Mão de Obra: seis em cada dez empresas têm dificuldade para contratar ou reter profissionais
Saída tem sido investir em capacitação interna e oferecer mais benefícios; escassez atrasa entregas e exige recusa de novos contratos
Com o mercado de trabalho aquecido e o desemprego nas mínimas históricas, está difícil encontrar mão de obra qualificada.
Seis em cada dez empresas já relatam dificuldades para contratar ou reter trabalhadores, e entre essas, 77,2% indicam a contratação como o principal desafio na gestão de mão de obra.
Os dados são de uma pesquisa inédita do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE), obtida com exclusividade.
O levantamento foi conduzido em outubro e entrevistou 3.707 empresas dos setores de indústria, comércio, serviços e construção civil.
A pesquisa surgiu após o economista Rodolpho Tobler, coordenador das sondagens empresariais do instituto, observar um aumento no número de empresas de construção e serviços que relataram a escassez de mão de obra como entrave ao crescimento nos últimos meses.
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De acordo com a pesquisa, 58,7% das empresas no país enfrentam dificuldades para absorver ou reter talentos, percentual que sobe para 60,4% no setor da construção civil.
"As empresas têm dificuldade para encontrar a mão de obra e, quando encontram, muitas vezes precisam contratar a um valor mais alto. Isso pode levar ao repasse de custos para o produto final, gerando inflação em um segundo momento. E esse fenômeno está espalhado entre os setores", alerta Tobler.
Entre as que enfrentam esse desafio de mão de obra, contratar novos colaboradores é o principal entrave (77,2%). O indicador é ainda maior na construção, onde oito em cada dez empresas não encontram gente para trabalhar.
Segundo o economista, a construção civil é um setor mais afetado do que os demais. Ele explica que, após um ciclo negativo, a atividade começou a se recuperar no ano passado.
Medidas de estímulo do governo, como a expansão do programa Minha Casa Minha Vida, impulsionam o setor, mas a oferta de mão de obra não tem crescido na mesma proporção que a demanda.
Pressão por salários maiores
Conseguir mão de obra qualificada é a principal dificuldade dos setores econômicos (64,9%). É o caso de um engenheiro, responsável por projetos na construção.
Ou de um técnico na indústria que tem conhecimento para operar determinado maquinário, por exemplo.
Em segundo lugar está a procura por mão de obra não qualificada (18,5%), com destaque para os setores de indústria e serviços, que registram os percentuais mais elevados.
Outro desafio é pagar salários mais altos (9,4%), um desafio que é mais evidente no setor de serviços, onde o índice chega a 10,9%.
Tobler destaca que, no caso dos serviços, há uma demanda por salários mais altos especialmente na área de tecnologia da informação, onde a competição por talentos e a possibilidade de trabalho remoto pressionam os salários.
O impacto direto desses custos acaba sendo repassado ao consumidor, o que aumenta a inflação de serviços, considerada mais difícil de controlar pelo Banco Central, diz ele.
Capacitação e benefícios viram alternativas
A pesquisa do FGV IBRE também perguntou como os empresários estão fazendo pra resolver esse problema de escassez de mão de obra.
A saída tem sido investir em capacitação interna (44%) ou oferecer mais benefícios (32%). Na indústria, mais da metade (56,2%) estão adotando a prática de qualificação.
Por último, a sondagem identificou como a falta de profissionais para contratar vem impactando as entregas. Por enquanto, quase metade (47,7%) assinalaram que não vêm encontrando dificuldades neste quesito, o que ainda sinaliza um cenário mais favorável.
No entanto, já há empresas apontando impactos negativos, o que serve de atenção para os próximos meses, diz Tobler.
Cerca de 21,5% das empresas ampliaram a carga horária de seus funcionários, enquanto 17% registraram atrasos nas entregas.
Atraso de entregas e repasse de custos
A situação é ainda mais crítica no segmento da construção, em que 21,1% das empresas estão atrasando entregas e 18% estão rejeitando novos contratos e operando abaixo de sua capacidade ideal.
Percentual bem superior quando considerados todos os setores, em que a taxa ficou em 8,4%.
Para Tobler, os dados emitem um sinal de alerta sobre o impacto que a baixa qualificação traz sobre o nível de produtividade da economia brasileira.
"O crescimento potencial do Brasil poderia ser maior se tivéssemos mão de obra qualificada que conseguisse atender toda essa demanda. Enquanto não temos, isso reforça nossos problemas estruturais. Apesar do aumento da escolaridade, muitas vezes essa qualificação não é direcionada para as demandas do mercado, o que compromete os ganhos de produtividade".