenso não significa que a Americanas não esteja olhando para oportunidades.
Também a Hortifrute será alvo de ajustes na operação, refletindo aprendizados obtidos com a reestruturação da Americanas, explica Coelho:
— Isso não pega a Uni.co. Mas chega ao Hortifruti, com ações aprendidas com Americanas em 2023, podendo levar a integração de operações, centros de distribuição e revisão da malha logística, por exemplo. Não há pressa para vender. Mas podemos melhorar a operação.
Programa de fidelidade com a AME
No braço financeiro da Americanas, o desafio é grande diante da crise enfrentada pela varejista, reconhece o CEO da companhia. E será trabalhado em duas frentes: a de crédito e a como programa de fidelidade.
— O principal insumo da AME é dinheiro, e ele está caro para a gente. Precisamos rever o foco da operação. Hoje, ela opera como um hub de crédito, em que colocamos um ambiente à disposição de nossos parceiros para tomarem crédito, o que não é feito com dinheiro nosso, mas de terceiros.
Outra meta é reconstruir o programa de fidelidade da empresa, uma ferramenta importante para entender o consumidor da Americanas: quem é, como, onde e o que ele compra.
— Devemos relançar esse programa ainda no primeiro semestre deste ano — avalia Coelho, destacando que a operação de cashback continua.