Nova regra fiscal tem repercussão positiva. Entenda as regras
Anunciado ontem (30), o projeto será enviado ao Congresso Nacional
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, divulgou ontem (30) os parâmetros do novo arcabouço fiscal do Governo. A nova regra vai prever uma banda para o crescimento real das despesas primárias, ou seja, tudo o que é gasto pelo governo sem contar o pagamento de juros. As despesas sempre irão crescer acima da inflação, independentemente do cenário. Hoje, o teto de gastos trava as despesas ao índice de preços. Recursos para a educação, como os do Fundeb, e para a saúde, como o pagamento do piso da enfermagem, serão excluídos dessa regra.
A proposta substituirá o teto de gastos que vigora desde 2016 e limita o crescimento das despesas ao ano anterior, corrigido pela inflação oficial (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA). Para controlar as contas públicas, sem ter que aumentar a carga tributária já alta, o governo criou o teto de gastos, mas ao “congelar” despesas, a medida acabou sendo descumprida várias vezes. Desde a criação do mecanismo, o limite foi furado pelo menos sete vezes.
No fim do ano passado, a Emenda Constitucional da Transição permitiu a exclusão de até R$ 168 bilhões do teto de gastos deste ano – R$ 145 bilhões do novo Bolsa Família e até R$ 23 bilhões em investimentos federais, caso haja excesso de arrecadação.
Regras
Na nova política fiscal, haverá uma combinação de limite de despesa mais flexível que o teto de gastos com uma meta de resultado primário (resultado das contas públicas sem os juros da dívida pública).
O novo arcabouço fiscal limitará o crescimento da despesa a 70% da variação da receita dos 12 meses anteriores. Ou seja, se no período de 12 meses, de julho a junho, o governo arrecadar R$ 1 trilhão, poderá gastar R$ 700 bilhões.
Dentro desse percentual de 70%, haverá um limite superior e um piso, uma banda, para a oscilação da despesa, com desconto do efeito da inflação.
Em momentos de maior crescimento da economia, a despesa não poderá crescer mais de 2,5% ao ano acima da inflação. Em momentos de contração econômica, o gasto não poderá crescer mais que 0,6% ao ano acima da inflação.
Para impedir o descumprimento da rota de 70% de crescimento da receita, as novas regras trarão mecanismos de punição que desacelerarão os gastos caso a trajetória de crescimento das despesas não seja atendida.
Se o resultado primário ficar abaixo do limite mínimo da banda, o crescimento das despesas para o ano seguinte cai de 70% para 50% do crescimento da receita. Para não punir os investimentos (obras públicas e compra de equipamentos), o novo arcabouço prevê um piso para esse tipo de gasto e permite que, caso o superávit primário fique acima do teto da banda, o excedente seja usado para obras públicas.
A equipe econômica esclareceu que o limite de 70% está baseado nas receitas passadas, não na estimativa de receitas futuras. Dessa forma, futuros governos, ou o Congresso Nacional, não poderão aumentar artificialmente as previsões de receitas para elevar as despesas.
Repercussão
O anúncio de ontem repercutiu entre os atores políticos e econômicos. Em geral, a reação foi positiva como a do mercado financeiro. O Ibovespa fechou em alta de 1,89%. Já o dólar caiu 0,72%, negociado a R$ 5,09, após atingir a mínima de R$ 5,07. É a menor cotação desde 4 de fevereiro, quando a divisa encerrou a R$ 5,04.
No campo político, o presidente da Câmara dos deputados, Arthur Lira, avaliou que a apresentação foi um "bom começo" e completou
"Faz parte daquilo que já estávamos tratando. Tivemos alguns detalhes, do que se pretende fazer, as metas, os efeitos. Lógico que o arcabouço vai ser uma diretriz mais flexível do que é o teto hoje".
Já o ex-presidente Michel Temer, responsável pela criação do teto de gastos, afirmou que:
"Não estou entrando no mérito. Tenho orgulho de ter introduzido o teto de gastos e esse debate no Brasil. Estava previsto na norma que houvesse uma revisão a cada dez anos. O que está havendo agora é uma atualização, uma adaptação, que estão antecipando.”
Leia também
• Wellington Dias elogia arcabouço fiscal por garantir compromisso com os mais pobres
• Arcabouço fiscal não é "bala de prata" e criará colchão para o país, diz Haddad
• Impacto de nova regra fiscal sobre juros ainda será avaliado, diz BC
Outro que fez sua avaliação foi o senador Alessandro Vieira (PSDB):
"A proposta de novo arcabouço fiscal apresentada pelo governo ainda precisa ser detalhada, mas claramente está alinhada com boas experiências internacionais e parece ser adequada às nossas necessidades de desenvolvimento. Vamos aguardar os textos legais, mas é um passo positivo", escreveu.
Na área econômica, alguns especialistas também analisaram a proposta. É o caso de Felipe Salto, economista-chefe e sócio na Warren Brasil:
"A regra é boa. O crescimento do gasto limitado a 2,5% (ao ano), no máximo, com regra pautada pela receita, confere a devida flexibilidade ao arcabouço. Entendo que o arcabouço nasceu crível. Produzirá bons efeitos na curva de dívida/PIB".
O presidente da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Isaac Sidney, emitiu uma nota oficial sobre o projeto:
"A Febraban considera positivo o conjunto de medidas anunciadas pela equipe econômica sobre as premissas do novo arcabouço fiscal, antecipando-se, inclusive, ao prazo estabelecido pela emenda constitucional 126 (PEC da Transição). Trata-se de um passo importante e meritório, pois procura combinar as prioridades sociais do país com o necessário controle da expansão dos gastos públicos. Ainda que seja necessário conhecer e aprofundar seus detalhes, a proposta anunciada representa um avanço na busca da trajetória sustentável da dívida pública, ao estabelecer limites para a expansão das despesas do setor público combinada com metas de resultado primário ambiciosas, com a previsão de zeragem do déficit primário já em 2024. Com isso, ao longo dos próximos anos, poderemos até ter um recuo da dívida pública em relação ao PIB".