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FÓRUM NORDESTE 2023

CBio: A commodity ambiental

Também chamado de crédito de carbono, o ativo negociado em bolsa é considerado uma importante solução para a descarbonização da economia

Empresas que trabalham exclusivamente com etanol não precisam comprar CBiosEmpresas que trabalham exclusivamente com etanol não precisam comprar CBios - Foto: Alexandre Aroeira / Folha de Pernambuco

Dados da B3, a bolsa de valores brasileira, mostram que de janeiro a junho deste ano foram emitidos 15,59 milhões de créditos de descarbonização (CBios), o ativo financeiro negociável em bolsa de valores criado pelo RenovaBio, a política nacional de biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME). Mas o que são, de fato, CBios e como essas chamadas commodities ambientais funcionam para contribuir para a descarbonização da economia?

O ativo é emitido por empresas licenciadas produtoras ou importadoras de biocombustíveis (etanol e biodiesel) que trabalham para a redução de emissão do carbono no meio ambiente. A Agência Nacional do Petróleo (ANP), por intermédio de uma firma inspetora, é responsável pela autorização. Assim, os títulos são emitidos a partir das notas fiscais de compra e venda de biocombustíveis, com base nas emissões de carbono que foram evitadas. 

“Uma distribuidora que só trabalhe com etanol não precisa comprar um CBio sequer. Já uma que só trabalha com gasolina precisa comprar CBios equivalentes a toda a sua produção. Ou seja, é um mecanismo que induz ao consumo maior de etanol. Por outro lado, o sistema todo é impactado por outras políticas públicas, como, por exemplo, a redução desordenada de tributos que ocorreu no ano passado”, diz o presidente do Fórum Nacional Sucroenergético e da Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais (Siamig), Mário Campos.

EFEITO ESTUFA

Na prática, cada CBio equivale a uma tonelada de gases de efeito estufa (GEE) que deixou de ser emitida em função do uso de biocombustíveis, certificados pelo RenovaBio, substituindo os combustíveis fósseis. Assim, os produtores podem obter renda a partir da venda desses ativos. 
 

Sistema de crédito de carbono estimula o aumento da produção de biocombustíveis como o etanol a partir da canaSistema de crédito de carbono estimula o aumento da produção de biocombustíveis como o etanol a partir da cana



Levando-se em conta os CBios emitidos no primeiro semestre, ao transformar cada ativo em tonelada, o Brasil deixou de emitir 15,59 milhões de toneladas de gás carbono nos seis primeiros meses deste ano. A Resolução CNPE nº 13, de 8 de dezembro de 2022, definiu as metas compulsórias anuais de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa para a comercialização de combustíveis, fixando para 2023 a meta total de 37,47 milhões de CBIOs. 

“As distribuidoras de combustíveis deverão comprovar o cumprimento de metas individuais compulsórias, por meio da compra de CBios. Trata-se de estímulo para o aumento da produção de biocombustíveis, atividade fortemente geradora de empregos e de renda no Brasil”, lembra o presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool no Estado de Pernambuco (Sindaçúcar-PE) e presidente executivo da NovaBio, Renato Cunha.

A meta obrigatória é cumprida pelos distribuidores de combustíveis fósseis, em função do “mix” de venda de combustíveis no ano anterior. O ano de 2020 foi o primeiro com meta obrigatória, de 14,9 milhões de toneladas de CO2eq. (que é como são medidas as emissões de gases de efeito estufa). As metas anuais atualizadas já estão estabelecidas para os próximos 10 anos, crescendo anualmente até atingir 99,22 milhões de toneladas em 2032. 

“Hoje, se coloca dentro do sistema de produção de energia de biocombustíveis, incluído aí o sistema canavieiro, R$ 4 bilhões por ano. Isso faz com que se tenha um incentivo cada vez maior para se pensar de forma a descarbonizar cada vez mais o processo produtivo. É um grande incentivo para que o produtor seja direcionado a essa forma de pensar, que é o modo de pensar do mundo inteiro”, analisa o presidente do Fórum Nacional Sucroenergético.

SUPERAÇÃO DOS DESAFIOS

Lançado em 2017, o RenovaBio visa expandir a produção de biocombustíveis, fundamentada na previsibilidade e sustentabilidade ambiental, econômica e social. O programa nasceu para aprimorar as políticas e os aspectos regulatórios dos biocombustíveis, a fim de contribuir para a superação dos desafios técnicos e econômicos a serem enfrentados pelo setor. 

