Tesla, de Elon Musk, é uma das poucas montadoras poupadas das tarifas de Trump
Empresa de carro elétrico tem fábricas na Califórnia e no Texas e, para alguns veículos, até 70% dos componentes têm produção local, padrão atípico para o setor
As tarifas planejadas por Donald Trump sobre importações de automóveis prejudicarão montadoras em todo o mundo e aumentarão os preços para os consumidores nos Estados Unidos. Entre os muitos perdedores, um vencedor se destaca: a Tesla, de Elon Musk. Os mercados já reagiram à medida. As ações de montadoras americanas, europeias e japonesas desabam nesta quinta-feira.
A fabricante de veículos elétricos possui grandes fábricas na Califórnia e no Texas que produzem todos os carros que vende nos EUA, protegendo-a em grande parte das novas tarifas de Trump sobre importações de automóveis e componentes essenciais. Enquanto isso, grandes concorrentes como a sul-coreana Hyundai, a alemã Volkswagen e a americana General Motors enfrentarão custos significativamente mais altos.
— São muito poucos os vencedores — disse Sam Fiorani, vice-presidente de previsão global de veículos da AutoForecast Solutions, em entrevista por telefone. — Os consumidores sairão perdendo, pois terão menos opções e preços mais altos.
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A Tesla é a “menos exposta” às novas tarifas devido às suas operações de fabricação doméstica, escreveu o analista Garrett Nelson, da CFRA Research, em uma análise esta semana. A própria Tesla tem destacado essa vantagem, publicando no X que seus modelos “são os carros mais americanos já fabricados.”
A Ford também pode ser menos impactada que alguns concorrentes, já que cerca de 80% dos carros que vende nos EUA são produzidos no país.
Tarifas de 25% e impacto no setor
A partir da próxima semana, as novas tarifas de 25% se aplicarão a todos os veículos de passageiros e caminhões leves importados, bem como a componentes essenciais como motores, transmissões e peças elétricas, além de quaisquer tarifas já vigentes. As tarifas afetarão apenas a parcela não americana de veículos e peças importadas sob o acordo de livre comércio com Canadá e México.
Isso pode amenizar o impacto para veículos cujas cadeias de suprimentos se estendem pelo continente. Além disso, as tarifas sobre peças do Canadá e do México que atendam ao acordo comercial não entrarão em vigor até que os EUA estabeleçam um processo para cobrá-las. Os países vizinhos podem tentar negociar uma exceção antes da implementação total, embora as chances sejam baixas.
Mesmo assim, a medida representa um ataque ao acordo de livre comércio do continente, renegociado por Trump em seu primeiro mandato, que consolidou uma cadeia de suprimentos integrada na América do Norte. O primeiro-ministro canadense, Mark Carney, classificou as tarifas como um “ataque direto.”
Marcas estrangeiras sob pressão
As montadoras estrangeiras que dependem fortemente de veículos importados serão as mais impactadas. A Hyundai, por exemplo, pode ser uma das mais prejudicadas. Apesar de possuir fábricas no Alabama e na Geórgia e ter anunciado um plano de expansão de US$ 21 bilhões nos EUA esta semana, a montadora e sua afiliada Kia importaram mais de um milhão de veículos para os EUA no ano passado, representando mais da metade de suas vendas no país, segundo dados da Global Data.
A Hyundai afirmou estar comprometida com o crescimento da indústria automotiva dos Estados Unidos por meio da produção local e da inovação. A empresa emprega cerca de 570.000 pessoas no país.
Segundo Hyuk Jin Yoon, analista da SK Securities, com sede em Seul, a Hyundai e a Kia podem ter que pagar até 10 trilhões de wons (US$ 7 bilhões) por ano em tarifas aos EUA se a alíquota de 25% for aplicada, o que representa quase 40% do lucro operacional total das montadoras em 2024.
Mesmo com quatro fábricas de montagem em Kentucky, Indiana, Mississippi e Texas, além de fábricas de motores na Virgínia Ocidental e no Alabama, a Toyota ainda importa cerca de metade dos veículos que vende nos EUA. A montadora afirmou que suas operações no México estão 100% em conformidade com o Acordo Estados Unidos-México-Canadá (USMCA).
De acordo com analistas do Goldman Sachs Japan, as tarifas podem reduzir em 6% o lucro operacional estimado da Toyota para o ano fiscal de 2026.
A Nissan, que já enfrenta dificuldades, pode ser a mais atingida entre as montadoras japonesas, com uma possível redução de 56% em seu lucro operacional. A Subaru está analisando formas de minimizar o impacto das tarifas, mas ainda não divulgou medidas concretas. Segundo o Goldman Sachs, a Subaru pode ter uma queda de 23% no lucro operacional de 2026.
Impacto em montadoras dos EUA
As montadoras de Detroit também não foram poupadas. A GM importa algumas picapes Chevrolet Silverado do México e do Canadá, além do SUV compacto Chevy Trax da Coreia do Sul e do Chevrolet Equinox, um dos carros mais acessíveis da marca. Em 2024, a GM vendeu mais de 200.000 unidades tanto do Equinox quanto do Trax. A montadora também fabrica versões elétricas do Equinox e do Blazer no México.
A Stellantis produz os SUVs Jeep Compass e Wagoneer S no México, além das minivans Chrysler Pacifica no Canadá e dos modelos compactos Dodge Hornet e Fiat 500 na Itália.
Mesmo a Ford, que tem uma produção mais concentrada nos EUA em comparação com suas rivais, enfrentará dificuldades. A montadora fabrica a picape Maverick, o SUV Bronco Sport e o Mustang Mach-E elétrico no México.
Tesla também será impactada
Musk reconheceu que a Tesla não sairá totalmente ilesa. Em uma publicação no X na quarta-feira, ele afirmou que as tarifas terão um impacto “significativo” na empresa. Em outra postagem, acrescentou que os preços das peças importadas usadas pela Tesla sofrerão um impacto “não trivial.”
"Para deixar claro, isso afetará o preço das peças dos carros da Tesla que vêm de outros países. O impacto no custo não é trivial", escreveu no X o dono da fabricante de veículos elétricos.
Entre 60% e 75% dos componentes da Tesla são fabricados nos EUA, dependendo do modelo, segundo um documento de 2024 da Administração Nacional de Segurança no Tráfego Rodoviário dos EUA. A maior parte dos componentes restantes vem do México. No entanto, o valor total das peças importadas não foi especificado, tornando incerto o impacto financeiro das tarifas sobre a Tesla.
Trump insistiu que não há conflito de interesses, apesar do papel proeminente de Musk em seu governo.
“Ele nunca me pediu nenhum favor comercial”, disse Trump durante um evento no Salão Oval na quarta-feira, ao assinar o decreto impondo as tarifas automotivas.