Fazenda limita pacote de Alckmin para carro popular
Programa deve durar 'de três a quatro meses' e custar menos de R$ 2 bilhões, indica Haddad
Lançado de improviso na quinta-feira, o programa para reduzir o preço dos carros populares ainda é alvo de discussões dentro do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que não bateu o martelo sobre como irá pagar a conta.
A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) exige compensação com aumento de receita em outra área em medidas desse tipo, mas isso não foi cumprido na medida provisória (MP) desenhada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), comandado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin.
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Essa situação levou ao adiamento da publicação da MP, quando as medidas de fato entrarão em vigor.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse ontem que a medida não é de longo prazo e foi desenhada para conter o fechamento de fábricas automotivas e dar fluxo aos estoques. A intenção é fechar os detalhes do programa na próxima semana.
— Estou falando de um programa que vai durar de três a quatro meses, não de uma coisa estrutural, mas que pode segurar o fechamento de plantas (fábricas) nessa transição. Você segura a onda no momento que está difícil para o setor — comentou Haddad, em entrevista à GloboNews.
Redução de até 10,96%
Na quinta-feira, o governo federal anunciou que vai reduzir impostos, com o objetivo de diminuir o preço final dos carros populares em até 10,96%. A medida valerá para veículos com valor final de até R$ 120 mil.
A tentativa da Fazenda de fazer um programa temporário frustra os planos do setor, que esperava um pacote com duração de pelo menos 12 meses. Segundo o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Márcio de Lima Leite, para a indústria, este seria o prazo mínimo ideal.
— É um projeto curto no tempo, para acomodar essa transição de crédito caro e pátios cheios. Não é um programa de longo prazo, é tópico, para alguns meses neste ano. Estamos discutindo quantos meses ele vai durar. As contas serão feitas até domingo — afirmou Haddad.
A ideia inicial era lançar as medidas em um anúncio completo na quinta-feira, num evento pomposo, mas acabou se tornando uma reunião fechada entre Lula, ministros e representantes do setor automotivo, porque a MP não está pronta.
Ao listar as ações numa entrevista à imprensa, Alckmin não deu detalhes como a duração e o custo das medidas, porque isso não fora amarrado previamente com a equipe técnica.
Uma primeira versão da MP elaborada pelo Mdic chegou a prever que a renúncia de receitas decorrente da redução dos impostos seria compensada com o aumento das vendas de carros. Mas essa projeção não pode ser usada como compensação para efeitos da LRF, e a MP foi barrada na área jurídica. O governo então optou por um anúncio improvisado.
Para marcar o Dia da Indústria, Alckmin listou as medidas que serão tomadas, mas sem a efetiva publicação das ações.
O vice-presidente afirmou que o governo vai reduzir as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do PIS/Cofins. Por lei, o IPI pode ser reduzido sem necessidade de compensação financeira, mas a equipe da Fazenda quer cobrir essa fatura com outra receita.
O corte de impostos pode ter um custo de até R$ 1 bilhão se o programa durar até o fim do ano, de acordo com integrantes da Fazenda. Caso seja menor, por quatro meses, o custo ficaria em cerca de R$ 560 milhões, segundo estimativas preliminares.
Na entrevista de ontem, Haddad afirmou que o programa não deve chegar a um quarto do impacto fiscal estimado pelo mercado, de R$ 8 bilhões. Ou seja, ficaria então abaixo dos R$ 2 bilhões.
— Não posso apresentar conta ao presidente sem estar fechada — argumentou. — Não passa perto de um programa para 12 meses, estamos discutindo o prazo.
O objetivo do governo é que ocorram descontos nos preços entre 1,5%, no mínimo, e 10,96%, no máximo, a partir da redução dos impostos. Os descontos levarão em conta três fatores: preço baixo, eficiência energética e densidade industrial (peças feitas no Brasil).
Nas reuniões internas em que foram discutidas as medidas, integrantes da equipe econômica se queixaram da redução de impostos federais, de acordo com membros do Palácio do Planalto e do Midc. Técnicos da Fazenda avaliaram que o anúncio das ações agora foi “precipitado”, visão externada nos debates internos, segundo essas fontes.
Transição energética
Interlocutores do Planalto admitem que o benefício fiscal para automóveis impacta o esforço arrecadatório do Ministério da Fazenda, que tenta viabilizar as metas estabelecidas no novo arcabouço fiscal, mas afirmam que ele será transitório e que a concessão foi um cálculo político para agradar a classe média.
Haddad tem reiterado constantemente que irá aumentar a arrecadação cortando subsídios e tributando setores que hoje pagam menos impostos.
Além da questão fiscal, outra crítica feita nos bastidores do próprio Executivo é que o corte de impostos vai beneficiar veículos movidos a combustíveis fósseis, indo contra a agenda ambiental do governo.
Ao rebater críticas de que a desoneração dos carros não atende consumidores de baixa renda, Haddad sustentou ontem que o governo tem tomado medidas para todas as classes sociais, citando o reforço do Bolsa Família, o reajuste do salário mínimo acima da inflação e a atualização da tabela do Imposto de Renda:
— Estamos com foco em todos os problemas herdados (do governo anterior) e direcionando soluções.
De acordo com o ministro, a partir de agosto o governo deve começar a lançar medidas de transição ecológica, com foco em veículos mais eficientes e menos poluentes.