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Polícia de SP investiga suposta fraude no BB, que segundo vítima chega a meio milhão de reais

Correntista descobriu movimentações atípicas feitas desde 2014 em sua conta bancária, calculando um desvio financeiro de mais de meio milhão de reais

Banco do BrasilBanco do Brasil - Foto: Arquivo/Agência Brasil

A Polícia Civil de São Paulo abriu uma investigação para apurar uma suposta fraude no Banco do Brasil. A família da aposentada Vânia Cerri, de 78 anos, descobriu movimentações atípicas feitas desde 2014 em sua conta bancária, estimando um desvio financeiro de mais de meio milhão de reais.

O CEO do BB Consórcios, braço da empresa para o segmento, Marcel Kitamura, prestou depoimento como testemunha na última quinta-feira no âmbito do processo cível — um inquérito criminal também tramita.

Na diretoria da empresa desde 2006 e ouvidor externo do banco até 2022, ele foi mantido em cópia nos e-mails trocados entre a gerente geral da ouvidoria, Joice Folgati, com familiares da correntista sobre o assunto. A gerente da agência da correntista Adriana Yuke também consta no rol de testemunhas.

A família alega que foi feita na conta da idosa uma série de empréstimos consignados, contratações de consórcios, saques e movimentações financeiras sem o consentimento da correntista. Com dois acidentes vasculares cerebrais (AVC) nos últimos oito anos e diagnóstico de Parkinson, Vânia não anda sozinha, alimenta-se por aparelhos e é considerada incapaz desde 2020.

Uma das provas reunidas pela defesa, no processo ao qual O GLOBO teve acesso, é uma inconsistência nos extratos bancários e na grafia das assinaturas de Vânia para a efetivação dessas operações, o que apontaria para uma falsificação. Outro ponto são as movimentações ocorridas na conta fora do horário de expediente do banco e até numa data em que a aposentada estava hospitalizada, em 25 de julho de 2019, de acordo com a família.

As movimentações deixaram um rombo na conta que derrubou a avaliação de crédito da correntista e levou a um endividamento junto ao banco cujo montante a família desconhece, segundo os advogados.

Com isso, a categoria do plano de saúde da Vânia — do qual ela depende para seu tratamento — sofreu um rebaixamento pelos prejuízos que teria auferido em razão das fraudes, além dos cartões bloqueados e limites de crédito cancelados. Seu nome chegou a ser negativado no Serasa, plataforma referência na análise de crédito.
 

Uma perícia contratada pela família calculou um rombo de R$ 579,9 mil entre 2015 e 2020, mas a família diz acreditar que o valor ultrapassa R$ 2 milhões, já que o levantamento se limitou a extratos conseguidos pelos técnicos — existe uma suspeita de que esse tipo de operação começou a ser feito muito antes. Há, por exemplo, registros de três consórcios firmados em 2010 e 2011 no valor total de R$ 76,7 mil que não entraram no cômputo.

Entre as suspeitas da família está a de que as movimentações dizem respeito a negócios que a aposentada não faria. Com limitações de mobilidade, Vânia tem em seu nome firmados consórcios de motocicletas e quadriciclos, por exemplo. Foram ao menos 17 consórcios somando cerca de R$ 655 mil.

O Banco do Brasil vem se negando a fornecer os contratos supostamente assinados pela aposentada que podem comprovar uma fraude ainda maior. No fim de novembro, a promotora de Justiça Ingrid Maria Bertolino Braido, da 16ª Vara Criminal do Foro Central da Capital, se manifestou favoravelmente ao envio de um ofício ao banco determinando a entrega dos documentos.

Na ação, a instituição bancária alega que “houve minucioso estudo da ocorrência e verificação das circunstâncias apresentadas pela autora, o que culminou na estipulação do valor que atende à cobertura patrimonial que foi pleiteada nas mensagens eletrônicas juntadas aos autos”, em referência ao depósito que o banco fez na conta de Vânia no valor de R$ 343,3 mil como estorno do rombo.

“O réu já realizou o atendimento ao pedido da autora, com o pagamento de valor expressivo, que contempla as quantias pertinentes às operações contestadas, bem como a correção e juros atrelados, o que demonstra a ausência de necessidade de se recorrer ao Judiciário, para buscar ressarcimento já assegurado extrajudicialmente”, diz o Banco do Brasil.

Os advogados dizem, no entanto, que o depósito, chamado de acordo extrajudicial pela empresa, nunca foi combinado com a cliente. A versão é compartilhada por um dos próprios gerentes do banco, que ajudou a mediar o caso. Em um depoimento à Polícia Civil anexado ao processo, ele afirma que a família da cliente contestou os valores de ressarcimento e não aceitou a proposta feita pelo banco, "porém, o Banco do Brasil creditou o valor apurado na conta de Vânia".

— É um caso clássico de fraude cometida contra uma pessoa vulnerável e hipossuficiente a relação de consumo. À revelia da dona Vânia, contrataram-se consórcios, e (em seguida) eram adquiridos empréstimos consignados. O único agente arrecadador era o próprio banco, na medida em que lucrava com juros impostos de operações financeiras e os benefícios desses empréstimos — diz o advogado de Vânia, Jorge Abduch.

Procurado, o Banco do Brasil diz que Kitamura e Joice compareceram à audiência na quinta-feira passada por atuarem na ouvidoria da empresa na época em que a reclamação foi efetuada, e que “convém destacar que eles foram indicados como testemunhas em juízo pela própria cliente, para contribuir no esclarecimento do caso”.

“O Banco do Brasil pauta sua política de relacionamento pelos princípios da transparência, legalidade e ética. Oferecemos produtos e serviços adequados às necessidades, aos interesses e aos objetivos de clientes e usuários de cada segmento de mercado. Além disso, oferecemos orientações e informações claras, confiáveis e oportunas, explicitando, inclusive, direitos e deveres, responsabilidades, custos ou ônus, penalidades e eventuais riscos existentes na execução de operações e na prestação de serviços para permitir aos clientes a melhor decisão nos negócios, considerando o seu grau de vulnerabilidade, perfil e comportamento de consumo. Sobre o caso específico, por conta de processo judicial em andamento, o BB resguarda seu direito de se manifestar em juízo”, diz a instituição em nota.

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