Trump alerta sobre 'transtorno' tarifário enquanto promove planos comerciais
Presidente dos EUA reconheceu aos americanos que pode haver um "período de ajuste" à medida que suas tarifas entram em vigor
O presidente dos EUA, Donald Trump, subiu ao púlpito para seu primeiro discurso ao Congresso, na noite de terça-feira, cercado por sinais de alerta sobre a economia do país, e reconheceu aos americanos que pode haver um “período de ajuste” à medida que suas tarifas entram em vigor.
Ele descreveu a dor econômica que se espera que a política tarifária cause, na forma de preços mais altos, como um “pequeno transtorno” que a nação deveria ser capaz de superar, acrescentando que o país está recuperando seu ímpeto.
— As tarifas são sobre tornar a América rica novamente e tornar a América grande novamente. E está acontecendo, e acontecerá rapidamente — disse Trump no discurso presidencial mais longo já feito a uma sessão conjunta do Congresso. — Haverá um pequeno transtorno, mas estamos bem com isso. Não será muito.
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O discurso de Trump ocorre em um momento crucial. Os dados mostram novas pressões sobre a economia, com a estagnação da atividade industrial, a inflação em alta, a queda da confiança do consumidor e o desempenho abaixo do esperado das ações americanas em comparação com os mercados de outros países.
As ações oscilaram fortemente na terça-feira após as mais recentes medidas tarifárias de Trump contra os maiores parceiros comerciais dos EUA, com o índice S&P 500 fechando no nível mais baixo desde antes da eleição do presidente no ano passado.
O secretário de Comércio, Howard Lutnick, sugeriu que o governo pode anunciar já nesta quarta-feira um alívio tarifário sobre bens do México e do Canadá — dois dos países afetados — que estão cobertos por um acordo de livre comércio.
Mas Trump usou o discurso para defender sua iniciativa de reformular a maior economia do mundo por meio dos maiores aumentos tarifários em um século, dizendo que isso geraria “trilhões e trilhões” em receita e reequilibraria relações comerciais que ele considerava injustas, além de anunciar novos projetos, incluindo um novo gasoduto de gás natural e esforços para aumentar a produção de minerais críticos e terras raras, que, segundo ele, fortalecerão as indústrias nacionais.
Ele destacou o gasoduto como “um dos maiores do mundo” e afirmou que países como Japão e Coreia do Sul participariam da iniciativa “com investimentos de trilhões de dólares cada”.
Da mesma forma, Trump argumentou que está tomando medidas para lidar com preocupações persistentes dos consumidores — desde os preços dos ovos até os custos de energia — enquanto expande indústrias essenciais. Ele afirmou que seu governo herdou o que chamou de “um pesadelo inflacionário” de seu antecessor, Joe Biden, e que suas políticas já estavam ajudando a economia a se recuperar.
Ainda assim, o discurso de Trump foi marcado tanto por declarações voltadas aos conservadores sociais que apoiaram sua volta à política quanto por protestos de parlamentares democratas que buscavam destacar as consequências das rápidas ações executivas do presidente.
Logo no início de seu discurso, Trump foi repetidamente interrompido pelo deputado democrata Al Green, do Texas. O presidente da Câmara, Mike Johnson, pediu que Green, que já havia defendido o impeachment de Trump, mantivesse a ordem e se sentasse. Quando o democrata se recusou, Johnson ordenou que o sargento de armas da Câmara o retirasse do plenário.
— Eu olho para os democratas à minha frente e percebo que não há absolutamente nada que eu possa dizer para deixá-los felizes, ou para fazê-los se levantar ou sorrir — disse Trump.
Mesmo ao destacar sua agenda econômica, Trump exaltou muitas de suas ações em questões culturais que mobilizam sua base. Entre elas, seus esforços para restringir iniciativas de diversidade, equidade e inclusão, uma diretriz para que o governo reconheça apenas dois gêneros, a proibição de homens competirem em esportes femininos — medida direcionada a atletas transgêneros — e sua decisão de renomear o Golfo do México como Golfo da América.
Os convidados da primeira-dama, Melania Trump, incluíram uma ex-jogadora de vôlei do ensino médio que se machucou em uma partida contra uma atleta transgênero e a família de Laken Riley, uma estudante assassinada por um imigrante não documentado.
