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"Você vai saber o quanto está pagando de imposto", diz relator da reforma tributária 

Deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) admite que negociações serão intensas

Aguinaldo Ribeiro (PP-PB)Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) - Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

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Às vésperas da votação da reforma tributária (o presidente da Câmara, Arthur Lira, diz que o texto vai a plenário na próxima semana), o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), relator do projeto, é taxativo em dizer que os ganhos para a população serão imediatos. Segundo ele, embora a transição para o novo modelo seja lenta, o efeito para o país será rápido, porque o mercado financeiro irá trazer "a valor presente" os benefícios do projeto, com impactos sobre o dólar, as projeções de crescimento e taxas de juros. Ribeiro diz que outro benefício será o consumidor saber o quanto está pagando de imposto, já que ele será cobrado "por fora" dos produtos, ou seja, não ficará "escondido" dentro do preço.

Ele discorda que o setor de serviços irá pagar mais impostos, mas admite que as negociações serão intensas nos próximos dias e pontos específicos podem mudar. "Não sou dono da verdade", diz. Uma das medidas que pode ser alterada é o período de transição, de 50 anos, para a tributação, que deixará de ser na produção e passará para o consumo.

Deputado, como explicar para quem não é especialista o que é o projeto da reforma tributária?
No Brasil, a gente tem uma cobrança distorcida em relação a outros países. Somos o único país que tributa mais o consumo do que a renda e o patrimônio (os três tipos de tributação). A tributação maior sobre consumo faz com que quem ganha menos pague mais (proporcionalmente sobre a renda). O sistema da tributação sobre consumo envolve hoje cinco impostos (três federais, um estadual e um municipal). É muito complexo. Qual o problema? Esses impostos são cumulativos. Você cobra imposto sobre imposto na medida que vai vendendo, até chegar no consumidor final. O imposto é parte da base de cálculo do produto. A gente não sabe o quanto está pagando de imposto no produto, faz parte do preço. Quando vou comprar uma água mineral, não sei o quanto tem de imposto lá dentro.

E como a proposta resolve essa confusão?
A proposta é você ter o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), no qual você junta todos os impostos sobre consumo hoje em um único imposto. Nesse imposto, você passa a ter a unificação de bens e serviços, não tem mais o problema da diferenciação entre ICMS e ISS (O ICMS, estadual, incide majoritariamente sobre bens. O ISS, municipal, incide sobre os serviços). Eu pago o imposto sobre aquilo que eu comprar. Se estou em qualquer parte da cadeia da garrafa de água mineral, por exemplo, aquilo que eu comprei eu me credito na mesma cadeia, e quando eu estou vendendo, eu debito.

Pode explicar melhor esse exemplo da garrafa de água?
Depois da aprovação da reforma, se eu sou comerciante e compro uma garrafinha de água mineral da fábrica, vamos supor que seja R$ 10, só para facilitar, e há uma alíquota de 20% de imposto (o percentual só será definido posteriormente, em lei complementar), eu vou pagar R$ 2 de imposto. Então o total da garrafa de água será R$ 12. Se eu, na minha loja, vendo por R$ 20, o consumidor final vai me pagar mais R$ 4 de imposto (os mesmos 20%). Mas se eu, comerciante, já paguei inicialmente R$ 2 de imposto eu me creditei disso perante o governo. Então, na minha venda, eu não teria que pagar R$ 4 de imposto, só a diferença, R$ 2. É uma mudança de pensamento, porque esse imposto é gerado "por fora".

Ficará mais claro o quanto o consumidor paga de imposto?
Quando o consumidor for comprar, ele vai comprar o produto que custa R$ 20 e pagar por fora o imposto. Ele vai ter clareza sobre o preço do produto e o valor do imposto. Vai estar claro na nota fiscal e na apresentação do próprio preço. Você vai saber o quanto está pagando de imposto e a repartição do imposto entre entes federativos.

Mas isso significa que o produto ficará mais barato?
É complexo. O que eu posso dizer é que no primeiro momento você vai ter a clareza do que está pagando. Quando você tira a cumulatividade (dos impostos), tem um efeito de eficiência na economia. O que eu posso te afirmar é que o consumidor vai ter o benefício imediato da simplificação. Em alguns produtos e serviços você pode sim ter a redução (de preço). Hoje, as empresas assumiram um papel de agente arrecadador do Estado, elas assumiram essa responsabilidade, por conta do sistema. Você gera uma complexidade em que todo mundo paga, o que se chama de Custo Brasil.

Pode ser mais específico?
Hoje, por exemplo, ninguém aproveita o crédito de energia (valor do imposto pago na conta de luz). No sistema novo, o crédito será amplo. A empresa, para funcionar, está consumindo energia. Quando você for pagar para o governo você vai abater o crédito da energia (imposto que já foi pago na conta de luz), o crédito do telefone, tudo que fez parte da sua atividade produtiva. O desafio é pensar com esse novo modelo. Não é uma reforma do modelo atual, é um novo modelo. Esse modelo que está aí não dá para compararmos. É meio impróprio esse nome 'reforma', acho que é um novo modelo tributário, que muda o conceito que temos de imposto dentro da margem de preço.

