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"Já começa atropelando a Lei das Estatais", diz Elena Landau sobre indicação de Mercadante

Norma veda nomeação de quem atuou em campanha, e Câmara aprova a toque de caixa mudança em legislação

MercadanteMercadante - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

A indicação do petista Aloizio Mercadante para a presidência do BNDES no novo governo, confirmada terça-feira (13) pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, deve provocar um debate sobre a legalidade da nomeação. Isso porque a Lei das Estatais veda a indicação de “pessoa que atuou, nos últimos 36 meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral”.

Mercadante é presidente da Fundação Perseu Abramo e foi um dos responsáveis pela elaboração do programa de governo de Lula na campanha. Na noite de terça-feira, a Câmara dos Deputados a toque de Caixa mudança na Lei das Estatais que reduz de 36 meses para 30 dias o período de quarentena para ocupação de cargos no Conselho de Administração e na diretoria de empresas controladas pelo Estado. O texto ainda precisa ser aprovado no Senado.

"Já começa atropelando a Lei das Estatais. Ele foi coordenador do plano de governo do Lula, como eu fui coordenadora da Simone Tebet, mesmo sem assinar nada" disse Elena Landau, economista e ex-diretora do BNDES, que coordenou a área econômica na campanha de Tebet.

Ela deu a declaração antes da aprovação da mudança na Câmara. Elena Landau também criticou declarações recentes de Mercadante contra a TLP, taxa usada em empréstimos do BNDES. Para ela, mudanças na taxa poderiam atropelar o mercado de capitais privado com subsídios que se mostraram desnecessários.

Para o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES na gestão de Fernando Henrique Cardoso, a indicação não suscita maiores preocupações:

"Embora grande, o banco não tem mais o peso que teve lá trás. O BNDES perdeu importância como banco de Estado, que era transformador. Portanto, não vejo problemas o Mercadante ser indicado para a presidência. Havia áreas mais perigosas onde ele poderia estar."

Papel que desempenhou em campanha
O advogado Bruno Furiati, sócio do escritório Sampaio Ferraz, avalia que é preciso verificar com precisão o papel que Mercadante desempenhou na campanha.

"Se ele trabalhou na realização da campanha eleitoral, que parece ser o caso, há vedação à nomeação expressa na lei. É preciso apurar qual foi a função dele. Se foi apenas estruturador do plano econômico e não teve atuação vinculada, estaria livre para assumir. O ponto de análise é esse" disse.

Na segunda-feira (12), Mercadante afirmou a jornalistas que desconhecia qualquer iniciativa por parte da equipe do novo governo de alterar a Lei das Estatais, aprovada na gestão de Michel Temer, em 2016.

Para governo, não há impedimento legal
O governo avalia que não há impedimento legal para manter a indicação e que não seria necessário mudar a lei. O argumento seria a aprovação da indicação de Fábio Abrahão ao cargo de diretor do banco de fomento no governo de Jair Bolsonaro.

Os petistas apresentam a ata da 63ª reunião do comitê de elegibilidade do BNDES. Na ocasião, constatou-se que Abrahão tinha registro de atividade associada à campanha eleitoral de 2018 do Partido Social Liberal (PSL).

Mas a avaliação foi de que as atividades políticas não se enquadravam na vedação ao cargo de administrador de empresa estatal porque ele exerceu o que foi chamado de trabalho intelectual. O mesmo argumento deve ser usado com Mercadante.

Para o advogado Guilherme Amorim, doutor em Direito Constitucional pela PUC-SP, a análise deve esmiuçar o papel de Mercadante na campanha:

"Se o papel do Mercadante tiver sido extraoficial ou informal, ele poderia, a rigor, ser nomeado para o cargo."

Do ponto de vista econômico, a indicação de Mercadante para o BNDES frustra alguns agentes do mercado. Para Rodrigo Marcatti, economista e CEO da Veedha Investimentos, o mercado financeiro tinha a esperança de que o novo governo recrutasse pessoas com pensamentos divergentes do PT para cargos-chave na Economia. Marcatti avalia que Mercadante tem bagagem e experiência, mas o problema é o que sua indicação pode simbolizar.

"Sabemos das interferências políticas nas estatais no governo do PT. Aí veio uma medida positiva, que é a Lei das Estatais, para acabar com isso. Será que Mercadante era a única opção de um aliado que poderia ocupar esse cargo?" diz o economista.

Política de crédito
Atual coordenador de grupos técnicos da transição, Mercadante liderou três ministérios durante os mandatos da ex-presidente Dilma Rousseff (2011 a 2016): Ciência, Tecnologia e Inovação, Educação e Casa Civil.

O economista André Perfeito avalia que é necessário Mercadante vir logo a público explicar qual será a política de crédito do banco. Existe o temor do mercado financeiro de que haja mudanças na Taxa de Longo Prazo (TLP) e os juros voltem a ser subsidiados, como nos tempos da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), quando o juro era definido pelo governo.

"Isso tem impacto no mercado de capitais, especialmente no crédito que o mercado aloca. Então, seria importante que Mercadante viesse a público dizer qual será a orientação do BNDES em sua gestão" avalia o economista, lembrando que juros subsidiados provocam distorções no mercado de crédito.

O ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega avalia que o discurso de Mercadante remete ao passado:

"É um nome que não é bem recebido pelo mercado porque as entrevistas que ele tem dado revelam a visão de que o BNDES deve ser um instrumento de dirigismo econômico, algo anacrônico e que já deu errado."

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