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PREVENÇÃO

Ultraprocessados e poluição impactam na saúde global

Panorama da saúde mundial aponta a relação entre o aumento das doenças crônicas e mau envelhecimento da população com a poluição atmosférica e o consumo de ultraprocessados

A poluição do ar mata mais de sete milhões de pessoas por ano, o que equivale a 13 mortes por minuto.A poluição do ar mata mais de sete milhões de pessoas por ano, o que equivale a 13 mortes por minuto. - Foto: Freepik

Doenças crônicas estão surgindo no mundo todo, e as causas são cada vez mais evidentes: uma dieta baseada em ultraprocessados e a qualidade do ar podem estar piorando a saúde nos grandes centros urbanos.

Alimentos industrializados e poluição são vistos como a origem ou agravamento de muitas patologias atuais - como diabetes, hipertensão, doenças cardíacas e câncer - associadas ao estilo de vida moderno.

A alimentação inadequada e a exposição à poluição são os principais vilões apontados para o declínio da saúde global.

Atualmente, 1,5 bilhão de pessoas vivem com doenças crônicas, como diabetes e hipertensão, responsáveis por 70% das mortes anuais, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A poluição do ar mata mais de sete milhões de pessoas por ano, o que equivale a 13 mortes por minuto.

No Brasil, as doenças crônicas causam 75% das mortes, conforme o Ministério da Saúde. Além disso, a poluição do ar contribui para mais de 50 mil mortes anuais, segundo o Instituto de Saúde e Sustentabilidade. 

TENDÊNCIA MUNDIAL

De acordo o médico clínico geral Erick Pordeus, do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (HC- UFPE), o Brasil segue a tendência global com uma transição epidemiológica, marcada pela mudança no perfil das doenças.

Erick PordeusErick Pordeus. Foto: Rafael Melo / Folha de Pernambuco 

Entre as décadas de 1950 e 1960, prevaleciam doenças infectocontagiosas, mas com a urbanização e melhores condições de saúde, as pessoas vivem mais, expondo-se a fatores ambientais que aumentam o risco de doenças crônicas e câncer.

A expectativa de vida mais longa eleva a exposição a agentes mutagênicos e poluentes ambientais.

A poluição também contribui para a piora das condições respiratórias, como doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e asma, que podem ser agravadas por fatores como tabagismo e exposição a substâncias nocivas.

“As doenças cardiovasculares, como AVC e infarto, estão entre as principais causas de mortalidade, frequentemente associadas à hipertensão, dislipidemia, sedentarismo e obesidade. Essas condições, parte da síndrome metabólica, podem resultar em morte ou incapacitação, gerando altos custos com cuidados e tratamentos”, observa.

Para Pordeus, a prevenção é fundamental antes do surgimento da doença, com foco em um estilo de vida saudável, exercícios e dieta adequada.

Quanto aos check-ups, são recomendados para pessoas sem sintomas, com intervalos entre três e cinco anos para jovens e maior frequência para aqueles com comorbidades.

ALIMENTAÇÃO

No Brasil, o Guia Alimentar para a População Brasileira, de 2014, classifica os alimentos em quatro grupos: in natura, minimamente processados, processados e ultraprocessados.

De acordo com a nutricionista sanitarista da Coordenação de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável da Secretaria Estadual de Saúde (SES/PE), Vilma Ramos, a principal orientação do guia diz respeito à base alimentar.

“Ela [a alimentação] deve ser composta por alimentos in natura ou minimamente processados, pois eles não contêm aditivos químicos e não são industrializados, o que os torna mais saudáveis. Esses alimentos são consumidos na forma como vêm da natureza, beneficiando o organismo”, explica a profissional, que também alerta para o alto grau de relação entre má alimentação e desenvolvimento de doenças crônicas como a obesidade.

“O consumo excessivo dos ultraprocessados pode provocar a obesidade, que se torna um fator de risco para o desenvolvimento de condições graves como hipertensão, diabetes e várias formas de câncer.”

DESEMBALAR MENOS

Segundo a especialista, uma alimentação ideal, que promove uma boa relação com a saúde, deve se basear nos ingredientes naturais e minimamente processados.

De acordo com o guia, os alimentos in natura (ou naturais) são obtidos diretamente de plantas ou animais, e não sofrem modificação após deixarem a natureza.

Já os minimamente processados são alimentos in natura que passaram por pequenos processos de alteração para chegar com qualidade até o consumidor.

Vilma RamosVilma Ramos. Foto: Ricardo Fernandes / Folha de Pernambuco

Esses processos, no entanto, não devem envolver a adição de sal, açúcar, óleos, gorduras e outros ingredientes. 

