"O mercado está digerindo bem. Medidas indicam que não há crise institucional", diz economista
Para Carlos Primo Braga, ex-diretor do Banco Mundial, terrorismo em Brasília prejudica imagem do país, mas reação fortalece governo Lula e instituições
Ex-diretor do Banco Mundial e professor da Fundação Dom Cabral, o economista Carlos Primo Braga afirma que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sai mais forte dos atos golpistas de domingo em Brasília para conseguir aprovar pautas de seu interesse no Congresso. Ele disse que a expectativa de que a Bolsa desabaria e o dólar subiria não se concretizou, com uma reação “nada dramática”.
Quais as consequências para economia das invasões em Brasília?
Foi uma tragédia. Havia a expectativa de que teria uma desvalorização do real e queda na Bolsa. No primeiro momento, observou-se um pouco disso, mas já se acalmou. O dólar se valorizou, mas não foi nada dramático. O mercado está digerindo, sem dúvida nenhuma.
Houve uma série de medidas que indicam que não há uma crise institucional. Seria o grande perigo. Mas só vamos ter certeza disso a médio prazo. A democracia resistiu bem aos tresloucados. Houve união muito clara das classes políticas, da sociedade. Há uma reação de apoio às instituições democráticas e ao presidente eleito.
O governo Lula sai fortalecido ou não da situação?
O resultado fortalece o governo Lula nas próximas semanas, não foi apenas o Executivo, todo os poderes e a democracia. Houve uma reação da sociedade brasileira. Vai haver um fortalecimento do governo nesse sentido, mesmo no Congresso.
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Até mesmo um deputado como Lira (Arthur Lira, presidente da Câmara, do PP de Alagoas), que vem de uma trajetória de apoio a Bolsonaro, já está se posicionando ao lado do governo Lula, dado o que se passou domingo. O que o governo vai fazer com isso é a grande questão.
Olha a primeira semana da administração Lula. As mensagens que foram emitidas e como o mercado interpretou não foi um bom início. Pode-se dizer que, na primeira semana, ainda estão batendo cabeça, logo vamos ter cooperação.
Chamar o teto de gastos (regra que limita o crescimento das despesas) de estupidez, sem oferecer uma clareza sobre qual a âncora fiscal no futuro próximo, as mensagens de rever a reforma da Previdência e o marco do saneamento, tudo isso, vem fazendo o mercado reagir negativamente.
Qual é o temor?
O que pode ser um efeito, digamos, negativo desse processo é o governo se sentir mais à vontade de ter uma política intervencionista, sem atenção ao ajuste fiscal, com o apoio politico de médio e longo prazo, dar asas a uma visão intervencionista para tentar acelerar crescimento, sem as condições fiscais adequadas.
Vai ficar mais fácil para o governo negociar com partidos da oposição, que vão ter dificuldade maior de se opor ao governo nessa fase inicial, após o episódio. Há uma tentação natural de todos darem apoio a um programa de governo mesmo que ideologicamente possa haver diferenças significativas.
Imagino que vamos assistir a um aumento do déficit fiscal. A tendência já era essa. Nesse momento, vamos ver um incentivo a gastos governamentais sem ter receita.
O episódio assusta o investidor estrangeiro?
O investidor estrangeiro continuará sendo atraído pela taxa de juro elevada. Já o investidor direto estrangeiro tem preocupação natural com a situação política, da instabilidade do Brasil. Vai comparar com Argentina, com México.
No curto prazo, ainda tem muito ruído. Você olha os comentários lá fora, a visão que transmitia é do que aconteceu no Capitólio nos Estados Unidos. Não é uma visão boa para nenhum país. Mas, no curto prazo, os mercado financeiros estão digerindo bem.