Programas, planos e promessas de Bolsonaro para o ano eleitoral já chegam a R$ 90 bilhões
Apetite por gastos em 2022 dificulta encaixar tudo no Orçamento de 2022, mesmo com a PEC dos Precatórios. Se todas as ideias saírem do papel, ao menos R$ 75 bi em novas despesas serão criadas
Entre projetos, programas, planos e promessas, o presidente Jair Bolsonaro vem desenhando uma espécie de pacote de bondades, com medidas de apelo popular que significarão mais gasto público em 2022, quando pretende concorrer à reeleição.
As ideias aventadas vão de reajuste para servidores a um vale-gás e já somam R$ 90 bilhões, com pelo menos R$ 75 bilhões em estimativas de novas despesas para o próximo ano.
Com as pressões por mais gastos no ano eleitoral, os planos dificultam fechar as contas do Orçamento de 2022, mesmo se a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios for aprovada no Senado para abrir um espaço fiscal de mais de R$ 90 bilhões.
Com a queda de sua popularidade, Bolsonaro passou a investir em temas que possam render dividendos eleitorais. Um deles é um auxílio mensal de R$ 400 para caminhoneiros (uma das bases do bolsonarismo) até o fim de 2022, com custo de R$ 4 bilhões. Seria uma forma de compensar a escalada do preço do diesel.
Os combustíveis são uma dor de cabeça do presidente. O governo já citou a ideia de criar um vale-gás de cozinha para famílias carentes. O custo é estimado em R$ 6 bilhões.
Bolsonaro prometeu um reajuste para todos os servidores federais se a PEC for aprovada. Não citou números, mas, nas últimas semanas, o Executivo vinha discutindo um aumento linear de 5%, o que custaria R$ 15 bilhões em 2022. A ideia gerou resistências no Congresso.
O governo já anunciou o Auxílio Brasil de no mínimo R$ 400 ao longo de 2022. É custo adicional de cerca de R$ 50 bilhões na comparação com o orçamento do Bolsa Família, substituído pelo novo programa que Bolsonaro quer transformar em vitrine eleitoral.
Não há dúvidas sobre o impacto social de um programa de transferência de renda mais robusto, mas o valor temporário é alvo de críticas de que se trata apenas de uma arma eleitoral.
Somados, esses planos chegam a R$ 75 bilhões. Além disso, a tendência é que, no ano eleitoral, aumentem as pressões de parlamentares e ministros por mais obras públicas, liberações de emendas parlamentares e alguma solução para conter a alta no preço da gasolina, outra ideia aventada no governo que pode terminar na conta do Tesouro.
Além de gastos públicos, o governo ainda autorizou que o setor elétrico contrate empréstimo de R$ 15 bilhões para evitar um tarifaço de mais de 21% nas contas de luz em 2022. Nesse caso, o dinheiro não sai do Orçamento, mas a conta virá para o consumidor nos anos seguintes. Na prática, a alta será apenas adiada.
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O Ministério da Economia deve divulgar amanhã novo cálculo do espaço fiscal que espera ser aberto pela PEC dos Precatórios por conta da revisão das expectativas para a inflação. A folga deve subir dos R$ 91,6 bilhões estimados pelo governo até agora para R$ 115 bilhões.
Mas boa parte desse dinheiro tem destino certo. É preciso ampliar a previsão com uma série de gastos obrigatórios, como saúde, educação e aposentadorias. Ou seja, a conta não fecha, porque só sobrariam cerca de R$ 10 bilhões para todos os gastos extras desejados por Bolsonaro, exceto o Auxílio Brasil.
Até pela dificuldade de fazer tudo caber no Orçamento, parte destes números são expectativas ou meros exercícios. Para o cientista político Carlos Pereira, professor da FGV, Bolsonaro recorre à irresponsabilidade fiscal pensando na eleição, mas isso poderá lhe tirar votos em 2022: "Presidentes mal avaliados buscam competitividade em medidas populistas que agradem extratos eleitorais. Mas os resultados são duvidosos. Mesmo o auxílio emergencial concedido por causa da pandemia mostrou que há limites. O tiro pode sair pela culatra".
Com o impasse orçamentário, políticos já falam em enxugar a lista de desejos de Bolsonaro. Um Auxílio Brasil de R$ 400, por exemplo, poderia dispensar o vale-gás.
"Ao que parece, o espaço da PEC não será suficiente para todas as despesas que o governo pretende", diz Daniel Couri, diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI).
Para Carlos Kawall, diretor da ASA Investments e ex-secretário do Tesouro, Bolsonaro pratica “populismo fiscal” por interesse eleitoral: "Essa agudização do populismo fiscal teve como gatilho a piora da inflação, que por sua vez piorou a popularidade do presidente, como tradicionalmente ocorre. Ficou clara a rendição do Ministério da Economia à pauta populista".
Assim como ocorreu em outras pautas econômicas, o governo enfrenta dificuldades para aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios no Senado. As discordâncias de senadores em relação ao texto aprovado na Câmara mobilizam Planalto e equipe econômica em negociações.
A resistência vem principalmente de senadores que não querem facilitar bandeiras eleitorais que Jair Bolsonaro possa empunhar em busca da reeleição em 2022. A PEC altera regras para o pagamento de dívidas judiciais da União e o cálculo do teto de gastos para abrir espaço fiscal de mais de R$ 90 bilhões no Orçamento do ano eleitoral.
O desconforto ficou mais evidente quando Bolsonaro sugeriu usar parte do dinheiro num reajuste para servidores.
"O presidente está querendo fazer muita coisa com esse dinheiro, né?", diz o senador Omar Aziz (PSD-AM), destacando, porém, que todos são favoráveis ao Auxílio Brasil.
Levantamento do GLOBO mostrou que o governo não tem votos suficientes no Senado para aprovar a PEC sem alterações. Dos 81 senadores em exercício procurados pela reportagem, ao menos 34 disseram que não apoiam o texto que veio da Câmara.
Diante da resistência, desde o início o governo esteve aberto às negociações e já admitia que o texto voltasse para a Câmara. Após uma série de reuniões, senadores estudam agora o fatiamento da PEC para evitar isso.
Na negociação, senadores também insistem em uma forma de tornar o Auxílio Brasil de R$ 400 permanente. A previsão atual limitada ao fim de 2022, seria para eles uma evidência da motivação eleitoral.
"É uma proposta eleitoreira e que teve um adicional inesperado e esperto, o aumento do funcionalismo público", afirma o senador Lasier Martins (Podemos-RS).