Juiz rejeita acordo judicial da Boeing sobre acidentes fatais com 737
Magistrado cita cláusula de diversidade ao não aceitar acordo de confissão da empresa sobre tragédias
Um juiz federal rejeitou o acordo judicial da Boeing que buscava evitar a acusação criminal da fabricante de aviões pelos dois acidentes fatais com o modelo 737 Max, em uma reviravolta que ameaça prolongar a recuperação da empresa de escândalos anteriores.
O juiz distrital dos EUA, Reed O’Connor, ficou do lado dos familiares das vítimas dos acidentes, que pediram a rejeição do acordo. O’Connor afirmou que se opôs ao acordo proposto porque ele exigiria, de forma inadequada, que a disputa fosse considerada na contratação de um monitor independente e porque seu papel em garantir que a Boeing cumprisse o acordo seria minimizado.
"Essas disposições são inadequadas e contrárias ao interesse público", disse O’Connor em sua decisão nesta quinta-feira.
Leia também
• Boeing vai demitir mais de 2.500 trabalhadores nos EUA para cortar custos, diz agência
• Boeing inicia demissões para reduzir 10% dos funcionários
• Boeing: tráfego aéreo de carga deve dobrar até 2043, puxado por mercados emergentes
O juiz de Fort Worth, Texas, pediu que ambas as partes se reunissem e decidissem os próximos passos, que podem incluir a revisão do acordo judicial para abordar as preocupações levantadas.
Um representante da Boeing não comentou a decisão.
A decisão representa um novo revés para os esforços da Boeing de retomar o caminho após um ano de crises, que começou quando um painel do tamanho de uma porta se desprendeu de um 737 Max em voo no início de janeiro.
O quase desastre revelou controles de qualidade deficientes nas fábricas da Boeing, aumentou o escrutínio de reguladores e clientes e levou a uma reestruturação na administração, incluindo a saída do CEO da empresa.
As ações da Boeing caíram 1% na quinta-feira. Este ano, os papéis acumulam uma queda de cerca de 40%, o maior declínio no Índice Dow Jones.
Parentes das vítimas dos acidentes lutaram por anos para obter penalidades mais severas após os desastres do voo 610 da Lion Air, em outubro de 2018, e do voo 302 da Ethiopian Airlines, em março de 2019. Ambos os acidentes fatais foram vinculados a um sistema de controle de voo com falhas.
Em 2021, a Boeing chegou a um acordo com o Departamento de Justiça dos EUA para adiar o processo por acusações de que teria enganado os reguladores sobre o sistema. Em maio, o governo afirmou que a empresa violou esse acordo e recomendou acusações criminais, citando a falha da Boeing em cumprir suas promessas.
A Boeing então concordou em se declarar culpada de conspiração criminosa, pagar uma multa e instalar um monitor corporativo independente. O novo acordo também exigia que a empresa gastasse pelo menos US$ 455 milhões para fortalecer seus programas de conformidade e segurança.
Ao rejeitar o acordo proposto, O’Connor citou disposições relacionadas à escolha do monitor independente, incluindo orientações que instruíam os promotores a considerarem políticas de diversidade, equidade e inclusão. Ele também criticou as exigências de que o monitor respondesse ao governo, em vez de ao tribunal.
"É justo dizer que a tentativa do governo de garantir a conformidade falhou", disse O’Connor. "Neste ponto, o interesse público exige que o tribunal intervenha. Marginalizar o tribunal na seleção e supervisão do monitor independente, como faz o acordo judicial, mina a confiança pública na liberdade condicional da Boeing, não promove o respeito pela lei e, portanto, não está de acordo com o interesse público."
Famílias das Vítimas
Erin Applebaum, sócia da Kreindler & Kreindler LLP, que representa alguns parentes das vítimas do acidente, afirmou que as famílias esperam que a rejeição do acordo judicial pelo juiz coloque fim ao “tratamento condescendente dado à Boeing” pelo governo.
“Esperamos uma renegociação drástica do acordo judicial, incluindo novos termos que reflitam adequadamente a magnitude dos crimes cometidos pela Boeing”, disse ela em um comunicado.
A rejeição do acordo proposto pelo juiz ocorre meses depois de ele fazer um pedido incomum para que ambas as partes explicassem a linguagem do acordo que instruía o Departamento de Justiça (DOJ) a considerar diversidade e inclusão ao selecionar um monitor independente. O governo defendeu isso como um reflexo das práticas de longa data da agência.
O’Connor afirmou que a resposta do governo apenas aumentou suas preocupações de que a raça provavelmente seria um fator-chave para o governo ao selecionar um monitor, chegando a sugerir que não está convencido de que o governo “não agirá de maneira discriminatória” ao tomar essa decisão.
Ele também questionou como a Boeing poderia aplicar o requisito de diversidade e inclusão. Segundo o acordo judicial, a empresa teria a capacidade de rejeitar um dos seis candidatos a monitor selecionados pelo governo. O’Connor disse estar preocupado que a empresa pudesse usar a cláusula de diversidade para eliminar um candidato “de maneira discriminatória e com considerações raciais”.
Paul Cassell, um dos advogados que representam os familiares, afirmou que a decisão de O’Connor é uma vitória importante nos esforços para responsabilizar a empresa.
“Essa decisão deve levar a uma renegociação significativa do acordo judicial para refletir as mortes causadas pela Boeing e implementar as devidas medidas corretivas para o futuro”, disse Cassell em um comunicado.