A deputada da Geórgia Marjorie Taylor Greene, uma das aliadas mais ferrenhas de Trump, usou um boné vermelho com a frase “Trump estava certo sobre tudo”, e o presidente subiu ao palco sob gritos de “EUA!”. Os democratas permaneceram sentados durante o restante do discurso de Trump, e alguns seguravam cartazes com frases como “Musk rouba” — uma referência ao bilionário e conselheiro de Trump, Elon Musk — e “Falso”.
A questão crucial é qual dessas abordagens ressoará mais entre os eleitores e os legisladores que os representam. O presidente discursou apenas algumas horas depois de impor tarifas de 25% sobre os principais parceiros comerciais, Canadá e México, e de dobrar as tarifas sobre a China — a segunda maior economia do mundo — para 20%, medidas que podem agravar as pressões econômicas.
Trump reiterou sua ameaça de impor tarifas de 25% sobre alumínio e aço e de aplicar tarifas recíprocas a todos os países que impõem barreiras às importações americanas, afirmando que os EUA foram “explorados por décadas por quase todos os países do mundo, e não permitiremos que isso continue”:
— Se eles nos tarifam, nós os tarifamos. Se eles nos taxam, nós os taxamos. Se impõem barreiras não monetárias para nos excluir de seus mercados, faremos o mesmo para excluí-los do nosso.
Cancelamento dos subsídios Biden a chips
Trump destacou suas políticas tarifárias como mais eficazes para trazer empregos para os EUA do que os esforços de Biden, que incluíram o Chips and Science Act e seus bilhões em subsídios para impulsionar a fabricação doméstica de semicondutores.
Trump pediu aos legisladores que eliminassem a Chips Act, de US$ 52 bilhões, uma das principais políticas tecnológicas de seu antecessor, e afirmou que não daria mais recursos às fabricantes de chips por meio dessa lei.
Trump citou exemplos recentes de empresas multinacionais de tecnologia, como a japonesa SoftBank e a Taiwan Semiconductor Manufacturing (TSMC), que anunciaram novos investimentos nos EUA. Segundo ele, as empresas já estão vindo para o país sem a necessidade de incentivos bilionários.
— Seu Chips Act é uma coisa horrível, horrível — disse ele ao Congresso. —Damos centenas de bilhões de dólares e isso não significa nada... Não precisamos dar dinheiro a eles.
Separadamente, Trump anunciou planos para criar um escritório de construção naval na Casa Branca. Ele também revelou que conversou com os líderes das três maiores montadoras dos EUA na terça-feira, antes de seu discurso. As montadoras estão particularmente preocupadas com o impacto das tarifas sobre bens do México e do Canadá, que podem elevar os preços até mesmo de veículos montados nos EUA.
Em seu segundo mandato, Trump avançou rapidamente na implementação de suas políticas por meio de uma série de ações executivas que estão remodelando o governo dos EUA e seus laços econômicos e de segurança com o mundo.
Cortes de Musk no governo
Elon Musk, que está liderando um esforço para reduzir a força de trabalho e os gastos do governo federal por meio do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE), estava presente no plenário e recebeu uma ovação de pé dos republicanos.
Essas medidas geraram preocupação em Washington, inclusive entre alguns republicanos, devido ao seu alcance. Os democratas também estão destacando essa iniciativa, com alguns legisladores convidando ex-funcionários públicos que perderam seus empregos.
Trump apresentou uma longa lista de programas e subsídios governamentais que ele classificou como desperdício, e reiterou alegações anteriores — já desmentidas por outros funcionários do governo — sugerindo que a Seguridade Social estava pagando benefícios a pessoas com centenas de anos de idade. Os democratas interromperam o discurso diversas vezes para vaiar essas afirmações.
A aparição de Trump no Congresso também representou uma oportunidade crucial para pressionar os republicanos a avançarem com medidas legislativas. O partido enfrenta desafios sobre como prorrogar cortes de impostos que expiram do primeiro mandato de Trump, aprovar benefícios adicionais prometidos durante a campanha e atender aos apelos do presidente para equilibrar o orçamento.
— Estou pedindo zero impostos sobre gorjetas, zero impostos sobre horas extras e zero impostos sobre os benefícios da Seguridade Social para nossos grandes idosos — disse o presidente americano.