Ovo ganha status de prato principal durante a pandemia
Em relação a 2010, o consumo de ovos per capita subiu 69,5%, para 251 unidades no ano passado
Frito, mexido, poché. Não importa a receita, o ovo aparece como protagonista em muitas refeições durante a pandemia. Não foi por questão de saúde, mas financeira. Uma combinação de inflação das carnes e queda da renda conferiu um novo status a essa fonte de proteína.
Segundo Ricardo Santin, presidente da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), o setor cresce nos últimos dez anos puxado principalmente por um trabalho de desmistificação desse alimento. Vilão do colesterol nos anos 1990 e 2000, o ovo agora é apontado como um regenerador da estrutura física, capaz de retardar o envelhecimento.
"Fizemos uma campanha forte de esclarecimento, e tivemos no último ano um impulso com a alta no preço da carne", afirma.
Em relação a 2010, o consumo de ovos per capita subiu 69,5%, para 251 unidades no ano passado. Ante 2019, o crescimento foi de 9,1%.
Na outra ponta, o produtor comemora, mas com ressalvas. Aumentos nas cotações de milho, farelo de soja e outros insumos pressionam o custo de produção e encarecem o alimento que precisa ser uma alternativa mais barata. Resultado: desde a chegada do coronavírus no país, o ovo bate recordes de preços.
Quando a população correu para os supermercados no início da pandemia, Bastos (SP), que concentra a maior parte da produção nacional, vendia a caixa de 30 dúzias do ovo branco tipo extra a R$ 116,84. A do vermelho, a R$ 137,36. Os valores já eram recordes na série do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), descontada a inflação.
Em fevereiro deste ano, ovos brancos e vermelhos atingiram, respectivamente, o valor de R$ 122,85 e R$ 144,90. Em 1º de março, o branco superou novamente o recorde (descontada a inflação): R$ 130,83.
Segunda a Abras (Associação Brasileira de Supermercados), nas prateleiras, a maior alta da dúzia de ovos foi em abril do ano passado, quando atingiu R$ 9,45. Em janeiro deste ano, saía por R$ 9,15.
"Para o produtor, a alta não significa que o setor está bem, o cenário é desfavorável", diz Juliana Ferraz, analista de mercado pecuário do Cepea.
Segundo ela, o setor é formado por pequenos e médios produtores que sofrem para fechar a conta com alta no valor de insumos atrelados ao dólar.
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"Houve um crescimento exagerado no preço das rações, e tudo foi ficando mais caro: enzimas, vitaminas, minerais", diz Sergio Kakimoto, proprietário de uma granja de médio porte em Bastos. Com 650 mil aves, ele usa 80 toneladas de ração por dia. "Tive que reduzir a oferta para ajustar o preço de venda ao custo", diz.
O setor também sofre com o custo de papelão, usado nas embalagens, combustível, e insumos químicos para desinfecção e tratamento de água, afirma Gilson Katayma, diretor comercial do Grupo Katayama, uma das cinco maiores produtoras do país. O grupo conseguiu superar 1 bilhão de ovos produzidos em 2020.
Com o consumo interno forte, o setor começa a olhar para o mercado externo, para onde segue apenas 1% da produção. "Acontece uma evolução na indústria de ovo processado, em pó, líquido, com um olho na exportação", diz Santin.
Para 2021, a previsão de César de Castro Alves, consultor de agronegócio do Itaú BBA, é que o preço da carne não dê alívio. Assim, o setor de ovos segue com margem para crescer. "Mesmo com a pressão de preços, o ovo atravessa a crise com a maior taxa de sucesso entre as proteínas ", diz.
A projeção é que, mesmo com o custo em alta, o setor preserve a preferência. "O produtor terá problemas com o custo do milho e do farelo de soja, mas o ovo segue na mesa."