EUA

Zuckerberg, Musk e a volta da cultura do 'macho alfa' ao Vale do Silício

Indústria de tecnologia dá sinais de retrocesso com episódios de assédio e sexismo

Mark Zuckerberg, cofundador e CEO do FacebookMark Zuckerberg, cofundador e CEO do Facebook - Foto: Mandel Ngan/AFP

No mês passado, Mark Zuckerberg gastou horas divulgando seu amor por jiu-jitsu, luta livre e UFC no podcast de Joe Rogan, conhecido por sua hipermasculinidade. Elon Musk, que parece ter assinado o acordo para comprar o Twitter em um impulso, está agora prestes a ir ao tribunal porque quer sair do negócio e lançou provocações ao CEO do Twitter na linha "vem debater comigo, camarada" enquanto distribui conselhos sobre jejum intermitente e preocupações quanto ao colapso da população.

E Marc Andreessen, um investidor de tecnologia de alto nível, recentemente se opôs a um plano para construir um projeto de habitação multifamiliar na cidade do Vale do Silício onde mora e, em seguida, anunciou seu maior negócio: uma startup de empreendimento imobiliário liderada por Adam Neumann, o empreendedor que incinerou bilhões de dólares na WeWork.

Essas ações pareciam planejadas para despertar o máximo de indignação. A elite mais poderosa da tecnologia está adotando um novo tom ultimamente. É mais abertamente desafiadora, combativa do que há poucos anos, quando a indústria estava sob o escrutínio público depois de casos revelados sobre a sua cultura.

Começando em 2017, uma série de relatos mostrou os casos de assédio, discriminação e uma cultura de silêncio e de acordos no Vale do Silício. Investidores poderosos e executivos foram acusados durante os primeiros dias do movimento #MeToo.

Um livro intitulado "Brotopia", da jornalista Emily Chang, metodicamente destacou o sexismo entranhado na indústria de tecnologia, conectando lições com os sombrios relatórios de diversidade.

Líderes da indústria ao menos tentaram parecer que estavam fazendo algum esforço para desmantelar esse sistema que concentra poder nas mãos de poucos homens brancos. Fizeram promessas, promoveram algumas mulheres e doaram recursos.

'Cortina de fumaça'
Houve alguns avanços, inclusive mais mulheres assinando cheques em firmas de venture capital (capital de risco) e startups de bilhão de dólares. All Raise, um grupo que defende direitos das mulheres na tecnologia, apareceu na capa da Forbes em 2018.

- Fizemos algum progresso, mas penso que foi mais uma cortina de fumaça - disse Christie Pitts, uma investidora da Backstage Capital, empresa de capital de risco. - Agora há definitivamente um sentimento de retrocesso.

Dois paralelos apareceram no Vale do Silício. Há o caso do Twitter, em que gigantes da tecnologia colecionam likes ao postar memes e posts políticos e depois invocam a cultura do cancelamento quando são criticados.

Eles se metem em aquisições de US$ 44 bilhões e depois recuam. Eles promovem uma existência inteiramente on-line dentro do chamado metaverso.

Mulheres e negros são minoria
E há a realidade do dia a dia, onde as mulheres ainda recebem apenas 2% dos recursos de venture capital e fundadores negros ficam com 1%, onde as maiores empresas fizeram progresso insignificante em diversificar suas equipes e onde o assédio e a discriminação continuam a ser ocorrências comuns.

No mês passado, Estelle McGechie, a antiga CEO da Atomos, processou a empresa de eletrônicos por discriminação de gênero e retaliação. Ela disse ter sido demitida depois de ter alertado o Conselho de Administração da empresa a respeito de fraude.

Neste mês, uma reportagem da Vox sobre assédio sexual e silenciamento de uma vítima na Launch House, uma casa de hackers apoiada pela firma de Andreessen, passou praticamente despercebida entre as vozes mais proeminentes da indústria de tecnologia.

Depois Verkada, uma startup de segurança que enfrentou acusações de assédio de funcionárias e falta de controles internos sobre o acesso a ferramentas de segurança, levantou US$ 205 milhões com firmas de capital de risco.

E Shervin Pishevar, um gestor de capital de risco acusado de má conduta sexual por cinco mulheres em 2017, ressurgiu como um executivo na companhia de Kanye West, a Yeezy. É o suficiente para levantar algumas perguntas e a indústria pode de fato mudar.

"Até onde eu posso dizer, nunca haverá consequências para os homens", disse Pitts. "É desencorajador".

O CEO da Launch House respondeu ao artigo da Vox com um post em seu blog neste mês, se desculpando pelos problemas de segurança registrados pela companhia. A Verkada disse que aprendeu com os incidentes anteriores e que tinha "protocolos claros, treinamento e pessoas focadas em lidar com questões como sexismo e assédio".

A Atomos disse em nota que as declarações da executiva não tinham mérito. Pishevar não comentou o assunto.

O negócio bilionário de Musk pelo Twitter ressalta como a indústria de tecnologia ainda opera como um clube de velhos meninos. O bilionário faz parte da “máfia do PayPal”, um grupo de fundadores e primeiros funcionários da empresa de pagamentos digitais, muitos dos quais tiveram sucessos ainda maiores em tecnologia.

Ao mesmo tempo, mulheres que trabalham na SpaceX, a companhia de viagens espaciais de Musk, já registraram múltiplas queixas de assédio e retaliação nos últimos anos.

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