Prates defende "cautela" no pagamento de dividendos, e ações da Petrobras sofrem forte queda
Presidente da estatal disse em entrevista que 'acionistas vão entender' necessidade da empresa de reforçar investimentos em transição energética
O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, defendeu, em entrevista à agência Bloomberg, que a petroleira deve ser mais cautelosa em relação à distribuição de dividendos bilionários à medida em que busca se tornar uma potência em energia renovável, mobilizando mais recursos para investimentos.
— Precisamos ser cautelosos. Os acionistas vão entender — disse Prates no escritório da Bloomberg, em São Paulo, quando perguntado sobre um eventual pagamento extraordinário de dividendos. — Eu seria mais conservador do que agressivo. Estamos no meio dessa grande decisão de nos tornarmos uma empresa de petróleo em transição.
A declaração desagradou o mercado, e as ações da Petrobras sofrem forte queda na Bolsa. Os papéis chegaram a cair 3,8% na mínima durante a tarde, segundo a Bloomberg.
A Petrobras foi a segunda maior pagadora de dividendos no setor de petróleo em 2022, atrás apenas da Saudi Aramco, mas tem reduzido essa política desde que teve sua gestão trocada com a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, no início de 2023.
Analistas de mercado veem espaço para que a Petrobras recompense os investidores com bilhões de dólares em dividendos extraordinários, a serem anunciados quando a empresa divulgar seus lucros em 7 de março. Os do Citi, por exemplo, vêem espaço para até US$ 7 bilhões, enquanto o Goldman Sachs Group prevê até US$ 8 bilhões. Mas Prates deu um sinal no sentido contrário com sua defesa de mais investimentos na transição energética.
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Em dez anos cerca de metade da receita da Petrobras virá de fontes eólicas, solares e de combustíveis renováveis, previu Prates, que afirmou que a estatal está se preparando para fazer aquisições já neste ano para impulsionar essa mudança.
A petroleira brasileira também precisa gastar muito em investimentos na exploração no país e no exterior para garantir que mantenha o nível de produção de petróleo bruto por décadas, afirmou Prates, indicando que prefere reduzir o pagamento de dividendos para ampliar investimentos.
A determinação da Petrobras em avançar para a energia limpa contrasta com a de alguns de seus pares internacionais. Os pesos pesados europeus Shell Plc e BP Plc se afastaram das energias renováveis para se concentrarem mais nos combustíveis fósseis. As grandes petrolíferas norte-americanas Chevron Corp. e Exxon Mobil Corp. nunca fizeram da energia eólica e solar uma prioridade e concentraram seus planos de negócios em petróleo e gás.
Prates, de 55 anos, que assumiu o comando da Petrobras em janeiro de 2023, descartou a possibilidade de fazer “mudanças drásticas” na estratégia. No entanto, disse, a empresa precisa estar preparada para oportunidades de aquisição em energias renováveis e petróleo, bem como investimentos em petroquímica e produção de fertilizantes.
A Petrobras está pensando em investir em projetos eólicos e solares em terra firme no Brasil antes de passar para a energia eólica offshore, e está ampliando o combustível à base vegetal para a aviação e o transporte marítimo, dois dos setores mais difíceis de descarbonizar.
Prates disse que o Brasil tem melhores condições para projetos eólicos offshore do que os EUA ou os países do Mar do Norte, e que o desenvolvimento do setor no Brasil proporcionará uma nova linha de negócios para os mesmos tipos de prestadores de serviços que o país utiliza para projetos de petróleo. Uma de suas principais preocupações é que o Brasil não terá fornecedores suficientes para seus projetos de petróleo à medida que o mundo começar a se afastar dos hidrocarbonetos.
— A coisa mais assustadora que vejo em 10 anos é uma crise com fornecedores — disse Prates.
Como resultado, a Petrobras está conversando com o governo sobre uma política industrial para apoiar fornecedores de equipamentos e estaleiros no Brasil. Ela também está identificando maneiras de obter bens e serviços importantes de países vizinhos e aliados geopolíticos.
Um dos principais pilares da política econômica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um amplo plano de reindustrialização que fornecerá crédito e financiamento a setores como saúde, defesa e agronegócio, além de iniciativas para promover uma transição verde no Brasil.
Prates disse que a Petrobras, como uma empresa de controle estatal, precisa participar das decisões de política energética com o governo. Mas essa coordenação não significa que o governo esteja interferindo na estratégia de negócios da empresa, disse ele.
— Considero isso mais como um prêmio do que como um fardo — disse Prates. — Quem é o outro CEO no Brasil que pode estar com o presidente da República a cada 15 dias? Isso resolve uma série de problemas.
A Petrobras também está em negociações com a Mubadala Capital, o braço de investimentos do fundo soberano de Abu Dhabi, para se tornar sócia de uma refinaria que a estatal vendeu na gestão anterior.
Os dois lados podem chegar a um acordo até o final do ano, disse Prates. Ele acrescentou que as refinarias da Petrobras não foram projetadas para competir umas com as outras e que a unidade vem enfrentando dificuldades desde que foi vendida.
A Mubadala Capital está expandindo a refinaria de Mataripe, no estado da Bahia, no nordeste do país, para produzir combustíveis renováveis, um projeto que interessa à Petrobras. Prates disse que a empresa não necessariamente operaria a refinaria, e que ela poderia ser dividida em algumas empresas separadas.
— Gostaríamos de participar disso. Eles nos convidaram — disse Prates. — Seremos capazes de reincorporar a refinaria ao sistema.