Renovação do auxílio pode dar novo fôlego a Bolsonaro, avalia Samuel Pessôa
Na avaliação de Pessôa, há um embate entre pautas estruturais, como o teto de gastos, e conjunturais, como o auxílio emergencial, no Congresso
A possibilidade de renovação do auxílio emergencial diante do recrudescimento da pandemia no Brasil pode dar novo fôlego ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), cuja popularidade está em trajetória de queda. A avaliação é do economista e colunista da Folha de S.Paulo Samuel Pessôa, que participou nesta quinta (28) de debate virtual promovido pela Folha e Ibre (Instituto Brasileiro de Economia), da Fundação Getulio Vargas.
Além de Pessôa, participaram do evento o também colunista da Folha e professor de Ciência Política da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) Marcus André Melo e o cientista político e professor da FGV/Ebape Carlos Pereira. A mediação foi realizada pelo repórter especial da Folha Fernando Canzian.
"Com a segunda onda do coronavírus, o presidente terá um tempo maior. Tem que renovar de alguma maneira o auxílio emergencial e isso atende ao Bolsonaro, o que dá fôlego para ele chegar no ano que vem e ser reeleito", disse o economista.
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Na avaliação de Pessoa, há um embate entre pautas estruturais, como o teto de gastos, e conjunturais, como o auxílio emergencial, no Congresso. A priorização da segunda agenda, em detrimento da primeira, também beneficia o presidente, afirma.
"Na agenda da economia, o país vive em conflito distributivo, que ocorre prioritariamente na discussão do Orçamento de como arrecada e como gasta. Apesar de a pandemia piorar a situação do país como um todo, ela deu tempo para Bolsonaro. Ele não mostrou nesse período vontade de liderar as reformas que são necessárias", afirma.
Com relação à eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, prevista para esta segunda (1º), os debatedores divergiram quanto ao impacto de uma vitória do candidato apoiado pelo presidente, o deputado Arthur Lira (PP-AL).
Segundo Carlos Pereira, a discussão passa pela avaliação da maturidade do Congresso. "Ter esse alinhamento não necessariamente vai arrefecer a relação entre Executivo e Legislativo. A democracia brasileira não estaria potencialmente em risco", avalia.
Marcus Melo, por sua vez, destaca a postura favorável à agenda de reformas do Planalto tanto de Lira quanto de Baleia Rossi (MDB-SP), principal adversário na disputa pelo cargo. "O Congresso, hoje em dia, é claramente pró-reformas. O Baleia Rossi, inclusive, é autor da reforma tributária. Ambos os candidatos já aderiram a essa pauta", afirma.
Na avaliação de Melo, pautas conservadoras deverão ficar de fora da agenda dos parlamentares dado que na conjuntura atual questões materiais ganham maior urgência. "Quem estará preocupado na opinião pública com questões morais conservadoras em um cenário de perdas de renda? Essas questões saem da agenda pública. Pelo menos neste ano, teremos uma agenda fundamentalmente centrada na emergência", avalia.
Já Pereira afirma que, independentemente de Lira assumir o comando da Câmara, Bolsonaro terá que investir na comunicação direta com a sua base, cultivando para isso uma agenda de costumes. "A pauta conservadora vai entrar firme para compensar o desgaste com o núcleo duro pelo apoio do presidente ao Centrão. O presidente vai verbalizar isso como uma forma de conexão com essa agenda", afirma.
Por outro lado, os debatedores concordam que a postura de Bolsonaro com relação à sucessão no Congresso sinaliza uma mudança do presidente no sentido de maior alinhamento com a política tradicional. "Houve aprendizado e Bolsonaro percebe que governar sem figuras-chaves no Legislativo torna o processo de governabilidade mais complicado. O governo se profissionaliza e toma uma decisão importante para conseguir governar e sobreviver. Houve custo de popularidade, animosidade, discussão sobre impeachment. Essa mudança é uma vitória para o presidencialismo multipartidário", afirmou Pereira.
Segundo ele, o governo tem mais vantagens a oferecer a parlamentares na disputa ao comando da Câmara do que Rodrigo Maia.
"Maia é um pato manco do Legislativo, não tem o que ofertar para os parlamentares que estejam na candidatura de Baleia Rossi. O governo tem emendas parlamentares e cargos para oferecer, o que faz Baleia Rossi partir em situação de tremenda desvantagem", avalia.
De acordo com Marcus Melo, a postura de Bolsonaro pode ser dividida em duas fases– a primeira é a de um presidente mais próximo à eleição, quando rejeitava a chamada política tradicional, e a segunda, a partir de abril de 2020, quando deu início a uma busca por base de sustentação parlamentar.
"O Bolsonaro candidato marcou o primeiro ano de governo. Houve muito conflito, sobretudo pela cacofonia de ministros, como o Abraham Weintraub, na Educação, discussões sobre a Amazônia, mas nesse ínterim houve o divisor de águas que foi a aprovação da reforma da Previdência. No segundo momento, o Bolsonaro se aproxima do Centrão", disse.