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TRABALHO

Empresas do Japão fazem de tudo para atrair trabalhadores jovens

Em país envelhecido, empresas japonesas apostam em dormitórios subsidiados e em cupons de desconto para reter recém-formados

Empresas também enfrentam batalhaS para reter trabalhadores.Empresas também enfrentam batalhaS para reter trabalhadores. - Ilustração de Maggie Cowles para Bloomberg

Ryosuke Yamamoto está vivendo o sonho. Por cerca de 25 mil ienes por mês (cerca de R$ 977), o rapaz de 25 anos aluga um quarto individual completo com cozinha compacta e banheiro em um dormitório corporativo a 20 minutos de trem de seu escritório no centro de Tóquio.

Nas noites de sexta-feira, ele joga video game com os colegas na área comum do dormitório, e bebe cerveja comprada em uma máquina automática.

Com estacionamento e contas de serviços públicos incluídos no aluguel do dormitório, o jovem tem dinheiro sobrando para partidas regulares de golfe com os amigos.

Em outubro passado, saiu de férias para a Itália.

"É um benefício incrível e me permite gastar dinheiro em outras coisas" conta Yamamoto, contratado pela seguradora Nippon Life em 2022 após se formar em Direito e Ciência Política.

Ele agora trabalha como gerente assistente no departamento de desenvolvimento de recursos humanos.

Em meio à escassez crônica de mão de obra num envelhecido Japão, empresas como a que o rapaz trabalha estão gastando em benefícios para atrair e reter jovens talentos.

A maior seguradora do país construiu o dormitório masculino de 200 quartos em uma área residencial nobre perto da Disneylândia de Tóquio em 2023.

Os funcionários que moram lá pagam menos de um terço do aluguel médio de acomodações semelhantes no bairro.

A empresa também aluga outras propriedades residenciais para fornecer acomodações subsidiadas para funcionárias.

Contratação antes mesmo da formatura
Com uma taxa de natalidade em queda, a população em idade ativa do Japão deve declinar rapidamente a partir de 2027, de acordo com um estudo do instituto de pesquisa Recruit Works.

Até 2040, o país pode enfrentar uma escassez de mais de 11 milhões de trabalhadores.

A população ativa entre 20 e 24 anos caiu 36% nas últimas três décadas, para 4,7 milhões em 2023, de acordo com dados compilados pelo Ministério de Assuntos Internos e Comunicações do Japão.

Com o mercado de trabalho apertado, as empresas estão contratando estudantes universitários meses antes de sua formatura.

Pouco mais de 40% dos que se formaram em março de 2025 tiveram pelo menos uma oferta de emprego um ano inteiro antes de terminarem — a maior porcentagem desde 2016, de acordo com um relatório do Shushoku Mirai Kenkyusho, um instituto de pesquisa.

Depois da "Grande renúncia", a "Grande estagnação de talentos": Empresas relatam falta de candidatos qualificados

As empresas também enfrentam uma batalha para reter trabalhadores.

Historicamente, os funcionários no Japão passavam toda a sua carreira em uma única empresa, mas quase 35% dos universitários que se formaram em 2021 deixaram o primeiro emprego até três anos após serem contratados, segundo dados do Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar.

"O jogo não termina na finalização de uma oferta. Precisamos continuar dizendo aos candidatos o quanto os queremos e o quão atraente é nossa empresa" observa Yuichi Shimada, vice-gerente geral do departamento de desenvolvimento de RH da Nippon Life.

Ele diz que os recém-formados têm de cinco a 10 ofertas e geralmente decidem no último minuto. "Está ficando cada vez mais difícil"

Banheiro privativo e design minimalista
Empresas japonesas há anos oferecem dormitórios corporativos e habitação subsidiada para famílias como benefício.

No entanto, isso diminuiu desde o auge no início dos anos 1990, à medida que as companhias tentaram reduzir custos e minimizar os riscos de desvalorização de investimentos imobiliários em uma economia estagnada.

Quase 42% das empresas ofereciam esse tipo de acomodação em 2022, uma queda em relação a quase 64% em 2004, de acordo com uma pesquisa da Autoridade Nacional de Pessoal, que supervisiona o recrutamento e treinamento do setor público.

Hoje, mais empresas estão considerando expandir essa oferta para ajudar a atrair talentos de regiões remotas do país, segundo uma pesquisa da Mitsubishi UFJ Trust and Banking Corp.

A gigante japonesa de comércio Itochu tinha quatro dormitórios em diferentes localidades antes de inaugurar uma nova instalação na cidade de Yokohama, em 2018, para que todos os jovens funcionários homens pudessem viver sob o mesmo teto.