Segundo Renato Cunha, as metas nacionais estabelecidas pelo CNPE serão anualmente desdobradas em metas individuais compulsórias para os distribuidores de combustíveis, conforme suas participações no mercado de combustíveis fósseis. Além do papel dos biocombustíveis na matriz energética, as diretrizes do programa se baseiam em outros três eixos estratégicos: o equilíbrio econômico e financeiro do mercado, a definição de regras de comercialização e os novos biocombustíveis. 

Para Cunha, o RenovaBio é um programa que mensura externalidades, além da fixação de metas, o que tem sido raro em programas de sustentabilidade. “Sem o cômputo e acompanhamento das metas, não se edifica um programa com estatísticas tangíveis que permitirão melhores aperfeiçoamentos. O programa, desde 2020, já contabiliza aproximadamente 95 milhões de toneladas de CO2eq que deixaram de ser lançadas na atmosfera”, acrescenta.
O volume citado por Cunha equivale ao plantio de mais de 675 milhões de árvores, mantidas em pé por 20 anos, segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (UNICA), a partir de dados da B3.

OBJETIVOS DO PROGRAMA

Dentre os objetivos do programa estão oferecer uma contribuição relevante para cumprimento dos compromissos determinados pelo Brasil no âmbito do Acordo de Paris (reduzir em 37% as emissões de gases de efeito estufa até 2025) e promover a adequada expansão dos biocombustíveis na matriz energética, com ênfase na regularidade do abastecimento de combustíveis.

Para o registro da descarbonização, a produtora ou importadora de biocombustível deve ter um escriturador (banco ou instituição financeira) que emitirá o crédito. Este fica responsável por registrar a emissão do CBio no ambiente da B3. Além disso, o escriturador deve manter os registros de toda a negociação no mercado primário para conferência.

A quantidade de créditos é baseada no volume de biocombustível que tenha sido produzido, importado ou comercializado pelo emissor primário (produtor e importador de biocombustíveis certificados). Além disso, a solicitação de emissão do CBio deve ser realizada em até 60 dias, contados da data indicada na nota fiscal.
A B3 é responsável por disponibilizar o ambiente para emissão, negociação e a aposentadoria do CBio. Após a escrituração e o registro do título, as ações referentes a ele acontecem dentro do ambiente da bolsa de valores. Logo, a plataforma do segmento de balcão que permite os registros e negociações de créditos de carbono é disponibilizada pela B3. Seu papel é essencial para colocar a estratégia do RenovaBio em prática.

É preciso ter um representante, que incluirá as ofertas no Trader (plataforma que será utilizada) e confirmará as trocas de titularidade. Os créditos não têm data de vencimento, então a validade dura até que o detentor solicite a aposentadoria. Isso é feito seguindo as metas que forem estabelecidas aos distribuidores, conforme a legislação.

TENDÊNCIA MUNDIAL

Os investimentos considerados sustentáveis vêm ganhando destaque no mercado. A tendência é bastante forte em países desenvolvidos. Nos EUA, existe um crédito semelhante: o Low Carbon Fuel Standard (LCFS). Já a União Europeia tem o Renewable Energy Directive (Red). Isso é resultado da conscientização sobre os impactos das ações humanas nas mudanças climáticas e na natureza.

“Há empresas hoje no Brasil, como as locadoras de veículos, que já estão quantificando o combustível utilizado na sua frota dentro das suas metas de descarbonização. Empresas mineradoras e siderúrgicas estão modificando suas estruturas produtivas para utilização de fontes energéticas de menor impacto no processo produtivo, porque estão sendo pressionadas pela sociedade brasileira e mundial”, revela Mário Campos.

O setor de biocombustíveis, segundo Campos, oferece a essas empresas, governos e prefeituras tudo quantificado. “Se uma prefeitura, por exemplo, emitir uma ordem, projeto de lei ou decreto para que todos os seus veículos abasteçam só com etanol, ela tem condição de quantificar quanto vai reduzir de emissão porque temos um sistema hoje de certificação e de auditoria que possibilita fazer essa conta”, explica Campos.
 

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