Guerra deve afetar oferta de fertilizantes na safra 2023. Canadá e Jordânia são opções para o Brasil
Governo e representantes do agronegócio argumentam que impacto no setor pode ser forte, pois Rússia e Bielorússia são grandes exportadores
O governo avalia que não faltarão fertilizantes para o plantio da safra de grãos, que começa em setembro, apesar do aumento da escalada de tensões causadas pela invasão de tropas russas à Ucrânia. Porém, segundo fontes do Ministério da Agricultura, existe forte preocupação com o impacto da guerra na oferta desses produtos a partir do ano que vem. Um dos caminhos é buscar suprimento do Canadá, mas diversos países tentam essa solução e o preço tende a ficar mais alto.
De acordo com governo e fontes do agronegócio, há estoques e acertos que garantem a oferta interna até o início da próxima safra, ressaltaram as fontes. O que se busca é a manutenção do fornecimento de adubos e defensivos agrícolas daqui para frente.
Os preços dos fertilizantes já haviam subido bastante, e a oferta caído, em razão de sanções aplicadas à Bielorrússia — o governo do presidente Alexandr Lukashenko é acusado de fraudar a eleição presidencial do ano passado para permanecer no poder — um dos maiores produtores do mundo. Agora, o receio é de uma interrupção das importações da Rússia.
Ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues destacou que o Brasil importa 95% do potássio que consome internamente, dos quais 20% vêm da Bielorrúsia e outros 30% da Rússia. Ele acredita que a manutenção da oferta russa vai depender de quanto tempo vai durar a guerra.
"Esses 30% estão em xeque e tudo depende de quanto tempo vai demorar a invasão, o embargo em portos russos, os navios que vão chegar... Enfim, não há nenhuma segurança em relação ao abastecimento de potássio da Rússia", disse Rodrigues.
Segundo ele, a saída é procurar outros fornecedores, como o Canadá. A questão é que não só o Brasil, mas outros países produtores de alimentos, como os Estados Unidos e os europeus, também vão buscar os canadenses, o que pode resultar, entre outras coisas, em altas ainda mais elevadas de preços.
"A Jordânia também produz potássio, mas ainda será preciso iniciar uma negociação, que demora algum tempo. Há o risco de falta do produto", disse o ex-ministro.
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A senadora Kátia Abreu (PP-TO), que já chefiou a pasta da Agricultura e hoje preside a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, divulgou uma nota, na noite da última terça-feira, em que pediu mais empenho do governo brasileiro nos esforços diplomáticos pelo fim do conflito.
Ela fez um apelo para que o Brasil reitere que as sanções impostas à Rússia terão impacto considerável sobre a economia nacional e global — principalmente em áreas como petróleo, gás natural e alimentos.
Kátia Abreu ressaltou que, em 2021, Rússia e Belarus exportaram 11,7 milhões de toneladas de fertilizantes ao Brasil, o equivalente a 28% do que o país importou durante o período. Os dois mercados fornecedores, que ocupam a segunda e a terceira posições no ranking de importância nas compras brasileiras de potássio, enviaram 6 milhões dos 12,8 milhões de toneladas importados no ano passado.
“O setor produtivo agrícola será atingido, na medida em que o Brasil compra 20% dos fertilizantes do mercado russo, que correspondem a 65% do total das importações brasileiras da Rússia”, disse a senadora.
Pedro Carmago Netto, ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira, afirmou que ainda é difícil avaliar um cenário, uma vez que há uma guerra em andamento. Mas ele prevê que o impacto no agronegócio será significativo.
"Será forte. Saímos da pandemia com preços altos e crise climática em algumas regiões do país. E agora, as compras de fertilizantes, que já enfrentavam restrições com a Bielorrússia, agora deverão ficar mais difíceis com Rússia e mesmo a Ucrânia", disse Camargo Netto.
Bruno Lucchi, superintendente técnico da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), disse que os produtores estavam deixando para negociar as compras de fertilizantes com seus fornecedores a partir do segundo trimestre por duas razões: os altos custos dos produtos, desde o ano passado, e a tendência de queda de preços de alguns itens, como a ureia.
"Com esse problema maior, o produtor está revendo sua estratégia", afirmou. Fernando Carvalho Oliveira, engenheiro agrônomo da Tera Ambiental, acredita que o Brasil deveria investir em fertilizantes orgânicos compostos nacionais. Ele admite que esses produtos não vão substituir os fertilizantes minerais, mas podem ajudar.
"As fortes turbulências no mercado internacional de fertilizantes minerais estão alavancando a produção e venda dos fertilizantes orgânicos compostos no Brasil. Expressivas quantidades desses fertilizantes podem ser obtidas pelo adequado tratamento dos resíduos agropecuários, industriais, agroindústrias e do saneamento urbano no Brasil", enfatizou.