Agora que a votação se encaminha para a reta final, como estão os pedidos de ajustes?
O IVA não trata de setores. Quando eu falo em novo modelo, temos que pensar diferente do que é hoje. O imposto será cobrado por fora da base de cálculo, com crédito amplo. Na verdade, estou mudando a tributação que hoje é feita na origem (produção) para o destino (consumo), isso é justiça tributária. Se você consome em Brasília, por que o seu dinheiro acaba em outro estado? Isso tem um efeito importante, você tem esse controle social. O meu imposto está ficando no meu estado. Eu sei para onde o imposto vai, para onde ele é distribuído e posso cobrar muito mais do ponto de vista social o retorno desse imposto. Hoje é uma tributação tão maluca que você não tem esse controle.

O imposto não é mais específico para setores?
Não tem mais o direcionamento de impostos para setores, a gente trata de alguns serviços e produtos (com alíquotas menores) que são de interesse social, para não impactar o consumidor. Por exemplo, saúde e educação. Você tem produtos que precisam ter um olhar diferente, como produtos destinados ao tratamento para o câncer, que já são muito caros. Quem vai pagar a conta no final é sempre o consumidor, não tem isso de setor, nem de estado, nem de municípios, o dinheiro é nosso e ele vai transitar.

A CNC divulgou estudo mostrando impacto negativo sobre o setor de serviços. Qual a avaliação do senhor?
O que eu vi foi algo superficial, foi mais uma narrativa do que um estudo. Se a gente for dar para todo mundo a exceção que quer, não vamos ter mudança de sistema. Não adianta eu pensar no meu setor, se meu país no final tiver um resultado pífio, porque eu vou pagar essa conta no final. Se olhar só para o próprio umbigo, você acaba produzindo a própria morte.

Quando o consumidor vai sentir o impacto da reforma?
Do ponto de vista do imposto, o consumidor não vai sentir uma mudança imediata porque vamos ter um período de transição em que vamos começar com uma alíquota teste na tributação federal (a partir de 2026). E vamos ter que aprovar muita coisa. Ninguém dá cavalo de pau em uma reforma como essa, não é da noite para o dia. Mas vamos ter benefício na largada porque o próprio mercado precifica a aprovação de uma reforma tributária. Traz "a valor presente", com efeitos sobre câmbio, juros e projeções de crescimento. Vamos ter um processo de avanço na relação do consumo, por conta da tecnologia e a operacionalização dos sistemas. Vamos ver isso na nota fiscal. A ideia é que o consumidor vai perceber nos primeiros oito anos.

Já tem votos para aprovar a reforma na semana que vem?
Essa vai ser a condução dos líderes partidários, a questão da mitigação das questões federativas e setoriais com a política como um todo.

O que falta para votar o relatório?
Falta uma construção política, seja setorial ou federativa. Eu não sou dono da verdade. É ser o mais claro possível, não é fazer embate. Apenas dizer que o conceito é esse, não existe tratamento a setor, o tratamento é ao serviço e ao produto específico, mesmo na redução da alíquota e na alíquota zero que vamos endereçar. E do ponto de vista federativo, também. A gente precisa construir a condição de ter o conforto da federação. Ou seja, nos três níveis.

Alguns setores têm medo de aumento da carga tributária.
É fundamental a gente ter o conceito de que a reforma não é para setores, é para fazer o que é melhor para o país e dosar com todo o equilíbrio possível. Sendo relator, tenho que tratar para que não haja aumento de carga. Isso para mim é um limitador conceitual. Não vou assinar um texto de reforma tributária que impacte em aumento de carga tributária. Isso eu não vou fazer e já disse isso várias vezes. Vou ter que ter cuidado. Essa construção vai se dar na política.

Os estados têm dito que o Fundo de Desenvolvimento Regional de R$ 40 bilhões é pequeno.
Os estados querem R$ 75 bilhões, e o ministro Haddad defende R$ 40 bilhões. Acho que R$ 40 bilhões é um número muito expressivo. É importante a gente destacar que quando se olha para um país que tem uma capacidade de investimento de R$ 70 bilhões, é o que sobra no Orçamento, a gente tem um cobertor curto. Eu acho que R$ 40 bilhões é um gesto importante que o ministro Haddad fez. Outro gesto é a União bancar o Fundo de Desenvolvimento Regional. Acho que é legítimo os estados quererem mais e é legítimo a União ter um valor que ela possa cumprir.

A distribuição do Fundo de Desenvolvimento Regional pode vir descrita na PEC?
Se houver um ajuste federativo não tenho problema em incluir no texto, o ideal para mim como relator é que já viesse consensuado pelos estados. Não vejo dificuldade em acatar os critérios que os estados defendem. O problema é que a gente não tinha padrão de critério de distribuição. Mas se tiver acordo e a técnica legislativa me recomendar que eu tenha no texto da Constituição a repartição do Fundo, não vejo dificuldade. Amanhã devo receber uma proposta do Comsefaz com relação a esses critérios. Nós colocamos que esses critérios devem levar em consideração o desenvolvimento regional e social

Os estados também consideram insuficiente o volume de R$ 160 bilhões que a União vai repassar ao Fundo Compensação para eventuais perdas com o fim dos incentivos fiscais em 2032.

Isso está solucionado no texto. O que a gente está dizendo é que se esses recursos forem insuficientes a União bancará.

Os estados também querem reduzir o prazo final de transição de 50 anos, da origem para o destino.

Isso também não é problema. O texto é muito mais uma concertação (acordo) federativa do que uma decisão do relator. Esse será um dos temas que a gente vai endereçar durante esta semana para iniciar a próxima, com isso qualificado. Alguns estados defendem que a transição seja mais suave, outros, mais longa, se houver um endereçamento de todos os estados definindo uma transição, vamos ter o conforto federativo.

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