World: governo veta pagamento por registro de íris e projeto suspende coletas no Brasil
Autoridade Nacional de Dados (ANPD) indeferiu recurso da Tools for Humanity, e manteve proibição de pagamentos em troca de escaneamento dos olhos
O World, projeto que registra a íris humana para criar uma identidade digital, vai suspender o processo de verificação no Brasil de forma temporária. A decisão foi anunciada nesta terça-feira, depois da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) manter a proibição de pagamentos em troca da verificação.
Com operação feita pela empresa Tools for Humanity (TFH), o World foi lançada no Brasil em novembro de 2024. O objetivo da iniciativa é criar uma identidade global que diferencie humanos de inteligências artificiais.
O processo de verificação dos usuários ocorre por meio de um dispositivo chamado Orb (uma pequena esfera prateada), que escaneia a íris e gera, a partir da imagem, um código criptografado único. Em troca, a empresa vinha oferecendo o pagamento em criptoativos.
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No fim de janeiro, depois de 400 mil brasileiros escanearem as íris, a ANPD proibiu o projeto de realizar pagamentos em troca da verificação, alegando que a compensação financeira comprometia a livre manifestação de vontade dos usuários. Dias depois, no entanto, a proibição foi suspensa para análise de recurso da THF. Nesse período, a empresa seguiu com os pagamentos e os registros no país.
Em decisão publicada nesta terça-feira no Diário Oficial, o Conselho Diretor da Autoridade Nacional de Proteção de Dados afirma que, após análise, indeferiu o recurso apresentado pela Tools for Humanity e manteve a suspensão de pagamentos.
A autarquia também negou o pedido do projeto para ter um prazo de 45 dias para implementar mudanças no aplicativo e determinou a adoção imediata das medidas. "Dessa forma, a suspensão da compensação financeira associada à coleta de íris deverá ser realizada imediatamente após a intimação", indica a ANPD.
Pontos em SP seguirão abertos
Em troca do registro da íris, a World oferecia a cada usuário 20 unidades do criptoativo do projeto, chamado de Worldcoin (WLD). Além disso, o usuário poderia resgatar mais 28 tokens ao longo de um ano, o que totalizava 48 tokens pelo escaneamento dos olhos. O valor da recompensa varia conforme cotação da WLD. Semanas atrás, estava em cerca de R$ 600.
Relatora do caso, Miriam Wimmer, diretora da ANPD, considerou que a compensação financeira distorcia a manifestação de escolha dos titulares de dados, que tenderiam a ignorar "os riscos envolvidos e a própria finalidade da coleta".
Em nota, a empresa informou que irá cumprir a determinação. "Para permitir que a World conclua as mudanças em coordenação com a ANPD e garanta conformidade durante esse processo, estamos voluntariamente e temporariamente pausando o serviço de verificações", afirmou a empresa, em nota.
A empresa, por enquanto, opera apenas em São Paulo. O projeto, no entanto, tinha planos para expandir os registros para mais cidades brasileiras. Com a decisão da ANP, os mais de 50 pontos de verificação na capital paulista vão seguir abertos, mas sem realizar o cadastro.
A operação, segundo a World, terá como objetivo "fornecer educação e informações ao público". O projeto, em nota, pediu "desculpas por qualquer inconveniente aos que desejavam se juntar à World agora".
Entrave em outros países
Criado pelo bilionário Sam Altman, dono da OpenAI, do ChatGPT, o World tem enfrentado resistência de reguladores em outros países. Na União Europeia, autoridades de dados exigiram que o projeto, por exemplo, permitisse a exclusão completa dos registros biométricos dos usuários.
O World afirma que, após a leitura da íris, a imagem capturada é convertida em um código numérico e, em seguida, descartada. No entanto, fragmentos criptografados desse código são armazenados nos servidores da empresa. Para reguladores europeus, esses registros também deveriam ser excluídos.
Além do Brasil, o 'escaner' da íris tem acontecido também no Panamá, Peru, Argentina e México, entre outros países latino-americanos. Na Europa, há centros de verificação em Portugual, na Polônia, na Alemanha e na Áustria. A operação também inclui a Ásia (Japão, Singapura, Malásia, Coreia do Sul e Indonésia).
Financiada por investidores privados, a iniciativa alega que a criação de uma identidade que diferencie robôs de humanos será cada vez mais necessária. Uma das formas com as quais o projeto pretende se rentabilizar é vendendo o acesso à tecnologia de verificação, além de ter uma plataforma de aplicativos exclusivos para usuários verificados.
O projeto já registrou 11 milhões de pessoas em 160 países. Segundo o World, há atualmente 1,5 mil dispositivos Orb ativos no mundo e 23 milhões de downloads do aplicativo da iniciativa.