“A alimentação precisa ser uma prioridade na vida das pessoas, pois o que comemos influencia diretamente o funcionamento do nosso organismo. No entanto, é importante evitar a crença em alimentos milagrosos, como sucos detox, ou a ideia de que se pode exagerar em alimentos pouco saudáveis e compensar depois com algo “detox”. Não há alimento milagroso. O foco deve ser em adotar uma alimentação saudável como parte da rotina. Devemos descascar mais e desembalar menos, optando por alimentos frescos em vez de industrializados”, acrescenta.

SUPLEMENTAÇÃO

Além do cuidado com a crença nos supostos alimentos “milagrosos”, a nutricionista chama atenção para a cautela com a ingestão de remédios manipulados e complexos vitamínicos artificiais. 

“Para indivíduos que estão em bom estado de saúde, sem patologias ou doenças, a suplementação alimentar geralmente não é necessária. Se a alimentação for variada e equilibrada, com uma base de alimentos in natura, como frutas, verduras, hortaliças, grãos, cereais e leguminosas, ela será suficiente para suprir as necessidades nutricionais".

Para Vilma, a reposição de vitaminas por meios artificiais deve acontecer apenas em casos muito específicos.

“No envelhecimento, ocorre a perda de massa óssea e muscular, o que pode exigir atenção especial à alimentação. Nesse caso, é recomendável consultar um especialista para avaliar a necessidade de suplementação, embora nem todos precisem. Em algumas situações, como no caso de mulheres que sofrem de osteopenia - diminuição da densidade óssea -, pode ser necessária uma suplementação adicional de cálcio e outros nutrientes para compensar essas perdas.”

DISPOSIÇÃO

O cuidado com a alimentação, no entanto, é só um dos passos para uma vida longa e saudável que resultará em um envelhecimento digno e disposto.

Para o médico geriatra Rodrigo Patriota, assessor técnico da Gerência de Saúde do Homem e da Pessoa Idosa da SES-PE, os cuidados geriátricos podem começar ainda na vida adulta, estabelecendo um “histórico médico que pode acompanhar o paciente ao longo da vida, ajudando a construir um plano de cuidados que vai além do imediato, abrangendo o longo prazo. Começar cedo com um geriatra permite acesso a profissionais que têm uma visão ampla e cuidadosa da saúde”, destaca.

Segundo o especialista, cuidados com a  saúde ao lado de um médico geriatra é uma das chaves para uma longevidade e uma vida melhor.

Porém, o grupo prioritário para os atendimentos são aqueles considerados “idosos potencialmente frágeis”. Para esses pacientes, o médico poderá prevenir a evolução para a fragilidade ou até reverter parte das condições.

VITALIDADE

Para evitar a fragilidade, os cuidados devem começar antes dos anos de transição para a velhice.

“Quando falamos de atividade física, não há limitações em nenhuma faixa etária, exceto em casos muito específicos. Exercícios resistidos, como a musculação, são os que mais promovem longevidade e prevenção cardiovascular”, salienta.

Rodrigo PatriotaRodrigo Patriota. Foto: Ricardo Fernandes / Folha de Pernambuco

De acordo com o geriatra, a própria família deve incentivar a independência dos idosos que estão no seu convívio, combatendo estereótipos etaristas.

"A nossa população idosa está crescendo, e vamos precisar que ela seja ativa e produtiva. A previsão é que a população idosa dobre duas vezes até 2060. Se definirmos que os idosos não são mais produtivos, teremos um terço da população inativa, o que é um grande desafio tanto para os idosos quanto para a sociedade como um todo”, alerta.

BLUE ZONES

As Blue Zones, regiões com alta concentração de centenários, oferecem estilos de vida favoráveis à longevidade.

O cuidado com o estilo de vida, principalmente em áreas afastadas dos centros urbanos, contribui para menor mortalidade cardiovascular e menor risco de doenças como demência.

Patriota enfatiza que a poluição do ar é um fator que agrava a saúde pulmonar e cardiovascular, além de estar ligada ao desenvolvimento de síndromes demenciais.

Um estudo publicado na revista The Lancet aponta que cerca de 3% dos fatores modificáveis para o Alzheimer estão relacionados à poluição.

O caminho para um futuro no qual o corpo e o planeta encontram-se em harmonia parece cada vez mais ir ao encontro com o resgate da natureza humana.

A redescoberta sustentável do planeta como um lar que acolhe, alimenta e oferece espaço para que o corpo se movimente e viva experiências diversas parece ser a saída ideal para uma longevidade saudável, prática e pacífica.

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