Logo Folha de Pernambuco

Combustíveis

Nova política de preços da Petrobras reduz concorrência e pode gerar questionamentos no Cade

Estatal domina o setor de refino, com 80% da capacidade, e a produção de petróleo, com mais de 90%

PetrobrasPetrobras - Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

A nova política de preços da Petrobras, anunciada nesta terça-feira (16), deve reduzir a concorrência e gerar questionamentos no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que regula a concorrência no país, de acordo com especialistas. A estatal domina o setor de refino, com 80% da capacidade, e a produção de petróleo, com mais de 90%.

A nova política de preços anunciada pela Petrobras vai abandonar o PPI (paridade de importação) como único norte da estratégia de reajuste dos combustíveis.

Segundo Cleveland Prates, ex-conselheiro do Cade e professor da FGV, a nova política de preços da Petrobras vai implicar em uma menor concorrência no país. Hoje, segundo a Refina Brasil, que reúne as refinarias privatizadas, os agentes privados somam 20% da capacidade de refino.

- Para um agente privado, se o preço que praticado no Brasil for menor que no mundo, ele não tem incentivo para investir. E haverá menos concorrência.

Prates destaca ainda que a nova política de preços da estatal vai reforça a sua concentração de mercado no país:

- O importador pode desistir de atuar no Brasil, pois ele terá de comprar um produto mais caro no exterior e não vai conseguir competir com a Petrobras. Para os acionistas da Petrobras, é ruim pois a estatal perde seu custo de oportunidade, pois ela pode deixar de ter um valor de mercado maior. E esse investidor pode procurar outras empresas com maior ganho - afirma Prates.

Para ele, a nova política de preços da Petrobras é errada e gera um problema concorrencial.

- Isso pode gerar uma elevação dos custos dos rivais, já que haverá dificuldades para gerar concorrência e permitir a entrada de novas empresas. E isso pode ser questionado no Cade ao se estabelecer um preço que não acompanha as cotações internacionais. A médio e longo prazos, ao se desestimular a importação, pode ser que a Petrobras não consiga abastecer todos os lugares - afirma o professor da FGV.

Venda da BR: Presidente da Petrobras diz que foi ‘erro crasso’, mas prefere renegociar marca que ir à Justiça

Em um vídeo nas redes sociais, Lula se disse “feliz” com o cumprimento da promessa de “abrasileirar”os preços dos combustíveis.

Jean Paul Prates, presidente da Petrobras, disse nesta terça-feira que a nova política de preços vai acompanhar os preços internacionais do petróleo, mas vai levar em consideração outros aspectos, como a produção local, a capacidade de refino, o perfil do cliente e a área de influência das refinarias.

Na gestão de Jair Bolsonaro, a Petrobras fez um acordo com o Cade, que investigava o poder de mercado da companhia. Para isso, a estatal propôs a venda de refinarias e de ativos na área de gás. Agora, o novo governo quer rever esses acordos.

Sergio Araujo, presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Combustível (Abicom), disse que vai acompanhar e analisar se os compromissos assinados entre a Petrobras e o Cade serão compridos. Ele lembra que a Abicom foi a autora de um inquérito aberto pelo Cade para analisar o poder de mercado da estatal, que gerou dois acordos de conduta.

- Vamos verificar se esses acordos serão mantidos. Se não forem mantidos, vamos conversar com o Cade. Mas ainda é cedo. Vamos analisar as práticas da Petrobras - afirmou Araujo.

Visão dos especialistas: Fim da paridade de importação pode afetar resultados

Rodrigo Jansen, sócio do escritório Leal Cotrim Advogados e especialista do setor de óleo e gás, diz que, embora o PPI não seja imutável, a Petrobras não pode se desviar completamente dos preços praticados no mercado, sob pena de infringir a Lei das Estatais e o próprio Estatuto Social da Companhia.

-Para a Lei das Estatais, para assumir obrigações fora das práticas distintas do mercado, isto deverá estar claramente definido em lei ou regulamento, bem como os custos respectivos devem ser discriminados e divulgados de forma transparente. Exageros, portanto, poderão provocar ações de acionistas, órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União e o Ministério Público, bem como do Cade, diante dos potenciais impactos na concorrência - analisa Jansen.

Na avaliação de Lucas Farina, economista na Genial Investimentos, a mudança do PPI para o PCI (preço de competitividade interna) pela Petrobras parece se assemelhar a uma prática de dumping - quando uma empresa vende um produto abaixo do valor justo para prejudicar seus concorrentes -, algo que poderia culminar em batalhas judiciais mais à frente, explica:

- A Petrobras parece com isso recuperar parte do “market share” que perdeu nos últimos anos, tentando voltar a uma condição monopolista no mercado doméstico. Mas tem um problema: atualmente o Brasil não é autossuficiente em derivados de petróleo, e buscar retirar os concorrentes do mercado, usando esse poder da Petrobras em fixar os preços, pode causar um desabastecimento no mercado interno - o que geraria um efeito oposto. Com isso, os preços acabariam aumentando ao invés de diminuir.

Amance Boutin, especialista em combustíveis da Argus, empresa especializada na produção de relatórios e análises de preços para o mercado de combustíveis, disse que a nova política de preços também será colocada à prova mesmo em uma situação de subida das cotações no exterior.

-Qualquer mudança de estratégia neste aspecto pode ter um impacto significativo sobre o balanço e os investimentos das empresas importadoras de combustíveis.

Para ela, durante os governos anteriores, a Petrobras recuou na atividade de importação de diesel, deixando agentes privados elevarem sua fatia de mercado, já que o parque de refino nacional não podia suprir. Hoje, de acordo com a Abicom, a associação dos importadores, a importação representa entre 20% e 30% do total de combustíveis consumidos, como diesel e gasolina.

Veja também

Governo bloqueia R$ 6 bilhões do Orçamento de 2024
Orçamento de 2024

Governo Federal bloqueia R$ 6 bilhões do Orçamento de 2024

Wall Street fecha em alta com Dow Jones atingindo novo recorde
Bolsa de Nova York

Wall Street fecha em alta com Dow Jones atingindo novo recorde

Newsletter