A acomodação, localizada a apenas 30 minutos de trem da sede da empresa em Tóquio, oferece café da manhã e jantar durante a semana, além de incluir um café, bar e sauna comunitária. A companhia planeja abrir uma residência para funcionárias em 2025, segundo o jornal Yomiuri.

Já a fabricante de componentes eletrônicos TDK concluiu um dormitório na província de Akita, no norte do Japão, em 2023.

Além da acomodação onde vive Yamamoto, a Nippon Life possui outros dois dormitórios construídos na década de 1990, mas características ultrapassadas, como banheiros compartilhados, são agora impopulares entre jovens funcionários que valorizam espaços de vida privados.

Os quartos da nova instalação têm banheiros privativos, incluindo chuveiro, e apresentam um design minimalista e moderno.

"É tão moderno" afirma o jovem. "Adoro ter um espaço pessoal garantido aqui"

Cupons de desconto e empréstimo estudanti
A promessa de acomodações subsidiadas foi um fator importante na decisão dele de ingressar na Nippon Life.

Atrair jovens talentos no Japão é particularmente desafiador, já que apenas 9,4% da população tinha entre 15 e 24 anos em 2022, de acordo com dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Esse número é comparado a 10,4% na Coreia, 11,7% no Reino Unido e 13,3% nos Estados Unidos.

As dificuldades de recrutamento devem se intensificar à medida que a população continua a envelhecer, segundo Rachna Ratra, diretora-gerente da agência de recrutamento Robert Walters em Tóquio.

Para muitas empresas, especialmente pequenas e médias, isso é uma questão de sobrevivência.

Nos seis meses até setembro, o Japão registrou o maior número de falências desde 2013, com 163 das 4.990 empresas falidas citando a falta de mão de obra como motivo para fechar, de acordo com dados da Teikoku Databank.

A concorrência é tão acirrada que algumas empresas estão oferecendo benefícios aos recém-formados antes mesmo de eles iniciarem oficialmente.

A Alsok, uma fornecedora de segurança com sede em Tóquio, oferece cupons de desconto para restaurantes, hotéis e karaokês assim que uma oferta de emprego é feita.

"Enquanto os estudantes recebem várias ofertas de emprego, eles só podem escolher uma" diz Takayuki Ohno, gerente-geral do departamento de recrutamento da Alsok.

"Precisamos fazer o nosso melhor para sermos essa única escolha"

Um número crescente de empresas também está atraindo novos contratados ajudando a pagar seus empréstimos estudantis.

O número de empresas que oferecem essa assistência dobrou no último ano, chegando a 2,6 mil em novembro de 2024, de acordo com a Organização de Serviços para Estudantes do Japão.

A Tokyo Energy & Systems Inc., uma construtora de usinas de energia, fornece até 20 mil ienes por mês para ajudar a pagar empréstimos estudantis.

A estratégia parece estar funcionando, com a empresa pronta para contratar 63 pessoas no segundo trimestre — a primeira vez em anos que superou sua meta.

Essa assistência "foi realmente o fator-chave que me fez escolher esta empresa", afirma Hideo Neshiro, que se formou em 2024 em Negócios e Comércio e recebeu cerca de cinco ofertas de emprego antes de decidir ingressar na Tokyo Energy.

O jovem de 23 anos espera trabalhar lá até a aposentadoria:

"A melhor forma de retribuir o favor de terem pago meu empréstimo estudantil é trabalhar aqui por muito tempo e me esforçar pelo bem da empresa"

A corrida para atrair talentos está começando a se estender aos salários, após décadas de deflação que fizeram os rendimentos no Japão estagnarem e ficarem atrás de outros países.

Em 2023, o salário anual médio no Japão era de US$ 46.792, comparado a US$ 80.115 nos Estados Unidos e US$ 57.617 no Reino Unido, de acordo com os dados mais recentes da OCDE.

Com a aceleração da inflação e a persistência da restrição no mercado de trabalho, os salários estão começando a subir.

A Nippon Life planeja aumentar os salários dos funcionários de vendas em cerca de 6% no próximo ano fiscal, enquanto a Tokyo Energy afirma estar considerando aumentos salariais nas negociações de primavera.

"Recrutar jovens é o maior desafio da empresa" conta Takashi Imai, gerente de RH da Tokyo Energy.

"Mais empresas serão forçadas a fechar por não conseguirem aumentar os salários e contratar o suficiente. Está ficando muito parecido com um jogo de roleta-russa"

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