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Agência de viagens

O que aconteceu com a 123milhas? Como ela funciona?

Companhia suspendeu pacotes com datas flexíveis na última sexta, causando revolta entre clientes

Venda de pacotes flexíveis para viagens aéreas, sem data certa, representa um grande risco aos consumidoresVenda de pacotes flexíveis para viagens aéreas, sem data certa, representa um grande risco aos consumidores - Foto: Freepik

Na última sexta-feira (18), a 123milhas surpreendeu clientes ao anunciar a suspensão de pacotes de sua linha promocional, a Promo, previstos para o período entre setembro e dezembro deste ano. Com 15 milhões de clientes — segundo dados da própria companhia — ela passou de uma empresa de compra e venda de milhas para uma das maiores agências de viagens digitais do país.

Fundada em 2016, em Belo Horizonte, em Minas Gerais, a 123milhas nasceu como um intermediador entre pessoas que queriam vender suas milhas acumuladas e viajantes em busca de bilhetes de avião mais baratos.

Com o tempo, incorporou outros serviços. Por meio de seu site, além de comprar tíquetes aéreos com preços cerca de 50% mais baixos, também é possível reservar passagens de ônibus, diárias em hotéis, pacotes completos e alugar carros.

Risco elevado
A venda de pacotes flexíveis, sem data certa, representa um grande risco aos consumidores, que não têm a certeza de quando poderão viajar, dizem especialistas. O economista Luís Alberto de Paiva, que atua com reestruturação financeira de empresas, destaca que, por não ser uma empresa de capital aberto, não era possível saber a saúde financeira da 123milhas e se ela estava apta a cumprir todos os contratos.

— É um modelo de negócio muito arriscado e que precisa de regulamentação — opina. — A gente não consegue medir o quanto o negócio tem de alavancagem. Pode captar R$ 3 milhões, mas estar alavancada em vendas em R$ 6 milhões ou até R$ 20 milhões. E a gente só descobre que a empresa está com dificuldades quando deixa de embarcar os passageiros dela.

Tabata Fagundes, advogada da Securato & Abdul Ahad Advogados, não considera a forma de atuação da 123milhas ilegal, mas diz que, com o crescimento da companhia, torna-se insustentável:

— Com menos consumidores e fornecedores, quando acontece qualquer desequilíbrio no mercado, é mais fácil assumir prejuízos e seguir com a operação. Com escala, isso se torna insustentável, porque precisa da entrada de novos clientes para bancar pacotes de outros.

Nesta segunda-feira, o ministro do Turismo suspendeu o registro da 123milhas no cadastro público da pasta e determinou que, a partir de agora, todas as empresas similares precisam comprovar a viabilidade econômica do negócio.

Os riscos da plataforma, no entanto, não se limitavam apenas a viagens sem período determinado. O próprio uso de milhas por terceiros já vinha gerando dor de cabeça para alguns viajantes, que acabavam não recebendo as mesmas garantias de reservas feitas diretamente nas companhias aéreas ou nas pousadas, em caso de contratempos em viagens já marcadas.

Isso acontece porque, como as empresas aéreas proíbem a venda de milhas, é muito comum que, em qualquer problema, o cliente fique entre dois lados que não resolvem a questão e jogam a responsabilidade de um para o outro.

De acordo com a advogada Luciana Atheniense, especialista em direito do turismo, a Justiça considera que há obrigação solidária àqueles que integram a cadeia de fornecimento. No entanto, quando o bilhete aéreo não foi ainda emitido, a única responsável é a agência que vendeu o pacote.

— É um modelo arriscado e que, por causa da publicidade extremamente agressiva, com personalidades famosas, acaba por gerar confiança no consumidor — observa.

União com MaxMilhas
No início do ano, a 123milhas comunicou ao mercado a união com a MaxMilhas, do mesmo segmento, em uma operação que foi responsável por criar uma das maiores OTA (sigla para Online Travel Agency, ou agência digital de viagens) do país.

O crescimento se reflete no número de pessoas atendidas, queixas em sites de defesa de consumidor — que não param de subir — e até em compras de espaço publicitário nos principais aeroportos do país. A empresa já chegou a ter entre os garotos-propaganda Bruno de Luca e Zezé di Camargo.

O próprio mote do negócio da 123milhas, que tem como sócios Ramiro Julio Soares Madureira, Augusto Julio Soares Madureira e Cristiane Soares Madureira do Nascimento, é frágil, considera o economista e professor de MBAs da FGV Roberto Kanter, especializado em varejo. Além da operação depender do baixo preço das passagens para se sustentar, depende da cotação das milhas.

— Essa enorme dependência da conversão em milhas levou a essa situação de quase inadimplência. Eles compravam milhas relativamente baratas, ficavam com um saldo e trocavam as milhas por uma passagem — explica Kanter. — O problema é que antigamente um voo promocional saía por 5 mil milhas, hoje custa 30 mil milhas. A empresa não tem saldo de milhas o suficiente para honrar todos os compromissos assumidos.

E acrescenta:

— As companhias aéreas perceberam que eram dependentes das milhas e contra atacaram. Por enxergarem nessa indústria um enorme problema, mudaram o quanto cada valor se reverte em milhas. Esse é o grande problema do modelo de negócios 100% dependente de companhias aéreas.

Impasse com consumidores
Após a suspensão dos embarques previstos até o fim do ano, a 123milhas ofereceu aos clientes a possibilidade de transformar os valores empregados em um voucher, com acréscimo de 150% do CDI, para ser usado em até 36 meses na própria plataforma.

Advogados ouvidos pelo Globo e a Secretaria Nacional do Consumidor argumentam que oferecer apenas essa alternativa de ressarcimento é ilegal, já que o Código de Defesa do Consumidor prevê que os clientes devem ter a chance de receber de volta a quantia gasta em dinheiro, com correção monetária, ou exigir o cumprimento da oferta do serviço por outro prestador.

Segundo Luciana Atheniense, alguns de seus clientes receberam a opção de devolução das quantias empregadas em formato de voucher parcelado, o que torna a troca ainda mais desvantajosa. Uma viagem para Paris que custou R$ 2 mil, por exemplo, foi devolvido em quatro vouchers de R$ 500, que não poderiam ser usados cumulativamente.

— Que garantia o comprador vai ter que esse voucher de quatro vezes vai ser pago no ano que vem? A confiança está abalada, e a empresa impõe que ele continue vinculado a ela mediante o voucher — critica a especialista.

Procurada, a empresa não respondeu sobre a devolução em vouchers parcelados, nem informou se há possibilidade de ressarcimento em dinheiro.

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