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Violência contra a mulher também é um problema econômico, diz presidente da Avon

A coalizão contra a violência de gênero lançada há um ano pela Avon com o Instituto Avon, a Fundação Dom Cabral e a ONU Mulheres, que começou com 20 empresas, alcança quase 120 hoje

Daniel Silveira, presidente da AvonDaniel Silveira, presidente da Avon - Foto: Reprodução/ Facebook

Depois que a quarentena jogou luz sobre a violência contra a mulher, o presidente da Avon Brasil, Daniel Silveira, viu crescer o interesse das empresas em apoiar o combate ao problema. Segundo o executivo, está ficando mais claro que se trata não só de uma questão humanitária, mas também econômica.

A coalizão contra a violência de gênero lançada há um ano pela Avon com o Instituto Avon, a Fundação Dom Cabral e a ONU Mulheres, que começou com 20 empresas, alcança quase 120 hoje.

PERGUNTA - A quarentena piorou a violência doméstica. Como vocês estão olhando para isso?

DANIEL SILVEIRA - É assustador. Temos conversado bastante com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Logo no começo, com 15 dias de quarentena, nós já vimos um crescimento dos casos de feminicídio, das chamadas e do descumprimento das medidas protetivas.
Por sermos um grupo global, nós já vínhamos monitorando esse aumento da violência doméstica na Ásia e na Europa, que entraram primeiro na pandemia. O agressor preso em casa junto com a vítima potencializou a violência. De maneira alarmada, para agir rápido, criamos uma série de ações para tratar esse período, como o programa Você Não Está Sozinha, com a participação de mais de 20 empresa signatárias da coalizão.
Quando a mulher está com o agressor em casa, muitas vezes ela nem pode ligar porque está sendo observada. Então fizemos um assistente virtual, a Ângela, para esse contato ser feito via WhatsApp. Temos uma triagem para identificar o nível do risco e acionar a rede de assistência.
Às vezes, ela precisa sair de casa e não tem para onde ir. Então, nós conseguimos parcerias com a Accor para ter leitos onde elas podem ficar, especialmente aquelas que estavam correndo risco de vida e precisavam sair de casa com os filhos. Também fizemos parceria com a Uber para dar as corridas e tirá-las do cenário de violência.

P. - Qual é o balanço desse resgate?

DS - Foram 4.400 mulheres atendidas pelo chatbot via WhatsApp, 1.780 receberam cestas básicas e 575 foram atendidas por casas de passagem.

P. - Como o problema atinge as diferentes classes sociais?

DS - A violência de gênero não escolhe classe. Ela é mais frequente nas áreas com maior desnível social, mas isso não exime as outras, como se vê em casos como o da Luiza Brunet, de pessoas notórias. Mas tem um outro ponto importante.
Quando falamos desse assunto, a primeira coisa que as pessoas pensam, especialmente os homens, é que estamos falando de agressão física. A violência que mais cresce é a psicológica. Muitas vezes, a mulher nem sabe que está sofrendo a violência. Mas a psicológica é tão nociva porque vai minando a coragem da mulher de reagir à violência adicional.
Isso precisa ser desmistificado. E as revendedoras são uma rede poderosa de conexão. Elas acionam o Instituto Avon, não só quando são vítimas, mas quando observam que algo está acontecendo nas suas comunidades. Elas sabem os canais que podem acessar para ter o suporte.
Além de vender produtos de beleza, muitas vezes, elas são conselheiras, e as clientes falam para elas coisas que não contam para ninguém na família. Elas têm esse impacto social de buscar auxílio.

P. - Esse interesse das empresas pelo tema está crescendo?

DS - Falta muito para avançar nessa causa. Mas estou otimista de ver um avanço das empresas em ampliar essa atuação. Dentro das organizações isso também acontece. Além de um problema humanitário, é também econômico. Parte das ausências de mulheres no trabalho acontece por temas relacionados a violência doméstica. As empresas estão percebendo isso.
Além de Accor e Uber, o Grupo Pão de Açúcar também usou a nossa inteligência artificial dentro dos seus aplicativos para atingir seus clientes e ampliar o acesso.

P. - E por que agora? 

DS - É uma conjunção de fatores. Há um ganho de consciência cada vez maior do quanto isso impacta a empresa como um todo, unido ao fato de que esse problema foi agravado e ganhou luz na pandemia. As empresas não estavam, de fato, se dedicando tanto a esse tema.
Há um ano, quando pensamos na ideia da coalizão, eram poucas as empresas que começavam a se organizar, cerca de 20 a 30 empresas. Agora são 120 signatárias. Tem a discussão sobre igualdade de gênero, sobre as restrições que a mulher sofre para ter as mesmas oportunidades do homem, mas eu vejo que neste momento o assunto ficou mais evidente.

P. - E isso acontece no contexto em que o Brasil tem um presidente que diz a frase do “não merece ser estuprada” e um ministro da Economia que chama de feia a mulher do presidente da França. Como esses ingredientes se misturam aqui? 

DS - Misturam e dão evidência do tamanho do problema. Tem mais um caso emblemático da congressista americana Alexandria Ocasio-Cortez, que foi insultada por um congressista, e ele pede desculpas dizendo que é um bom pai de família, como se ser pai de família definisse o seu caráter.
Essas evidências que estão acontecendo tornam esse tema ainda mais importante de ser abordado. Às vezes, pelo contraste a gente consegue mostrar a relevância. Infelizmente, embora David McConnell, que fundou a Avon em 1886, já tivesse sacado a importância do empoderamento feminino, em 2020, ainda estamos discutindo esse tipo de posicionamento.
É lamentável.

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