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Decisão

STF suspende taxação de doações e heranças no exterior, mas não permite restituição

A decisão contempla apenas os contribuintes que entraram na Justiça contra 22 estados

STFSTF - Foto: Agência Brasil

Mais de 80% dos estados possuem leis prevendo a cobrança de imposto sobre doações e heranças no exterior. São 22 legislações estaduais com dispositivos que foram consideradas em desacordo com a Constituição no julgamento que terminou no final de fevereiro no STF (Supremo Tribunal Federal).

A decisão, no entanto, contempla apenas os contribuintes que entraram na Justiça contra esses estados, que não terão mais de pagar o tributo.

Já as pessoas que recolheram o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos) não poderão pedir restituição dos valores.

Para o estado de São Paulo, por exemplo, essas operações envolvem R$ 2,7 bilhões em ações de cobrança em discussão (que agora não poderão ser mais arrecadados).

A maior parte do dinheiro se refere a 30 ações de um mesmo contribuinte que já realizou operações que somam quase R$ 50 bilhões em doações e poderiam gerar cerca de R$ 2 bilhões em impostos (o equivalente a um ano de ITCMD), mas cuja cobrança está agora afastada pelo Supremo.

A decisão do STF, no entanto, desobriga o estado de restituir quase R$ 500 milhões em impostos que foram pagos nos últimos anos, segundo dados da Procuradoria-Geral do estado divulgados em 2020.

 



Há ainda uma dúvida sobre o que acontece com os contribuintes diante de um fato gerador até que o acórdão da decisão do Supremo seja publicado. No caso de morte, por exemplo, o fato gerador é a data do falecimento.

A tese em julgamento era se os estados têm competência para exigir o tributo no exterior. A cobrança do imposto está prevista na Constituição, mas a Carta Magna prevê que a questão seja regulamentada por meio de lei complementar federal, algo que nunca foi feito.

Cinco estados não faziam a cobrança: Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte, Roraima e Sergipe, segundo dois levantamentos, realizados pelos escritórios Candido Martins Advogados e Mattos Filho.

O STF formou maioria reconhecendo que os estados não podem exigir ITCMD nessas operações enquanto não houver a lei federal. Em relação aos fatos anteriores a essa decisão, a maioria decidiu por preservar o direito apenas de quem discutiu a questão em juízo, ressalvando ações judiciais pendentes de conclusão nas quais se discuta para qual estado o contribuinte deve pagar e a validade do imposto, não tendo sido pago anteriormente.

"O Supremo não ressalvou quem pagou. Qual a minha crítica: a mensagem do Supremo é motivando o contencioso. Na dúvida, vá a juízo discutir. Aquele contribuinte que não quis discutir, efetuou o pagamento e desafogou o Judiciário de mais uma ação é aquele que mais uma vez está sendo penalizado. Não vai ter o direito de discutir a devolução desses valores", afirma Tatiana Chiaradia, do escritório Candido Martins Advogados.

"Se o imposto é devido, todos têm de pagar. Se é indevido, ninguém tem de pagar. Não é porque alguém pagou e o estado fez caixa com esse dinheiro indevidamente que a pessoa não pode ter o direito de ter a devolução desse valor."


Alessandro Fonseca, sócio da prática de Gestão Patrimonial do escritório Mattos Filho, afirma que ainda é necessário aguardar a publicação do acórdão para avaliar se há possibilidade de questionamento em cima dessa modulação.

Fonseca também avalia que a decisão cria uma injustiça com aqueles que seguiram a lei desses estados e não discutiram judicialmente a cobrança em desacordo com a Constituição. "Esse contribuinte provavelmente não vai conseguir recuperar", afirma.

Ele diz que ainda não há segurança jurídica no caso de heranças recebidas em caso de morte até a publicação do acórdão.
"Se alguém tiver uma operação acontecendo antes da publicação, esse contribuinte precisa de uma discussão judicial para conseguir uma medida que afaste a interpretação anterior, pois a decisão do Supremo e o efeito vinculante ainda não existem. A gente ainda tem uma janela de uns 60 dias em que precisamos conseguir algum amparo judicial."

O advogado afirma que o fato de 22 estados de 27 terem essa previsão de cobrança, apesar da falta da lei complementar, demonstra uma ânsia arrecadatória. Diz ainda que São Paulo é o único estado com valores relevantes que deixarão de ser arrecadados.

Tatiana Chiaradia, do Candido Martins Advogados, afirma que a cobrança, além de inconstitucional, envolve conflito de competência internacional. Muitas ações, inclusive aquela que foi julgada pelo STF e terá efeito sobre todas as outras no país, são de pessoas que já pagaram o tributo, mas em outro país.

Ela afirma que as normas internacionais orientam que o país competente para tributar questões de doações, sucessão e herança é aquele onde está domiciliada a pessoa que morreu ou o doador, ou seja, a pessoa que motivou o ato. As leis estaduais, no entanto, previam a cobrança com base no local de residência do beneficiário.

"O Congresso, na hora em que for fazer essa lei complementar, vai ter de trabalhar com essas orientações internacionais para não gerar novos conflitos, inclusive de bitributação. Você não pode permitir a cobrança do tributo nas duas pontas", afirma Chiaradia.

A advogada também afirma que os Fiscos estaduais têm considerado que muitas dessas operações têm como único objetivo fugir da tributação no Brasil, mas que esses casos são exceções e que, mesmo nas ações envolvendo grandes contribuintes, as operações foram feitas dentro das leis.

Fonseca também faz essa avaliação. "Se a pessoa quiser doar em vida, para precificar nesse momento o valor de mercado, é absolutamente legítimo."

Em nota, a Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo disse que acompanha com especial atenção o desfecho do julgamento e que os reflexos financeiros da decisão são muito negativos para o erário paulista e demais estados.

"Deve-se ainda ter em conta que os efeitos da modulação empreendida por parcela do colegiado agravará a sensação de injustiça fiscal, o que é bastante negativo para o sistema tributário como um todo", afirma a PGE.


"A decisão, ao exigir lei complementar federal que nunca foi editada, acaba inadvertidamente limitando a competência dos estados para tributar pelo ITCMD bens no exterior, herdados ou recebidos em doação por pessoas domiciliadas no Brasil."

 

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